«Todos os treinadores meteriam um central, naquela situação», diz Fary. Quase todos. O Special One não. A 23 de Fevereiro de 2002, Mourinho sofreu a última derrota como anfitrião, em jogos dos campeões nacionais. Porquê? Porque quis vencer, mesmo com um F.C. Porto reduzido a nove.

Esse desaire frente ao Beira Mar, por estranho que pareça, serviu de cartão de visita para um treinador com um futuro brilhante no horizonte. Oito anos depois, percebe-se verdadeiramente a mentalidade vencedora do treinador português.

José Mourinho chegou às Antas e prometeu o título nacional para o ano seguinte. Contudo, o técnico ainda acreditava na recuperação imediata. A derrota frente aos aveirenses afastou o sonho.

«O F.C. Porto vinha de várias vitórias consecutivas, mas perdeu aí a corrida pelo título, em minha opinião. Talvez por isso, mesmo em inferioridade numérica, o Mourinho manteve sempre a estrutura e a equipa jogou de forma agressiva», recorda António Sousa, treinador do Beira Mar, à época.

«Vais rebentar com aquilo tudo»

Jorge Andrade foi expulso antes da meia-hora, ao derrubar Bruno Ribeiro à entrada da área do F.C. Porto. Na conversão do livre, Cristiano colocou os visitantes em vantagem. No meio da confusão, Deco ainda viu um amarelo por protestos.

Apesar da inferioridade numérica, Mourinho não mexe. «Qualquer treinador meteria um central, para recompor a defesa. Se calhar, dessa forma, não perderia o jogo. Mas ele quis ganhar», repete Fary, ao Maisfutebol.

Ainda antes do intervalo, McCarthy empata após assistência de Deco. O F.C. Porto renascia. «Eu andava a marcar golos, mas nesse jogo o treinador disse-me que ia começar no banco. Pediu-me desculpa e avisou: na segunda parte, vais entrar para rebentar com aquilo tudo», recorda Fary. Assim foi. Entrou e marcou dois golos.

O Beira Mar venceu (2-3) mas nunca pensou sofrer tanto, contra nove elementos. O senegalês marcou o seu primeiro golo ao minuto 52 e Deco foi expulso por acumulação a um quarto-de-final. Tudo parecia resolvido.

«Calma, que eles estão mortos!»

Mourinho foi corajoso. Sem Jorge Andrade, ficou com a defesa a três e pediu a Paredes para compensar. Na segunda parte, lançou Costinha para tirar Ricardo Carvalho, o central que sobrava. Ainda apostou em Postiga e Paulo Costa. Tudo para vencer.

«Continuaram a jogar de forma muito agressiva e chegaram mesmo ao 2-2! Lembro-me que conseguimos enervá-los mas nessa altura estávamos a perder o controlo. Chamei o Jorge Neves e disse-lhe para transmitir ao grupo: tenham calma, circulem a bola que eles estão mortos», conta António Sousa, ao Maisfutebol.

Nos últimos dez minutos, o F.C. Porto empata, mas joga com nove e sem centrais de raiz. Está de rastos, fisicamente. Dera tudo o que tinha. Não chegou. Fary aproveita novo passe magistral de Juninho Petrolina para bisar e fazer o resultado final (2-3).

«O Sousa mandou-me aquecer logo quando o Jorge Andrade foi expulso. Ele sabia que eu era mais rápido que o Ricardo Carvalho ou o Paredes, que estava a fazer as dobras. Se o Mourinho tivesse metido um central, se calhar não perdia», repete Fary, pela terceira vez. Pois não. Mas também não venceria tanto como venceu, até hoje. Já lá vão oito anos.