Por muita antipatia que gere a figura de Blatter, é justo reconhecer que todos achámos arriscado (para não dizer pior) fazer um Mundial na África do Sul e ele funcionou.

Ao escolher a Rússia e o Qatar, a FIFA voltou a fazer escolhas de alto risco, embora por razões diferentes.

A Rússia é um grande país, tem uma selecção respeitada, alguns clubes com nome no futebol europeu, jogadores competentes e será certamente capaz de organizar uma boa prova.

No entanto, é um país de enormes dimensões, ainda relativamente fechado e desconfiado do que chega de outras partes do globo. Não seria o sítio mais óbvio para realizar um Mundial, mas se tudo decorrer bem, como se acredita, a Rússia sairá de 2018 mais conhecida e conhecedora. E, como ensina a Antropologia, conhecer o outro é um passo na direcção da tolerância e da confiança.

Com o Qatar as preocupações são outras. O país, pequeno mas saudável economicamente, não tem propriamente uma selecção e o futebol que por lá se joga não se aconselha. Acresce que as condições climatéricas (como será a temperatura no Mundo daqui por 12 anos?) não entusiasmam quem tem de praticar desporto. E no entanto o Qatar tem conseguido fazer passar por lá competições e talentos internacionais.

É um país rico, com um crescimento de 9 por cento ao ano e onde seguramente não faltarão condições para se jogar. Acresce que o Qatar se situa numa zona particularmente sensível do globo e todos teremos a ganhar se, mais uma vez, o futebol servir para estreitar laços e derrubar barreiras muitas vezes construídas em cima da ignorância e do preconceito.

Os cínicos dirão que a FIFA escolheu países com abundantes riquezas naturais e escassas virtudes. Mas esses são olhares ocidentais e a nossa prática e a nossa história não nos autorizam a emitir juízos morais sobre os outros.

Mais do que o caminho que levou à escolha, admira-se o risco e deseja-se que no final o futebol ganhe.

P.S.: Sinceramente, só com esforço reparei que Espanha e Portugal estavam na corrida ao Mundial 2018. Esta candidatura nunca teve alma, nunca envolveu a população e, no fundo, nunca pareceu capaz de acreditar em si própria. Talvez porque não fizesse sentido desde o início. Lamentável que o governo tenha tentado a demagogia da criação de emprego para explicar o empenho.