Se há coisa que me irrita no futebol português, e longe de ser uma pessoa conformada ainda há muita coisa que me irrita no futebol português, são os assobios a Quaresma. Confesso que às vezes apetece-me saltar do lugar e sair pela bancada a esbofetear toda a gente. Detém-me o bom senso. Felizmente. O bom senso e o sentido de perigo.

Assobiar Quaresma é como que pedir por um futebol a preto e branco. Sem cor. Sem arte. Sem emoção. Sem margem de erro. Desumano, portanto. Um futebol quase robótico. Por isso, e enquanto não vir Fernando Aguiar fintar dois belgas e marcar de trivela ao ângulo, não me peçam para compreender os assobios.

Diz-se fintar dois belgas e marcar ao ângulo como pode dizer-se dar um nó em Nelson e rematar ao ângulo. Ou serpentear por entre a defesa da Naval e atirar outra vez ao ângulo. Ou pegar na bola à entrada da área do V. Guimarães e disparar mais uma vez ao ângulo. Ou largar uma bomba por cima da defesa do Sp. Braga (que raio!) ao ângulo.

Por isso, e na impossibilidade de sair a distribuir porrada, fico no meu lugar à espera da próxima trivela que reponha a justiça. Ou pelo menos o silêncio. O silêncio dos culpados. Acredito aliás que os assobios surgem de dois tipos de pessoas: os invejosos e os medíocres. Os invejosos por razões óbvias. Os medíocres porque são invejosos.

Até admito que Quaresma perde muitas bolas, que não é solidário e que defende pouco. Mas cria arte e é corajoso. Tão corajoso que nem parece português. Se calhar é por isso que o assobiamos. É que nós não somos descendentes dos marinheiros que deram novos mundos ao mundo. Somos descendentes dos que cá ficaram. Provavelmente a assobiar.

«Box-to-box» é um espaço de opinião da autoria de Sérgio Pereira, jornalista do Maisfutebol, que escreverá aqui todas as quintas-feiras