Neste domingo, segundo a BBC, um dos principais parceiros comerciais das competições internacionais de atletismo decidiu cancelar, quatro anos mais cedo, o contrato com a federação internacional (IAAF), devido à dimensão do escândalo do doping. Este foi também o dia em que voltou a haver suspeitas fortes de combinação de resultados num encontro de ténis do Open da Austrália, depois das investigações tornadas públicas na semana que passou.

A estas novidades podemos juntar o contexto conhecido da implosão do universo FIFA, com as atribuições dos últimos Mundiais como ponto de partida (o de 2006, na Alemanha, é o próximo na lista do FBI)- e do distanciamento embaraçado de alguns dos habituais patrocinadores de Campeonatos do Mundo. Mais os efeitos do caso Armstrong, que vão continuar a afetar o valor comercial do ciclismo durante muitos anos.

Por tudo isto poderemos ser levados a pensar que se vivem tempos tristes no desporto mundial. Mas permito-me discordar: todos estes processos, agora mais publicitados, já vêm de trás - muito de trás, em alguns casos. E aquilo a que estamos a assistir não é uma epidemia recente de malfeitorias, mas, pelo contrário, a crescente exposição pública de vários processos de limpezas e depurações.

Não sendo ingénuos, é fácil perceber que, em muitos casos, esses processos resultam de desforras, interesses em conflito e ajustes nos equilíbrios de poder, mais do que de altos desígnios morais ou de um inatacável sentido de justiça - afinal, a história é sempre escrita pelos vencedores. Mas, mesmo que sujeitos a falhas, manipulações e aproveitamentos de vária ordem, acredito que esses processos serão sempre preferíveis ao silêncio e ao encobrimento cúmplice. Por isso acho a notícia da BBC que abre este texto uma boa má notícia: perdoem-me o cinismo, mas não há a maneira mais eficaz de impor valores morais do que através do argumento económico - como toda a história dos direitos das minorias tem demonstrado.

E é este o ponto que me traz a Portugal e à nossa realidade quotidiana de acusaçõezinhas, insinuações e lamúrias repartidas que relegam sistematicamente para segundo plano o que se vai jogando nos relvados. Se - e quando - alguém estiver verdadeiramente interessado em fazer dos corredores da Liga portuguesa num universo mais frequentável tem de começar por aí: por um código de conduta em que as normas quebradas e os princípios violados tenham ligação direta e profunda ao bolso de quem abusa. Não tenho ilusões e não espero, como é óbvio, que essa decisão parta dos dirigentes. Mas acredito, sim, que mais tarde ou mais cedo ela chegará, decidida por quem realmente manda: os patrocinadores.