O primeiro impacto assusta. No relvado, os jogadores da Selecção Nacional parecem monstros. Sagrados, pois claro. Ninguém lhes pode tocar, o Mundial está já aí à porta. Receosos, encolhidos, avançam para a arena dos sonhos. Desejos de utopia assumem os contornos da realidade; os caprichos da vida resgatam-nos do anonimato e lançam-nos ao circo de feras.

«Isto não me volta a acontecer, de certeza. Era algo inimaginável para mim. Quando soube que ia treinar com a Selecção Nacional fiquei perplexo, sem reacção», conta ao Maisfutebol Renato Silva, médio da Associação Desportiva da Estação, um dos jovens brindado com o travo adocicado da surpresa. Durante uma semana esteve olhos nos olhos, todos os dias, com os internacionais portugueses.

Rui Silvestre também joga no Estação. Tem 19 anos e é candidato ao curso de Fisioterapia. «Sinto-me muito orgulhoso por ter treinado com a Selecção Nacional. Só me falta ver o Cristiano Ronaldo. Quando ele chegar nem sei o que lhe vou dizer.»

Num ápice, a metamorfose. A necessidade da selecção, castigada pelas inúmeras ausências, alinhou-se com o prazer perfeito de alguns adolescentes da Covilhã. Renato e Rui ainda parecem perdidos na névoa do encanto. Nani, principalmente ele, ajudou a tornar o sonho cor-de-rosa.

«Foi a pessoa que mais falou comigo. Pôs-me completamente à vontade. É mesmo boa pessoa. O Miguel Veloso e o Pedro Mendes também me ajudaram a entender o que eu tinha de fazer», diz o primeiro. «O Nani é extremamente divertido. Até jogámos pingue-pongue», confidencia Rui Silvestre, ainda nas nuvens.

«O Fábio Coentrão é o mais calado de todos»

Invasão de intimidade. Uma visita ao âmago dos craques, de mão dada com todos eles. Só Fábio Coentrão preferiu manter as distâncias. Nisto, Renato e Rui também concordam. «É o mais calado de todos. Não conviveu tanto connosco, talvez por ser ainda novo no grupo da selecção.»

Bola a rolar, uma batalha de iguais, sem divisões estatutárias. «No futebol puramente dito, o que mais me impressionou foi o Pedro Mendes, pela simplicidade de processos. Assemelha-se muito a mim», refere Rui Silvestre. Renato aprendeu a admirar o comportamento do médio do Sporting no jogo, embora também guarde elogios para Nani e Miguel Veloso.

«O Nani é fenomenal com a bola. Faz coisas impressionantes», observa. «E também é o mais durinho. Luta muito. Eu não queria fazer má figura e evitei fazer entradas agressivas. O professor Queiroz pediu-nos que facilitássemos, para não haver lesões», explica, ainda nas nuvens.

A melhor prenda e um golo diante de três mil pessoas

«A melhor prenda de anos que um rapaz de 19 anos pode ter.» Rui Silvestre passou o aniversário lado a lado com os internacionais portugueses. Nem nos seus anseios mais secretos ousou sonhar com algo assim.

«É óptimo. Até marquei um golo ao Daniel Fernandes e ouvi palmas de três mil pessoas», conta, cheio de vontade de seguir com a selecção para a África do Sul. Isso é que já não será possível. Mas Rui não tem razões para ficar triste. O jovem defesa-central vai ficar na Covilhã. «Vou guardar esta experiência para sempre.»

Uma semana a treinar nas nuvens, a melhor prenda que um rapaz de 19 anos pode ter.