Bem ao jeito africano, os jogadores cantavam e dançavam. Como se não houvesse amanhã.
Drogba impôs silêncio. Ajoelhou-se e pediu aos colegas que se ajoelhassem. Pegou num microfone, olhou para a câmara e de lágrimas nos olhos lançou um pedido sentido: «Perdoem-se».
Com palavras simples, implorou que os costa-marfinenses do norte, do sul, do este e o oeste depusessem as armas e fizessem a paz.
A Costa do Marfim rebentou num pranto.
«Eu chorei, a minha mulher chorou, todo o país chorou», disse um responsável político em reportagem da Vanity Fair.
O que é certo é que se perdoaram.
Cinco anos, milhares de mortos e milhões de refugiados depois, a Costa do Marfim estava disposta a respeitar um tratado de paz.
Poucos meses depois, por iniciativa do mesmo Drogba, a selecção recebeu Madagáscar em Bouaké, a capital do norte, ocupada pelos rebeldes.
Foi a primeira vez que os responsáveis do Governo puderam entrar no espaço. Melhor do que isso, foi a primeira vez que conseguiram entrar no espaço dos rebeldes e sair. Com vida.
Ora numa altura em que se discute com tanto barulho quem deve ser eleito o melhor jogador do mundo, não posso deixar de lembrar Drogba.
Não ganhou o prémio e provavelmente já não vai a tempo de o ganhar nunca mais. A escorregadela de John Terry, em Moscovo, ter-lhe-á roubado essa possibilidade.
Mas também não interessa.
Drogba não vai escrever o nome na eternidade do futebol, mas já o deixou na eternidade do mundo.
Merecia a Bola de Ouro mais do que Ronaldo ou Messi? Não sei, leitor, não olhe para mim. Está bem, olhe. Mas não sei na mesma. John Terry escorregou no momento fundalmental, lembra-se?
Sei que Drogba já tem o prémio mais importante. E isso também merece ser discutido. Nesta ou noutra altura qualquer.
«Box-to-box» é um espaço de opinião da autoria de Sérgio Pereira, jornalista do Maisfutebol, que escreve aqui todas as semanas
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