Há dias em que tenho saudades de Luís Campos.
 
Eu sei que o mais normal nestas alturas seria ir dar um passeio até isto passar, mas eu gosto de meditar nestas coisas. Sou assim, o que querem?
 
Há uma série de treinadores que praticamente desapareceram do mapa nos últimos tempos. Deixaram de trabalhar, aventuraram-se por outras paragens, caíram no esquecimento.
 
Os Josés, Romão, Rachão ou Alberto Costa. Os Vítores, Manuel, Pontes ou Urbano, o mais citadino deles todos. Os que até ganharam Taças, como Mário Reis ou António Sousa. Os que treinaram grandes, como Quinito ou Manuel Fernandes.
 
E depois há Luís Campos. Ele que personifica a velha máxima do «há tardes em que um tipo de manhã não deve sair de casa à noite». Para Luís Campos foram todas as manhãs, tardes e noites da época 2002/03.
 
Começou no V. Setúbal, parecia ter montado uma equipa interessante, mas os resultados não surgiram. Caiu. Foi para o Varzim, apanhou a equipa em décimo mas não a aguentou. Acabaram, ambas, por descer de Divisão.
 
Nasceu o mito do «Luís Campas».
 
Dois anos mais tarde, o trabalho num Beira-Mar com sotaque inglês, levou-o a nova desgraça quadripartida (com Mick Wadsworth, Manuel Cajuda e Augusto Inácio). Nunca mais treinou em Portugal.
 
Para trás ficaram os bons anos na II Liga. O resgate do Gil Vicente em 2000/01, que merece uma pausa.
 
[Era o pior arranque de sempre da equipa de Barcelos (superado pelo atual): a primeira vitória chegou ao 12º jogo. O V. Guimarães ficou, então, convencido da qualidade de Álvaro Magalhães e pescou-o. O Gil foi entregue a Luís Campos. E ele evitou a descida. In your face!]
 
Em 2004 foi ele a interromper o ciclo de jogos sem perder na Liga do FC Porto de Mourinho, numa altura em que já parecia possível um título sem derrotas. Ficou tão contente que ligou à mulher para «jogar no totoloto». Não terá sido a mais certeira das tiradas, admito.
 
Mas Luís Campos era um treinador com alguma piada. Direto. Uma vez, após uma derrota do Varzim, atirou: «A minha equipa foi burra e vaidosa». Os jogadores não gostaram, claro. Noutra altura, queixou-se tanto do árbitro, depois de um jogo com o Sp. Braga, que achou melhor…calar-se. «Bem, tenho é de pensar que tenho de pagar o IRS».
 
Luís Campos, enfim, um homem que partilhava problemas, até porque os tinha para dar e vender.
 
Depois das descidas, desceu também ele ao abismo. Especializou-se nos treinos, lançou um dvd, tornou-se amigo de José Mourinho, íntimo de Jorge Mendes, chegou ao Real Madrid.
 
Agora está no Mónaco, como diretor técnico. O mesmo Mónaco que acaba de ganhar o seu grupo da Liga dos Campeões. Coincidência? Ninguém vai associar o sucesso a Luís Campos, mas para isso estou cá eu.
 
Quando lembrarem que Luís Campos desceu duas equipas no mesmo ano, vou sublinhar mais esta conquista. Se não gostarem, problema vosso. Eu tenho é de pensar que tenho de pagar o IRS. 

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