Em «Winning Time», série da HBO que conta a ascensão dos Lakers entre o final da década de 70 e os anos 80, a humildade do rookie Earvin Johnson é testada no estágio de pré-época. Dias a fio, mal o sol acabava de nascer havia duas coisas que não podiam faltar quando Kareem Abdul-Jabbar abria a porta do quarto a Magic: um sumo natural e o jornal do dia.

Quando chegou aos Sacramento Kings nesta época, Neemias Queta também passou por provações. «Tive algumas praxes. Tive a sorte de não ter de carregar uma mala cor de rosa, mas antes dos jogos tive de ir comprar comida para os voos. Era o meu papel, acho que fiz um bom trabalho e eles não me deram muito na cabeça», contou o primeiro português de sempre da NBA em declarações à margem de um evento organizado pelo patrocinador das Ligas portuguesas de basquetebol masculina e feminina.

Polémica, mas importante quando é inclusiva, a praxe é também um meio de manter pés assentes no chão. E Neemias, apesar de vê-lo do alto dos seus 2.13 metros, não anda nas nuvens. «Tenho uma fé muito forte e a partir do momento em que tenho a família sempre do meu lado, isso facilita-me a vida. Tenho sempre uma boa base, uma relação com toda a gente da minha família e com os meus amigos de infância que mantenho até hoje. Acima de tudo, é importante manter os pés assentes na terra e saber de onde eu vim para saber para onde quero ir.»

Desejo que continuar em Sacramento, mas a NBA é… business

Neemias Queta termina contrato com os Sacramento Kings no final desta temporada, mas o objetivo do poste português é continuar na equipa que lhe permitiu tornar-se no primeiro português de sempre na NBA.

«Eu e a equipa temos uma boa relação, mas até estarmos todos na mesma página não há garantias. Isto é um negócio e temos de estar prontos para tudo o que pode acontecer. Gosto de estar em Sacramento, sei que eles gostam de mim e, havendo interesse de um e de outro, podemos resolver isso facilmente», afirmou o poste.

«Há sempre a vontade de querer ficar, mas todos sabemos como é o mundo do negócio. Temos de estar prontos para tudo o que pode acontecer. Vamos esperar para ver. Temos uma boa relação e agora é mesmo esperar para ver o que acontece. Ainda é cedo. Não posso entrar em detalhes porque não sei mesmo. Estou confiante, mas não tenho certezas. Só posso preocupar-me com o que posso fazer», acrescentou depois em declarações à TVI.

Ainda assim, Neemias fala como se o futuro passasse por Sacramento, equipa que não se apura há mais de década e meia para os playoffs da NBA. «Tenho sempre a ambição de querer ajudar a equipa a ganhar e a estar ao mais alto nível. Sacramento é uma das equipas que está há mais tempo sem ir aos playoffs e isso dá-me mais vontade de querer continuar a trabalhar para fazer parte da equipa que acabou com a seca dos playoffs. Temos um bom grupo e tudo para dar certo no futuro. Vamos continuar a trabalhar para eventualmente podermos ser nós a acabar com essa maldição ‘entre aspas’.»

O caminho para ser um «poste dominante»

Na primeira época na maior liga de basquetebol do Mundo, Neemias totalizou pouco mais de 100 minutos ao serviço dos Sacramento Kings. Pouco tempo, mas ainda assim, garante, suficiente para crescer como jogador e, também, saber que pertence àquela elite. «Foi uma conquista muito boa para mim e para o basquetebol português. Percebi que nesses 119 minutos consegui encaixar bem na Liga e não parecer uma peça à parte, mas acho que ainda tenho muito pela frente para conseguir singrar», vincou.

Foto: José Sena Goulão/Lusa

Aos 22 anos, Neemias Queta já não deverá continuar a crescer em altura ou no tamanho do pé (52), mas não tem dúvidas sobre por onde passa o crescimento como basquetebolista para atingir o estatuto que pretende: tornar-se num poste dominante na NBA.

«Acho que preciso de trabalhar mais o físico. Tem sido um dos meus focos desde que comecei a levar o basquetebol a sério. E também acho que tenho de continuar a estender o meu jogo, a lançar mais de fora. Já me sinto confortável debaixo do cesto com qualquer mão: floaters, meia-distância… agora, preciso de afastar-me mais do cesto, também com triplos», elencou.

O tema do físico está constantemente presente no discurso de Neemias. Porque Neemias sabe que é isso que vai permitir-lhe subir de patamar competitivo e dificultar a vida aos adversários mais poderosos como, por exemplo, Joel Embiid, estrela dos Philadelphia 76ers. «Foi o jogador com quem eu mais gostei de jogar. Naquele jogo sacou-me duas faltas num minuto e isso deu-me ainda mais vontade de continuar a trabalhar e de poder eventualmente fazer um bom match up contra ele e jogar da melhor maneira contra um dos melhores postes da NBA», diz Neemias, que elege Hakeem Olajuwon como o melhor poste de sempre.

Isso, reconhece, é «debatível». Mas poder – aos 22 anos e ainda a dar os primeiros passos da carreira na elite do basquetebol – ser considerado o melhor basquetebolista português da história, não o é. «Não penso nisso. Ainda sou muito novo e tenho muito pela frente.»

Esse dia, acredita-se, chegará, mas até lá Neemias só pensa em continuar a evoluir. E em manter os pés assentes no chão. Mesmo vendo-o lá do alto.