Mesmo que não tenha sido a razão principal, o risco de Talisca falhar o dérbi com o Sporting por castigo terá tido algum peso na decisão de o deixar no banco frente ao Boavista. Não quer isto dizer, porém, que a justificação dada por Jorge Jesus para a aposta em Pizzi não seja credível. Pelo contrário.
 

«O Boavista tem uma forma de defender muito no contato, muito física, no duelo de um contra um, e o Pizzi tem umas características que não permite, a quem o quiser marcar, jogar no um para um. Ele é um jogador de toque, de tique-taque», disse o técnico encarnado.

 
As palavras de Jesus indicam, no fundo, que Pizzi encaixa melhor naquele que tem sido o grande trunfo tático do Benfica: a qualidade do jogo interior. Numa Liga em que a maior parte das equipas mostra total incapacidade para incomodar ofensivamente os «grandes», numa Liga de caudal único, a equipa de Jorge Jesus tem sido a mais eficiente.
 
Já com processos bem rotinados, o Benfica marca a diferença pela forma como promove infiltrações nos muros que se erguem à sua frente. E a diferença começa a vincar-se logo no início da fase de construção, com uma saída de três elementos (os dois centrais e o médio mais recuado). Os laterais adiantam-se bastante no terreno, desde logo, e os extremos procuram espaços interiores, sendo que os dois avançados também procuram sempre dar linhas de passe.
 
Quer isto dizer que os três elementos que dão início aos ataques (Luisão, Jardel e Samaris, recordando o jogo com o Boavista), têm sempre quatro ou cinco jogadores a procurar a bola na zona central (Salvio, Ola John, Lima, Jonas e eventualmente Pizzi, se não recuar no terreno para dar mais qualidade ao passe vertical). No lado direito por vezes é Maxi que aparece por dentro e Salvio encostado à linha, onde se sente mais confortável, mas o princípio é sempre o mesmo. Ainda que sair pelas alas seja sempre uma alternativa, é quando entra um passe pelo meio que o Benfica desequilibra o adversário, pois fura as linhas defensivas contrárias, obriga quem está do outro lado a reposicionar-se.
 
Se os laterais contrários acompanham os movimentos interiores dos extremos, então deixam o buraco na ala. Se um dos centrais sobe ligeiramente para acompanhar o movimento do avançado que recua para receber a bola, então abre um espaço na retaguarda. São desequilíbrios para tentar explorar, e os desequilíbrios tendem a gerar um «efeito dominó».
 
Esta tem sido a marca diferenciadora do Benfica. Principalmente em relação ao Sporting, que muitas vezes tem sentido dificuldades para superar os muros que encontra. Daí que os «leões» tenham mais pontos perdidos em casa do que fora (oito e sete, respetivamente).
 
No jogo exterior o Sporting é mais forte do que o Benfica, mas depois sente imensas dificuldades para fazer entrar passes verticais pelo centro. Nani e Carrillo raramente recebem a bola em zonas interiores, de costas para a baliza, e até João Mário vê-se obrigado a cair nas alas ou a recuar no terreno para ter a bola. Apenas William Carvalho vai procurando «queimar» linhas com passes pelo meio, mas as limitações da equipa neste aspeto são notórias. Tanto ao nível do início da construção do ataque, como também nas linhas de passe que surgem.
 
E se o Sporting não consegue «infiltrar-se» no muro, então o adversário fica mais cómodo, pois só precisa ir rodando o seu bloco, enquanto a equipa de Marco Silva vai mudando de um flanco para o outro através dos apoios que estão fora do muro (William e Adrien, ou até os centrais).
 
Esta realidade ajuda a explica os sete pontos de diferença entre as duas equipas, mas na antecâmara do duelo entre ambas, referente à 20ª jornada, importa lembrar que esse jogo terá, presumivelmente, características bem diferentes. Um dérbi não merece muros, pelo menos destes aqui mencionados, ainda que as infiltrações sejam para ter em conta.

«4x4x3» é um espaço de análise técnico-tática do jornalista Nuno Travassos. Siga-o no Twitter.