Foram à guerra com os presidentes, e ganharam-na. Como ganhariam sempre. Parecendo que não, têm um argumento inultrapassável: sem eles não há futebol.
Muito rapidamente, porque é uma conversa que chateia, não queriam entregar aos dirigentes uma posição maioritária na decisão de questões estratégicas: direito de imagem, salários, definição dos calendários.
Enfim, questões que em Portugal, por exemplo, estão totalmente na mão dos dirigentes. Aliás, em Portugal está tudo nas mãos dos dirigentes.
O futebol, são eles. O inferno, são os outros. Eles decidem, impõem, castigam e ainda reclamam as vitórias.
Só ainda não descobriram uma forma de fazer o futebol sem futebolistas. Mas estão a trabalhar nisso. É uma questão de tempo, seguramente.
De quem é a culpa? É minha. Mas também é sua. Enfim, é nossa e não se fala mais nisso.
É minha porque eu, e o colega que está em frente, e o que está ao fundo da sala, e todos os outros jornalistas continuam a dar uma importância aos dirigentes que eles não têm.
É sua porque continua a aceitar esta ordem das coisas e até valoriza a importância que a imprensa dá aos dirigentes: uma boa guerra tem audiências difíceis de igualar. Compreendo-o, somos humanos e gostamos mesmo é de ver o circo a arder.
Mas a culpa é sobretudo dos jogadores. São eles, acima de todos, que aceitam que o futebol seja feito pelos dirigentes.
Sem querer ser mal-educado, vendem-se. Por um bom dinheiro aceitam que os dirigentes lhes exijam tudo. Não podem falar, não podem olhar, não podem espirrar.
A Convenção dos Direitos do Homem era um tratado bonito de referir nesta altura. Mas é melhor não. Estamos a falar de futebol profissional, como eles gostam de dizer. E esse é um argumento que deita por terra qualquer tratado.
O problema surge quando se vendem de graça. Esse, sim, devia ser um problema para os preocupar. Porque não é um problema meu, nem do leitor, nem dos dirigentes. É um problema deles.
Hoje acontece aos jogadores do E. Amadora, amanhã pode acontecer a qualquer outro jogador não ter dinheiro para pagar o infantário dos filhos.
Mas não, não há a coragem francesa para enfrentar os dirigentes. E até Joaquim Evangelista é visto como o mau da fita. Enquanto isso o problema dos salários em atraso continua a ser colocado ao nível da concorrência desleal. Ao nível que interessa aos dirigentes, claro. Como se não houvesse pessoas a passar viver no limite.
«Box-to-box» é um espaço de opinião da autoria de Sérgio Pereira, jornalista do Maisfutebol, que escreve aqui todas as segundas e quintas-feiras
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