Quando vos perguntam um palpite, uma opinião, um prognóstico, o que fazem? Confiam no instinto ou fazem contas à lógica?

Se fosse o outro, o pioneiro das bandeirinhas nas janelas, e também da fé omnipresente na Sua Senhora do Caravaggio - até quando estava a defender o minino -, era acreditar e pronto. Rezar, e acreditar. Muita fé! E como ele gostava de gritar, como um jab de direita para manter o adversário à distância: era ele que era o burro?

Já o senhor Tranquilidade, apesar de um ou outro excesso em momentos de pressão, enche de equações de trabalho uma folha A4. E enche-a sem a mínima dúvida de que uma soma de 11 dá vitória em praticamente todos os cenários. Suor, rigor e, mais cedo ou mais tarde, triunfos. Os possíveis, pelo menos, já que o impossível não se explica de forma matemática. Quando isso acontece deixa de sê-lo. Impossível, digo.
 
A Selecção andou desde então, nas fases finais das grandes competições, naquele estado de break-even moral, em equilíbrio entre os gastos e os lucros no final de um jogo.

A verdade é que a minha Selecção não ganhou à Alemanha. Não chegou perto. Pior, nem sequer entrou em campo. O joelho do Ronaldo manteve-se envergonhado, e a tendinose-que-não-tendinite vai continuar a ser notícia, com a ligadura a continuar lá como aqueles panos que deixamos nas pernas das mesas para não esquecermos de algo importante. 

Eu não me posso esquecer que tenho de me lembrar

Aquele arranque, aquelas bicicletas para disfarçar a falta de potência, a aparecerem cada vez mais com o peso do tempo! Aquele segundo livre na segunda parte, a sair rasteiro quando todos esperavam o tomahawk! Aquela prisão ao seu próprio corpo, que não ajudou em nada!

Depois, os outros. Não me lixem, este Pepe é o mesmo que acertou em Casquero. Um Pepe que reage mal a quem não aguenta no corpo-a-corpo, com ou sem falta, e se estatela com estrondo. O tal Pepe que se deixa cair em vertigens quando as exigências disparam, num abismo incontrolável. Que atitude ridícula, de jogador fragilizado a sentir o mundo a arder à sua volta, a deixar-se atear, quando podia ser o bombeiro a fintar as chamas para salvar os companheiros.

Houve um pouco de Nani, um pouco de Éder, mas Veloso, Meireles e Moutinho, sobretudo eles, também não foram porto de abrigo, e o do Mónaco ainda mais que o companheiro de sector. Duas bolas perdidas, outros tantos golos sofridos. Bruno Alves foi «pai» de dois gritos grotescos de  Tor! Patrício fica várias vezes mal na fotografia, e o seu passe sai desvalorizado. João Pereira fez quase tudo mal, pisando em cima daquele frenesim que o embala, mas que nem sempre é o mais apropriado perante uma arrogância certa de que se é melhor.

Eles, os maus, chegaram mais rápido, mais cedo, mas fortes. Colocaram-nos bolas nas costas, cresceram sobre nós. A Mannschaft tornou-se rolo compressor, objectivo, esmagador, sobre o nosso meio-campo. Cheguei a temer mais um ou mais dois. 5-0, 6-0 e nem seria injusto.

Mas, se vos perguntassem um palpite, patriotismos à parte, não acreditariam em algo mais? Apesar das dificuldades na qualificação, dos amigáveis cinzentos - tirando a Irlanda amiga -, o passado recente, o equilíbrio em fases finais e, sim, o jogo da Suécia... Não seriam razão para mais esperança?

Mas esqueçam. Não vale a pena. A minha Selecção ainda não entrou neste Mundial. Era isso que eu tinha para vos dizer e não me podia esquecer. Já me lembro, já podes tirar a ligadura do joelho, Cristiano!

--
«Era capaz de viver na Bombonera»   é um espaço de opinião/crónica de Luís Mateus, sub-director do Maisfutebol, e é publicado de quinze em quinze dias. Pode segui-lo no  FACEBOOK  e no  TWITTER . O autor usa a grafia pré-acordo ortográfico.
--