Mesmo que no próximo domingo perca frente ao Real Madrid, como é expectável, o Kashima Antlers está já a fazer história.

Pela primeira vez, uma equipa asiática vai marcar presença na decisão do título mundial de clubes.

Nas doze anteriores edições da prova organizada pela FIFA entre os campeões de cada confederação, aos quais se juntam o campeão nacional do país organizador, apenas duas equipas africanas se intrometeram na tradicional disputa entre europeus e sul-americanos: os congoleses do Mazembe, em 2010, e o anfitrião marroquino Raja Casablanca, em 2013, foram os únicos outsiders na final.

Agora é a vez do Kashima, que das sete equipas em prova é a única que não é campeã da sua confederação, mas beneficia da sétima vaga, atribuída ao país organizador, por ser campeã em título do Japão. Aliás, é a terceira vez que um não-campeão continental chega à final, depois do Corinthians, que até conquistou o título na edição de estreia, em 2000, e o Raja Casablanca, em 2013.

A condicionante de ser apenas campeão nacional faz com que a equipa japonesa tenha feito três jogos na prova na última semana, o maior percurso possível até chegar à final: à vitória por 2-1 sobre os neozelandeses Auckalnd City  no play-off, seguiu-se o triunfo por 2-0 sobre os sul-africanos do Mamelodi Sundowns e depois a grande surpresa com o triunfo claro por 3-0 sobre o Atlético Nacional a valer o inesperado apuramento dos nipónicos para o jogo da decisão.

Kashima Antlers já ultrapassou três campeões continentais

Oceânia, África e América do Sul; três campeões continentais ao tapete. Agora, chegou a vez de o Kashima Antlers defrontar o colosso europeu Real Madrid, que entrou em prova apenas nas meias-finais e teve apenas de eliminar ontem os mexicanos do América para chegar à final, domingo, no Estádio de Yokohama, pelas 10 horas portuguesas.

O clube tem a vantagem de jogar perto de casa, já que Kashima e o distrito de Ibaraki, onde está baseado, estão às portas, aliás, quase a serem «engolidos» pela imensa área metropolitana de Tóquio. No entanto, a desvantagem na final, além de um percurso mais longo na competição, passa principalmente pela abissal diferença de valores entre os dois oponentes.

Segundo o site especializado Transfermarkt, o Real Madrid tem um plantel 53 vezes mais valioso que a equipa japonesa: o valor estimado dos passes da equipa merengue é de 775,8 milhões de euros, enquanto o adversário fica-se pelos 14,4 milhões. É a diferença entre ter estrelas como Cristiano Ronaldo, Benzema, Bale, Modric ou Pepe ou ter uma equipa modesta, com apenas dois estrangeiros (ambos brasileiros); um deles Fabrício, médio-ofensivo que entre 2012 e 2015 atuou na II Liga Portuguesa ao serviço do Portimonense.

Porta de entrada de Zico no futebol japonês

O prémio para quem apostar num triunfo do Kashima sobre o Real Madrid é treze vezes maior do que o desfecho contrário. Não será exagero dizer que esta é uma das finais mais desiguais de sempre. Apesar de ser o clube com mais títulos nacionais na J-League (8), a presença na final do Mundial de Clubes é possivelmente o maior dos feitos do clube fundado em 1947 pela gigante metalúrgico Sumitomo.

Criado após o final da II Guerra Mundial, em Osaka, pelos trabalhadores daquele que é hoje um dos maiores conglomerados industriais do Japão, o clube mudou a sua base para a fábrica de Kashima, em 1975.

A mudança para a pequena cidade costeira com pouco mais de 60 mil habitantes e conhecida como «ilha dos cervos» fez com que o clube adotasse e popularizasse precisamente esse animal como símbolo, como aliás está bem patente no seu escudo. Sobretudo quando em 1993 abdicou da designação de Sumitomo Metals e trocou-a pelo nome Antlers, começando aí os seus anos de glória com a criação da J. League.

Como o suporte financeiro da Sumitomo, que controla o clube até aos dias de hoje, o Kashima teve um papel decisivo nos primeiros passos da era da profissionalização do futebol japonês, em particular com a contratação de Zico, que jogou no clube entre 1991 e 1994, e virou ídolo de todo o país.

Zico sempre muito popular no Japão

Zico viria a treinar a equipa em 1998 e abriu caminho a outros técnicos e jogadores com origem no Brasil. Aliás, de todos os estrangeiros que já representaram o Kashima Antlers só três não são brasileiros e neste século, até 2015, o Antlers foi orientado por Oswaldo Oliveira, Paulo Autuori, Jorginho e Toninho Cerezo, quatro brasileiros, que ajudaram o Antlers a tornar-se no clube com maior êxito desportivo do país, conquistando 18 títulos entre J. League (8), Taça da Liga (6) e Taça do Imperador (4).

No entanto, o maior êxito, à escala internacional, surge agora pela mão do técnico Masatada Ishii, que substituiu Cerezo na última época e tornou-se no primeiro japonês desde 1999 a comandar a equipa.

Ishii é um homem da casa, como jogador atuou pelo clube entre 1991 e 1997, esteve na transição para o profissionalismo e foi colega de Zico no meio-campo nos primeiros tempos do Kashima na J. League. Agora, ele e uma equipa quase 100 por cento nacional reforçada com dois brasileiros sem nome na praça, num grupo de ilustres desconhecidos do planeta-futebol, vão tentar enfrentar Cristiano Ronaldo e companhia pela disputa do título mundial.