Um dérbi adiado logo no mês de fevereiro, uma invulgar chicotada psicológica no FC Porto, o ano quase imaculado do Benfica, as apostas de risco em Marco Silva e Julen Lopetegui e a penúria da Seleção Nacional no Mundial do Brasil.

São só alguns dos momentos escolhidos pelo Maisfutebol para relembrar o que se passou no nosso país ao longo de 2014.

Comente, embirre com as escolhas, diga de sua justiça na caixa de comentários. Há muito para ler e ver.

OS DEZ MOMENTOS NACIONAIS

. DÉRBI BENFICA-SPORTING ADIADO (9 de fevereiro)
E o o céu desaba sobre o relvado da Luz. Bom, na verdade não é bem o céu, mas sim detritos provenientes da cobertura do estádio. Mais rigoroso, menos apocalíptico.

A consequência é imediata: o Benfica-Sporting, relativo à 18ª jornada da Liga 2013/14, tem de ser adiado.

Eis o comunicado oficial divulgado pelas águias no dia do ocorrido: «As más condições climatéricas provocaram pequenos danos na cobertura no Estádio da Luz. Nesse sentido, a Liga Portugal, os dois clubes e a Proteção Civil, em sintonia com a equipa de arbitragem, decidiram o adiamento da partida. Mais informações, nomeadamente sobre a nova data, serão comunicadas em breve».

O dérbi acaba por ser disputado dois dias depois, debaixo de condições meteorológicas menos violentas, nomeadamente no que diz respeito à intensidade do vento.

O Benfica vence por 2-0, golos de Nico Gaitán e Enzo Pérez, cavando uma diferença importante para o rival de Alvalade. Os leões acabariam o campeonato no segundo posto, a sete pontos do vizinho da Segunda Circular.

Já no final de 2013 e num jogo entre a equipa B do Benfica e o Feirense pedaços da cobertura tinham caído sobre a relva. O Maisfutebol escreve, por esses dias, que tudo se deve à fragilidade na cobertura provocada pelo incêndio num dérbi anterior. Um incêndio deflagrado por adeptos do Sporting.

Isto anda tudo ligado.    



. PAULO FONSECA DEMITE-SE DO FC PORTO (5 de março)
Nos corredores do Olival e do Dragão corre um rumor imparável. Embebido de humor e crueldade. «Dead Man Walking», sussurra-se, mesmo muito baixinho, à passagem de Paulo Fonseca, nos últimos dias como treinador do FC Porto.

A piada anda de boca em boca, provavelmente nunca terá sido mais do que uma mentira, mas acaba por descrever bem a fase derradeira da relação entre clube e treinador.

Contestado a partir de uma derrota em Coimbra a 30 de novembro, Fonseca ainda resiste mais três meses. Cai, pelo menos oficialmente, no dia em que completa 41 anos. Não terá comido bolo nem bebido champanhe, após um ciclo de quatro jogos sem triunfos: empate contra o Eintracht, derrota contra o Estoril, empate em Frankfurt e outro empate, em Guimarães. Nada a fazer.

«Nos termos e para efeitos do cumprimento da obrigação de informação que decorre do disposto no artigo 248º, nº1 do Código dos Valores Mobiliários, a FUTEBOL CLUBE DO PORTO – FUTEBOL, SAD vem informar que, em reunião havida esta manhã acordou com o treinador da sua equipa principal de futebol, Senhor Paulo Fonseca, a cessação das suas funções.

Foi ainda decidido pelo Conselho de Administração que a função de treinador da equipa principal de futebol é assumida, interinamente, pelo treinador da equipa B, Senhor Luís Castro»
.

A SAD do FC Porto segura Fonseca enquanto a situação é suportável. Mas a expressão do treinador, quer no banco, quer nos contatos com a comunicação social, começa a evidenciar tristeza e descontrolo. Troca o nome a adversários e dados concretos.

Na última flash-interview, após o 2-2 em Guimarães, diz que o FC Porto tem de ganhar «os oito jogos que faltam». Restavam nove jornadas.
 
. 2014 QUASE PERFEITO DO BENFICA
Não é fácil esquecer mais uma final europeia perdida. Principalmente por ter sido frente ao Sevilha, uma equipa ao alcance do Benfica, e através do desempate por grandes penalidades. Mas, a nível interno, o ano que agora finda foi perfeito para o emblema da Luz.

Pelo menos na sua primeira metade.

A 20 de abril, na receção ao frágil Olhanense, a equipa de Jorge Jesus vence por 2-0 e garante matematicamente a conquista do título nacional. A duas rondas do fim.

Maio começa bem e leva mais um troféu para o museu da Luz. No dia 7, 2-0 sobre o Rio Ave na final da Taça da Liga, golos de Rodrigo e Luisão. Mais tarde, a 18, novo duelo com os vilacondenses e mais uma vitória. Na final da Taça de Portugal, 1-0. Nico Gaitán decide tudo com um golo aos 20 minutos.

Entre estas duas partidas, no dia 14 de maio, a tal derrota difícil de engolir contra o Sevilha. E a prova, mais uma, de que Jorge Jesus tem uma tendência assustadora para falhar na Europa. 0-0 na final de Turim, 4-2 nos penáltis para os andaluzes.

Já na segunda metade do ano, importa sublinhar outros dados: o Benfica comanda o campeonato com autoridade, sim, mas já está fora de prova na Liga dos Campeões (disso falamos noutro ponto) e na Taça de Portugal. 




. JULEN LOPETEGUI CHEGA AO FC PORTO (6 maio)
À hora do almoço, em cerimónia pública, Pinto da Costa acaba com as dúvidas: Julen Lopetegui é o sucessor de Paulo Fonseca (e Luís Castro) e assina um contrato válido por três temporadas. Para o presidente do FC Porto, nem são precisas «muitas explicações» para a escolha.

«Lopetegui tem uma carreira vitoriosa em Espanha e nele depositamos a máxima confiança. Queremos construir uma equipa sólida, com garantias de que nos próximos anos vai voltar a ser o que normalmente temos sido. Queremos continuar a perder de vez em quando, não queremos passar a ganhar de vez em quando», diz o máximo dirigente dos dragões, na apresentação.

Depois de um dos piores anos desportivos no longo reinado de Pinto da Costa, o trabalho de Lopetegui revela-se duro. O FC Porto coloca-lhe à disposição um plantel jovem, sem dúvida, mas de enorme qualidade. Seis meses após a entrada em funções, o balanço é difícil de fazer: irregular no campeonato, imponente na Europa, dececionante na Taça de Portugal.

«Temos uma filosofia de jogo concreta, mas essa ideia terá de entender o contexto e a equipa de jogadores que vamos encontrar. Queremos conseguir o compromisso absoluto de todos para este projeto e queremos ser protagonistas em todas as competições. Queremos, então, jogadores que queiram ser protagonistas», diz Lopetegui, nas primeiras palavras de dragão ao peito.

Eis o saldo total do espanhol no Dragão: 23 jogos oficiais, 15 vitórias, 6 empates, 2 derrotas (Sporting e Benfica).



  . SAI JARDIM, ENTRA MARCO (20/21 maio)
Dois dias de profundas mudanças em Alvalade. Leonardo Jardim interrompe a meio o ciclo de dois anos e parte para o Mónaco, ao encontro dos sonhos megalómanos de Dmitry Rybolovlev. Na altura, ainda pensa que terá ao dispor uma equipa de máxima dimensão europeia. Mais tarde virá a perder Radamel Falcao e James Rodríguez. O Sporting recebe três milhões de euros.

«Leonardo Jardim tem sempre as portas abertas, porque acabámos esta relação de trabalho com um sentimento de respeito e sobretudo de amizade. Foi um ano muito, muito bom e muito agradável em relação ao que tínhamos idealizado para o Sporting», explica Bruno de Carvalho.

«O que sinto agora são sentimentos antagónicos: um sentimento de alguma tristeza por deixar um clube de que gosto muito, mas a verdade é que deixo o Sporting porque vou dar um passo em frente na minha carreira», acrescenta Leonardo Jardim.

E chega Marco Silva, respeitadíssimo após um trabalho de excelência no Estoril-Praia. «Há três candidatos ao título e o Sporting, de forma natural, terá de o ser. Olhando para o orçamento é normal acharem estranho. É uma realidade, é o caminho escolhido, mas isso não retira ambição».

Sete meses depois, a relação entre Bruno de Carvalho e Marco Silva não está no auge da harmonia. O Sporting é quinto na Liga, não segue na Liga dos Campeões (está agora na Liga Europa) e continua em prova na Taça de Portugal.

. PORTUGAL NO MUNDIAL: TRISTE
Três jogos e 17 dias do mais profundo desencanto no Brasil. Uma campanha frustrante, muito aquém das expetativas, a fazer lembrar em alguns detalhes alguns dos piores pedaços da história do futebol português. E Portugal nem aos oitavos de final do Mundial chega. Triste, dececionante.

A 11 de junho, a comitiva aterra no Aeroporto de Vira Copos, em Campinas, cheia de esperança. A glória está ao virar da esquina, mas a primeira derrota, frente à Alemanha (0-4), confirma que o trajeto terá mais espinhos do que rosas.

O desastre de Salvador contra à Mannschaft é apressado pela expulsão de Pepe e uma sucessão de erros sem fim. Seis dias mais tarde, na Amazónia, Portugal volta a falhar e só consegue empatar 2-2 contra os EUA com um golo milagroso de Silvestre Varela no período de descontos.

Para o terceiro jogo, só um milagre (insistimos na expressão) pode manter a nossa seleção em prova. Nada feito. Portugal despede-se com uma vitória por 2-1, mas só consegue ficar no terceiro lugar do Grupo G, atrás de Alemanha e EUA.

Problemas físicos (Fábio Coentrão, Hugo Almeida, Hélder Postiga, André Almeida, Beto), a tal expulsão de Pepe e, claro, um Cristiano Ronaldo em sub-rendimento (apenas um golo, a dez minutos do adeus) marcam a passagem desoladora de Portugal pelo Campeonato do Mundo.

17 dias, três jogos e nada de bom.



. ISLAM SLIMANI E MARCOS ROJO FORA DOS TREINOS (12 de agosto)
Agosto amanhece quente, muito quente, em Alvalade. Islam Slimani e Marcos Rojo iniciam um braço de ferro com a direção de Bruno de Carvalho e pretendem forçar a saída do Sporting, após terem conseguido boas prestações no Campeonato do Mundo.

Rojo, escreve o Maisfutebol, recusa-se mesmo a treinar com a equipa de Marco Silva. Slimani, cuja postura não agradou ao presidente, acaba por ser afastado durante uns dias e falha os primeiros jogos da temporada.

Os dois casos resolvem-se da forma que sabemos. Marcos Rojo acaba mesmo por ser transferido para o Manchester United, com a operação a estar recheada de polémica, e Islam Slimani fica no clube para continuar a ser a principal referência do ataque.

Já agora, Rojo em Manchester tem sido habitualmente titular: leva dez jogos na Premier League e 866 minutos de competição.  

. BENFICA VOLTA A FALHAR NA CHAMPIONS
Já é um clássico: com Jorge Jesus a treinador, ver o Benfica a falhar na Liga dos Campeões é normal. Em cinco participações, as águias só por uma vez ultrapassam a fase de grupos. Na presente temporada, não é diferente, mas com uma agravante. O Benfica acaba em último, atrás de Leverkusen, Mónaco e Zenit, e nem para a Liga Europa se consegue qualificar.

O tema tem sido dissecado com regularidade. As consequências são óbvias (perda de prestígio, quebra de receitas…), os motivos nem tanto.

Talvez o plantel atual não tenha a riqueza dos antecessores, talvez Jorge Jesus prefira priorizar aquilo que melhor consegue controlar (provas nacionais), enfim, muito já foi dito e escrito.

Nesta reta final de 2014, a guilhotina abate-se sobre a águia de uma forma particularmente dolorosa. Em seis jogos no Grupo C, apenas uma vitória (Mónaco, em casa) e um conjunto de aparições desprovido de ambição e qualidade.

O próprio Jesus aparenta um descontrolo estranho nas declarações públicas. Benfica e Liga dos Campeões: uma relação difícil.   
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. SPORTING ELIMINA FC PORTO DA TAÇA DE PORTUGAL
Antes do Clássico, jogado a 18 de outubro, o Maisfutebol
entrevista Mário. Em 1987, Mário abatera o FC Porto de leão ao peito, num jogo histórico para o Sporting.

A efeméride sublinha a raridade dos triunfos leoninos no Dragão. Nada indica, na hora de atribuir favoritismo, que serão os homens de Marco Silva a levar a melhor sobre as tropas de Julen Lopetegui. Mas é aí que entra a beleza do futebol.

Tal como escrevemos na crónica do jogo, os dragões não sabem ter bola e tropeçam nos equívocos do próprio treinador. A primeira derrota azul e branca, na nova época, é servida com requintes de malvadez e justiça: 1-3 para o Sporting, sem grande contestação.

O FC Porto perde nesse jogo a possibilidade de lutar pelo acesso ao Jamor. Já lá não vai desde maio de 2011, ainda com André Villas-Boas. Nessa edição derrota o Vitória Guimarães por 6-2.

Ironicamente, o Sporting não aproveita esse impulso emocional e entra depois numa fase de grande instabilidade, de resultados e exibições. Por trás dessa irregularidade, a relação entre Bruno de Carvalho e Marco Silva começa a degradar-se.




. BENFICA GANHA NO DRAGÃO A FECHAR 2014
Julen Lopetegui tem duas derrotas como treinador do FC Porto. Mas duas derrotas particularmente duras: em pleno Dragão e às mãos dos maiores rivais, Sporting e Benfica.

Esta segunda, já a 14 de dezembro, tem Lima como carrasco-mor. O brasileiro faz dois golos na baliza de Fabiano Freitas e é o hit-man escolhido por Jorge Jesus, numa tática sobranceira e cheia de matreirice.

Mais do que aplaudir a estratégia do Benfica ou criticar a precipitação do FC Porto na hora do remate, é importante destacar o que esta derrota dos dragões faz à classificação do campeonato.

O Benfica chega com uma vantagem de três pontos ao Dragão e sai de lá com seis pontos de conforto. Num ano em que as exibições das águias, no que diz respeito à espetacularidade (ou nota artística), baixam abruptamente, não deixa de ser irónico que a diferença em dezembro esteja cifrada de forma tão contundente.

As reações dos dois treinadores, profundamente distintas, capitalizam o poder da rivalidade entre os grandes dominadores do futebol português.

Diz Lopetegui: «Estou muito, muito convencido de que o FC Porto será campeão».
Rebate Jesus: «Fomos realistas, eficazes e merecemos ganhar».