2016 tem paragem obrigatória no Rio de janeiro, em Agosto. É assim a cada quatro anos, mas especial desta vez, porque este foi o ano em que os Jogos Olímpicos disseram até sempre a Michael Phelps e Usain Bolt, imortais na memória do desporto.

Vivemos no tempo deles. De Phepls, o fenómeno norte-americano que chegou ao Rio com 31 anos e 22 medalhas em casa para uns últimos Jogos, ele que quatro anos antes tinha jurado que era o fim. E mais sereno, já pai de família, saboreou cada momento desta despedida, antes de levar consigo mais seis medalhas, cinco de ouro e uma de prata. 28. A despedida na piscina do Rio deu-lhe o 23º ouro ao fim de cinco Jogos Olímpicos, de 2000 a 2016. Nunca ninguém ganhou tanto. Foi assim a última braçada.

E vivemos no tempo de Usain Bolt. O relâmpago da Jamaica que repetiu no Rio o que tinha feito em Pequim e em Londres. Três provas em cada edição dos Jogos, três ouros. 100m, 200m, 4x100 metros, cirúrgico e inalcançável, ele voltou a pairar acima da humanidade. Recordista mundial em cada uma deles, sai da cena olímpica com nove medalhas de ouro a compor aquele sorriso icónico e um rasto que será muito difícil de cobrir.

O pódio da glória do Rio fica completo com outro nome. Simone Biles, 19 anos e 1,44m, a menina-prodígio da ginástica desportiva, figura maior da seleção norte-americana que ganhou medalhas em todas as disciplinas. Cinco medalhas, quatro de ouro e um bronze depois do desequilíbrio na trave que lhe tirou o lugar mais alto no pódio.

Foram uns Jogos dominados pelos Estados Unidos como há muito não se via, muito acima de outras superpotências tradicionais e, claro, da Rússia, sancionada pelas revelações de que recorreu durante anos a um esquema sistemático e institucional de dopagem. Uns Jogos que tiveram muitos heróis e apontaram mais estrelas para o futuro. Como a norte-americana Katie Ledecky, 19 anos e quatro medalhas de ouro na natação nos seus segundos Jogos Olímpicos.

O Rio teve momentos épicos e a final do torneio de ténis foi um deles. Um título discutido até à exaustão entre Andy Murray e Juan Martin Del Potro, que caiu no final para o britânico. Ele é também, sem margem para dúvida, uma das grandes figuras de 2016. Durante muitos anos a tentar, Murray deu o grande salto de qualidade e competitividade, num ano de sonho.

Ganhou Wimbledon antes de seguir para o Rio, onde procurava revalidar o título olímpico e de onde saiu mesmo como bicampeão. Chegou a nº 1 do mundo do início de novembro e a fechar o ano venceu Novak Djokovic nas Finais ATP, selando a passagem de testemunho. No tempo do ocaso de gigantes como Roger Federer e Rafa Nadal, e depois de um ano irregular de Djokovic, o escocês conquistou a pulso o seu momento de glória.

Para Del Potro sobrou um prémio a fechar o ano, a conquista da Taça Davis. A primeira vitória da Argentina ao fim de cinco finais, com Delpo crucial numa decisão com reviravolta. A Argentina perdia por 1-2 antes das duas últimas partidas, na quarta ele perdeu os dois primeiros sets com o croata Mario Cilic, mas venceu e empatou a final.

Foi aliás uma época de estreias felizes para a Argentina, se não falarmos de futebol. Também foi para Buenos Aires o título mundial de futsal, uma conquista inédita que chegou com a vitória sobre a Rússia na final, por 5-4. Portugal foi semifinalista no Mundial da Colômbia.

Num ano com poucas competições internacionais das principais modalidades coletivas, houve de resto Europeu de andebol, logo em janeiro, e sorriu à Alemanha, que venceu a Espanha na final e conquistou o seu segundo título.

Mas houve mais conquistas inéditas. E outras como já não havia memória. Nos Estados Unidos, os Cleveland Cavaliers conquistaram pela primeira vez o título de campeões da NBA. Liderados por LeBron James, que já tinha sido bicampeão pelos Miami Heat, os Cavs chegaram a estar a perder por 3-1 na final com os Golden State Warriors, grandes dominadores da época regular, mas deram a volta, chegando ao título ao Jogo 7.

E que dizer dos Cubs? A grande história de desporto coletivo do ano, o título americano de basebol para uma equipa que esperou 108 anos para o conquistar. Mais de um século de ilusões e desilusões, a maior seca de sempre do desporto americano, desaguou na imensa festa dos Chicago Cubs, quando no início de novembro venceram os Cleveland Indians na decisão da World Series.

Do coletivo para o individual, dos campos para as pistas, o destaque incontestável é Nico Rosberg. Filho de campeão do mundo de Fórmula 1, foi ele próprio campeão pela primeira vez. Depois de muito tentar o alemão levou finalmente a melhor sobre o rival e companheiro de equipa Lewis Hamilton, no último Grande Prémio da época. Cinco dias mais tarde surpreendeu o mundo: «Decidi terminar a minha carreira na Fórmula 1», anunciou: «Subi a minha montanha, estou no pico, faz sentido.» Aos 31 anos diz que vai dedicar-se à família e a uma vida mais tranquila.

É raro o que fez Rosberg e não tem paralelo este ano. Nos ralis, por exemplo, o tetracampeão do mundo Sebastien Ogier não se cansa de ganhar. Aos 33 anos, o francês conquistou o quarto título consecutivo e quer mais. Para já, mudou de equipa para a nova época.

E depois há Chris Froome. O ciclista britânico repetiu em 2016 a conquista na Volta a França, o terceiro Tour que conquista em quatro anos. Depois seguiu para o Rio de Janeiro, onde foi terceiro no contrarrelógio, e daí ainda para Espanha, onde rolou até ao segundo lugar na Vuelta. Em outubro, ainda no ciclismo, houve Mundial de estrada e também um bis: o eslovaco Peter Sagan revalidou o título.

Não houve mais reformas-choque sonantes além de Rosberg, mas 2016 teve outras despedidas marcantes. A de Kobe Bryant, que disse adeus aos 37 anos, 20 de NBA, numa noite memorável que marcou com 60 pontos numa última vitória pelos LA Lakers, a sua equipa de sempre. O Maisfutebol estava lá.

Não foi o único na NBA, este foi também o ano de despedida para Tim Duncan ou Kevin Garnett. E, continuando no desporto norte-americano, o fim da linha para Peyton Manning ao fim de 18 épocas como referência da NFL. Disse adeus a chegar aos 40 anos, depois de conquistar uma última Super Bowl com os Denver Broncos, a segunda da sua carreira. «Combati um bom combate.»

Também foi ano de regressos. Entre todos o de Tiger Woods. A personagem mais mediática de sempre do golfe voltou com o ano perto do fim, 15 meses depois de uma longa paragem por lesão. O antigo número 1 do mundo, durante muitos anos no topo da lista dos atletas mais bem pagos do planeta, voltou a competir oficialmente a 1 de dezembro, entrando no Hero World Challenge como 898º do ranking. Aos 40 anos, diz que ainda tem recordes para bater.

Promessas para 2017 mas, antes que acabe 2016, mais memórias do ano que se despede. Não só de conquistas ou fracassos, desporto puro. Proezas improváveis como a de Marcus Willis, o professor de ténis britânico que não só chegou ao quadro principal de Wimbledon como atingiu a segunda ronda e o direito a defrontar Roger Federer. Ou a de Oksana Chusovitina, a ginasta que competiu nos Jogos Olímpicos aos 41 anos, sete presenças consecutivas, um inacreditável exemplo de longevidade.

Momentos marcantes como o mergulho de Shaunae Miller para a meta nos 400 metros olímpicos, gesto dramático que lhe valeu o ouro, à frente da favorita norte-americana Allyson Felix.

E desportivismo. Como a imagem dos irmãos Brownlee na prova que decidiria o título mundial do triatlo. Jonathan sentiu-se mal a menos de um quilómetro do fim, ele que seria campeão se vencesse. Allistair, bicampeão olímpico, vinha atrás e, quando passou pelo irmão, esqueceu a prova e amparou-o até chegarem à meta, onde lhe deu um último empurrão.

Ou o exemplo da neozelandesa Nikki Hamblin e da norte-americana Abbey D’Agostino, a cairem e a ajudarem-se na eliminatória olímpica dos 5000m, uma a voltar atrás para amparar a outra, elas que nem se conheciam antes daquela eliminatória. Pelo atitude, foram ambas repescadas para a final, onde a americana, lesionada, não pôde participar.