De Rentería o país guardou uma imagem que há-de viver uma boa mão-cheia de anos: no Estádio da Luz, em clássico decisivo, falhou o golo a dois metros da baliza.

O instante não foi bonito de se ver, é verdade. Pelo menos de uma certa perspectiva não foi. Mas também não foi tão grave como quiseram fazer crer.

Nesta altura baixo-me para evitar os tiros dos leitores portistas. Um momento. Se me deixarem terminar, posso explicar.

Obrigado.

Dois anos depois percebe-se que aquilo não foi um desvario inoportuno. Não. Foi isso sim uma espécie de certificação: apresentou-nos Rentería em todo o seu esplendor.

Depois desse desacerto escandaloso já houve mais um. E outro. Mais outro, outro e outro. San Siro, por exemplo, apresentou-nos um par de bons exemplos.

Quem tem acompanhado os jogos do Sp. Braga sabe que é normal o colombiano falhar mais do que marcar.

Um problema de finalização? Não, leitor, é mais do que isso. É um veículo de afirmação. Onde a maior parte vê um defeito, eu vejo um feitio. Uma declaração de personalidade.

Não tenho dúvidas que Rentería é o melhor avançado do Sp. Braga. É genuinamente o mais técnico, o mais explosivo, o mais capacitado. O mais talentoso.

Faz tudo bem. Recebe, toca, roda, finta, corre, foge, cria futebol, aparece nos espaços certos. Depois falha. Faz tudo bem até ao momento da glória. Nessa altura, passa ao lado. Tem o sucesso a um palmo de distância e passa ao lado.

Parece patológico.

Mas porquê, meu Deus? Simples. Rentería é o anti-herói. O anti-self-made man, o anti-sonho americano. Uma pessoa encantadora, portanto.

Ora numa altura em que em a ocidente do Atlântico nos pressionam com exemplos de gente que não tinha nada para atingir a glória e chegou lá, Rentería repõe com alguma sensibilidade a nossa auto-estima.

Ele, sim, tem tudo para atingir a glória e não chega lá.

Em suma: se é verdade que sim, podemos, o colombiano encarrega-se de nos mostrar que sim, se não pudermos também não vem mal ao mundo. Ele é a prova de que não vale a pena ficarmos angustiados.

Acho que todos lhe devemos um agradecimento sincero, por isso. Peace, brother!

«Box-to-box» é um espaço de opinião da autoria de Sérgio Pereira, jornalista do Maisfutebol, que escreve aqui todas as segundas e quintas-feiras