Lembra-se de Keylor Navas em 2014, não é?

Chegou ao Mundial com 27 anos e apenas duas épocas na Liga Espanhola, ao serviço do Levante. No Brasil somou grandes exibições, foi fundamental para a Costa Rica se tornar a sensação da prova e justificou a transferência para o Real Madrid.

Já agora, está recordado de Ozil e Khedira? O primeiro levava dois anos como titular do Werder Bremen, o segundo era fundamental no Estugarda há três épocas. Na África do Sul ajudaram a Alemanha a terminar no terceiro lugar e saíram de imediato para o Real Madrid.

Há mais casos, claro. É impossível, por exemplo, esquecer Miroslav Klose. Em 2002 ainda aparecia no Kaiserslautern e tinha sido titular pela primeira vez na seleção quatro meses antes, quando no Mundial da Coreia e Japão fez cinco golos em sete jogos, ajudou a Alemanha a chegar à final e se tornou definitivamente um dos grandes avançados de então.

A verdade é que os Mundiais são competições especiais.

Mesmo que o futebol de hoje em dia deixe pouco espaço a surpresas, há sempre jogadores que aproveitam uma grande competição como esta para saltarem para o estrelato.

Ora por isso, e depois do Mundial, o Maisfutebol apresenta uma lista de dez jogadores que aproveitaram o Qatar para darem um passo em frente e subirem à montra do futebol. Estão prontos para dar mais um salto na carreira e os grandes clubes andam de olho neles.

Enzo Fernández, 21 anos, Argentina

O céu é o limite

Para nós não se valorizou assim tanto, afinal de contas já todos o conhecemos muito bem e sabemos que aquilo que fez no Qatar é no fundo o que faz todos os dias. Mas por razões que escapam à própria razão o mundo teima em não dar a atenção à Liga Portuguesa que dá, por exemplo, a um Campeonato do Mundo. Por isso, e só por isso, Enzo Fernández terá sido uma revelação para muita gente. Ele que até começou o Mundial no banco, entrando na segunda parte dos dois primeiros jogos, para depois agarrar a titularidade e nunca mais a largar. Marcou um golo, fez uma assistência, somou duelos ganhos e bolas recuperadas. No fim arrecadou o prémio de melhor jogador jovem do Mundial e confirmou que aos 21 anos o céu é o limite.

Moisés Caicedo, 21 anos, Equador

Futebol de bairro pronto para dar o salto

O choro descontrolado e os abraços dos colegas, após a eliminação frente ao Senegal, correram mundo e comoveram os adeptos, mas não é por isso que Moisés Caicedo está nesta lista: o menino de 21 anos mostrou no Qatar porque ameaça ser um dos médios defensivos de referência no futuro. Fisicamente forte, muito voluntarioso e sempre disponível, é um monstro a ganhar duelos, a travar a saída do adversário e, claro, a recuperar bolas. Para além disso, e ao contrário de outros médios defensivos que também deram nas vistas no Qatar, consegue começar a construir, não se limitando a entregar a bola: sabe sair a jogar e encontra linhas de passe. Nascido numa família muito pobre de dez irmãos, foi notícia por, após terminar o Mundial, surgir a jogar com os amigos no campo de terra batida (e muito desnivelado) do bairro de lata de Santo Domingo onde cresceu. Ele que é figura do Brighton, está avaliado em quase 40 milhões de euros e se diz ser pretendido por Chelsea e Liverpool.

Azzedine Ounahi, 22 anos, Marrocos

Por onde raio é que andava?

Provavelmente a maior revelação do Mundial. Há um ano e meio, por exemplo, jogava na terceira divisão francesa. No verão de 2021 foi contratado pelo Angers, em janeiro deste ano estreou-se na seleção e agora encheu o Mundial com pormenores de classe e uma habilidade fabulosa. Foi o grande motor do meio-campo de Marrocos, mostrando recursos para encher o jogo: inteligência, muita técnica, velocidade de condução e excelente remate. É um daqueles atletas que salta à vista e dá gozo ver jogar. Tudo nele é talento e elegância: a capacidade de tirar adversários do caminho e gerar desequilíbrios vem embrulhada num estilo requintado. Será por isso, aos 22 anos e a jogar no Angers, um dos jovens mais apetecíveis para o mercado.

Josko Gvardiol, 20 anos, Croácia

Um craque ao alcance de poucos

Não é uma revelação do Mundial, longe disso: basta dizer que já joga no Leipzig, soma 43 jogos na Bundesliga, dez na Liga dos Campeões e o ano passado fez quatro no Euro 2020 (embora sempre a lateral esquerdo). Aos 20 anos e a realizar a segunda época fora da Croácia, porém, não seria um nome do conhecimento geral. Uma falha que o Mundial 2022 resolveu. Gvardiol mostrou no Qatar toda a qualidade: presença física, leitura de jogo, tempo de entrada e capacidade de sair a jogar pela esquerda. É verdade que Messi colocou tudo em causa quando o envergonhou, para assistir Julián Alvarez para o terceiro golo nas meias-finais, mas vamos ser honestos: é Messi, não é? Quem nunca? Para além disso, e como diria Georgina Rodriguez, na vida não perdemos, aprendemos. Aos 20 anos, Gvardiol tem tudo para crescer até ao topo. Só tem um problema: avaliado em 60 milhões de euros, está ao alcance de poucos.

Alexis MacAllister, 23 anos, Argentina

Corre, pressiona, recupera, assiste e marca

Uma das figuras do Mundial 2022, seguramente. O futebol musculado, atlético e ao mesmo tempo esclarecido do médio foi fundamental no jogo da Argentina. MacAllister é um jogador raro no futebol atual: um número dez no Brighton, que consegue ser ao mesmo tempo oito e por vezes até seis. Ocupa os espaços, recupera bolas, pressiona adversários, compensa companheiros, dá linhas de passe e ainda aparece a desequilibrar no último terço. Na seleção da Argentina até começou o Mundial no banco, nem sequer jogou na estreia com a Arábia Saudita, mas a partir daí foi sempre titular e precioso pela forma como correu, lutou e transportou jogo. Marcou um golo, fez uma assistência na final e mostrou que pode ambicionar mais do que o Brighton, que o descobriu no Argentinos Juniors aos 21 anos.

Dominik Livakovic, 27 anos, Croácia

Certificado de segurança e sobriedade

Começou a defender a baliza do NK Zagreb, na Liga Croata, com 17 anos. Nesta altura, portanto, já leva dez anos de futebol profissional e quase 400 jogos. Foi suplente no Mundial 2018, titular no Euro 2020 e brilhou no Qatar, sobretudo frente ao Japão, nos oitavos de final, quando se tornou o terceiro guarda-redes na história a defender três penáltis num jogo do Mundial. Apesar do estilo sóbrio, mostrou ser um homem seguro e confiante, fundamental com várias defesas muito eficazes na caminhada da Croácia até às meias-finais do Campeonato do Mundo. Filho de um antigo secretário de Estado do governo croata, chegou a matricular-se na universidade em Diplomacia e Relações Internacionais, mas aos 27 anos, e após cinco títulos de campeão pelo Dínamo Zagreb, tem tudo para dar o salto (e manter a matrícula congelada).

Gonçalo Ramos, 21 anos, Portugal

Só Mbappé conseguiu fazer igual

O Mundial mudou-lhe completamente a vida: entrou na lista de convocados como terceiro ponta de lança, saiu do Qatar como titular. Pelo meio tornou-se conhecido de toda a gente (até por ter sido o homem que atirou Ronaldo para o banco). A verdade, porém, é que Gonçalo Ramos fez mais do que isso: frente à Suíça, num festival de futebol da Seleção Nacional, marcou três golos e tornou-se destaque ao lado de nomes como Eusébio, Pelé ou... Cristiano Ronaldo. Aliás, no Qatar só Mbappé conseguiu também fazer um hat-trick. Aos 21 anos, o ponta de lança do Benfica mostrou intuição pelo golo, marcou a cada 51 minutos jogados e encheu os olhos dos grandes clubes europeus com aquele entusiasmo de um jovem goleador.

Nayef Aguerd, 26 anos, Marrocos

Enquanto as lesões permitirem...

As lesões voltaram a traí-lo, num sinal de que continua a ser perseguido pelo maior receio de quem investe na contratação de um jogador. Apesar disso, e enquanto durou, Aguerd mostrou que é de facto uma das boas soluções para o centro da defesa: domina o jogo nas alturas (tanto defensiva como ofensivamente), ou não tivesse quase 1,90 metros. Impõe capacidade física, lê bem o jogo e tem um ótimo tempo de entrada sobre a bola. É certo que às vezes parece algo descoordenado, mas é sobretudo ilusão de ótica, até porque mostrou boa capacidade de passe longo com o pé esquerdo. Fez quatro jogos de grande nível, até se lesionar na parte final da partida com a Espanha. Apesar de o Mundial o ter valorizado, não é um jogador barato: o West Ham deu 35 milhões de euros por ele há cerca de meio ano.

Aïssa Laïdouni, 26 anos, Tunísia

Um puro-sangue

Estreou-se na Liga Francesa com 19 anos, pelo Angers, quando ainda era júnior e fez um jogo-treino em que irritou os seniores pelo fulgor com que disputava cada bola. A verdade é que é um puro-sangue. Chega a ser demasiado duro, mas a verdade é que se entrega ao jogo com enorme paixão, ganha muitos duelos, tem capacidade técnica e queima linhas em progressão com a bola. Apesar de se ter estreado muito cedo na Liga, não confirmou as promessas no futebol francês e acabou por dar nas vistas apenas quando saiu para a Roménia. Atualmente joga no Ferencvaros e já foi eleito o melhor jogador na Hungria. No Qatar mostrou qualidades que despertaram a cobiça do Celtic, ele que nasceu nos subúrbios de Paris, cresceu no modesto Montfermeil e tem três nacionalidades: tunisina, francesa e argelina.

Andries Noppert, 28 anos, Países Baixos

O futebol é uma coisa fantástica

Mede dois metros e três centímetros, e ainda bem: é preciso espaço, mesmo que seja em altura, para arrumar uma história tão grandiosa. Há dois anos era suplente numa equipa da II Liga Neerlandesa, nunca tinha conseguido fazer mais de cinco jogos por época e foi aconselhado pela namorada a tentar uma carreira na polícia. Até que em janeiro de 2022 tudo mudou: tornou-se titular do Go Ahead Eagles e garantiu a transferência para o Heerenveen. Chegou ao Qatar sem nunca ter jogado pela seleção, mas foi lançado a titular e tornou-se destaque: numa equipa de tração à retaguarda, Noppert colecionou defesas que alimentaram a sobrevivência dos Países Baixos. Com um estilo semelhante ao de Van der Saar, mostrou capacidade de reação e excelentes reflexos. Não evitou a eliminação nos penáltis com a Argentina, é certo, mas aos 28 anos mostrou que ainda vai a tempo de construir uma excelente carreira.