O Sporting tem feito uma época desportiva extraordinária.

No arranque de 13/14, a questão que se punha quando se falava no clube de Alvalade era se, desta vez, a Europa seria um objetivo claramente atingido, depois da ausência decorrente um campeonato falhado, na temporada passada.

Eventualmente, a luta pelo terceiro lugar estava ao alcance, tudo dependendo dos desempenhos de Sp. Braga e mesmo outros «outsiders», como V. Guimarães ou Nacional.

A presidência de Bruno de Carvalho, então ainda a dar os primeiros passos, colocava o enfoque na necessidade de cortar despesas, numa busca quase desesperada de sustentabilidade financeira.

A luta pelo título não podia ser prioridade. A nação leonina compreendia e apoiava o novo líder.

Jesualdo Ferreira, que tinha sido escolha de Godinho Lopes (primeiro para coordenador técnico, logo a seguir para técnico principal, com a queda do belga Vercauteren), falhara a Europa por pouco e havia quem, internamente, defendesse a continuidade do professor.

Leonardo Jardim, aposta ganha


Numa escolha na altura um pouco arriscada, Bruno de Carvalho apostou em Leonardo Jardim, técnico de créditos firmados (bom trabalho em todos os sítios onde passou), que saíra de forma surpreendente do Olympiakos (quando liderava a liga grega) e se estreava ao comando de um dos três «grandes».

Rapidamente, as dúvidas sobre a boa escolha para suceder a Jesualdo se dissiparam: o Sporting começou em grande, com goleadas, a jogar bem e a destacar-se, durante largas jornadas, como melhor ataque da Liga.

Com um discurso geralmente sereno e opções táticas quase sempre acertadas, Leonardo Jardim vai reforçando a ideia de ser um treinador sólido, competente. Apto a voos ainda mais altos, numa carreira já afirmada, apesar de ter apenas 39 anos.

A lutar pelo título


Não só a luta pelo terceiro lugar parecia segura, como o Sporting começava mesmo a acreditar (mesmo que não o confessasse...) em bater-se taco a taco com Benfica e FC Porto pelo título.

A derrota na Luz retirou algum fôlego de conquista pelo primeiro lugar (sete pontos a recuperar em 21 aberto, perante um Benfica muito regular, não é tarefa fácil), mas as constantes escorregadelas dos azuis-e-brancos colocam o Sporting com fortíssimas hipóteses de terminar o campeonato, pelo menos, em segundo.

O triunfo (justo, apesar do fora-de-jogo de André Martins no lance do golo de Slimani) no recente clássico com o FC Porto, confirmou o Sporting como cada vez mais provável segundo classificado desta liga 13/14.

A juntar a um comportamento desportivo muito superior ao que se esperava no início da época, este Sporting de Leonardo Jardim (e Bruno de Carvalho) continua a assumir forte aposta nos jovens valores portugueses, fazendo bom uso do trabalho da sua academia.

A revelação William Carvalho

Numa prova das apostas ganhas nos jovens valores,
William Carvalho é, claramente, a grande revelação deste campeonato e passou, em poucos meses, de mero desconhecido do grande público a melhor médio-defensivo português, alargando assim a influência do Sporting na Seleção principal. 
  
Bons atos de gestão

No plano da gestão, Bruno de Carvalho, em poucos meses, conseguiu reduzir custos, tomou boas decisões na necessidade de reduzir drasticamente a massa salarial do plantel (Onyewu, Bojinov, Labyad, Pranjic...)

A SAD do Sporting passou de prejuízo a lucro em poucos meses (após um prejuízo de 25,670 milhões de euros entre 1 de Julho e 31 de Dezembro de 2012, um lucro de 3,724 milhões de euros no mesmo período de 2013).

Dito tudo isto... tudo faria indicar que, nesta época, o Sporting merecesse apenas elogios.

Infelizmente, não é esse o caso.

Desastre comunicacional

Falemos claro: a gestão das intervenções públicas de Bruno de Carvalho tem sido um autêntico desastre.

Em vez de reforçar os méritos que acima identifiquei (e são muitos, em tão curto espaço de tempo), o presidente do Sporting tem preferido enveredar por um estilo de vitimização: contra o «sistema»; contra «os comentadores»; contra «as arbitragens».

Maus hábitos, que parecem querer repetir-se, por muito que mudem os protagonistas do futebol português.

Essa história de querer determinar uma «classificação da verdade», à luz de contas feitas de forma subjetiva, não é original. Mas não é pela repetição que deixa de ser dos exercícios mais ridículos que se poderão fazer.

Como é óbvio, os outros clubes apresentariam outras contas. Numa competição profissional, as regras têm que ser claras. Os resultados assumidos e aceites por todos (mesmo quando alguns se sentem prejudicados nalguns jogos). 

Um precedente de «recorrer para os tribunais» por não se ter obtido a classificação europeia teria consequências graves para o Sporting (lembrem-se do caso Mateus que, por algo bem mais discutível, custou a descida ao Gil Vicente).

Os tiros errados de Bruno de Carvalho neste aspeto já tinham sido denunciados no caso da Taça da Liga, com a «exigência» de estar nas meias-finais, apesar do FC Porto ter conseguido o acesso dentro do campo e com a questão ainda a ser avaliada pela justiça desportiva.

Depois, os «timings»: aquele comunicado surreal, na passada sexta-feira, ameaçando «proceder litigiosamente contra os responsáveis das arbitragens que prejudicaram o Sporting» foi feito... no dia seguinte a uma fantástica vitória do Benfica no reduto do Tottenham (1-3). Nesse comunicado, o Sporting reclama que devia ter mais sete pontos, deixando assim a entender que só não está à frente da Liga por culpa dos árbitros.

Feitos todos os elogios ao bom desempenho deste Sporting, façamos a avaliação: o conjunto de Leonardo Jardim merecia estar à frente do Benfica? A resposta é claramente: não. E isso tem alguma coisa a ver com arbitragens? De novo: não.

O Benfica está em primeiro porque tem sido a melhor equipa do campeonato, a mais forte das equipas portugueses neste momento.

De novo o timing errado: Bruno de Carvalho dá conferência (sem direito a perguntas), segunda às 18h, dia seguinte ao clássico. Para admitir que o golo do triunfo sobre o FC Porto pode ter sido iniciado com lance em fora-de-jogo, ok, mas para insistir na ideia de que uma «classificação real» teria Sporting à frente de Benfica e muito à frente de FC Porto. Horas depois, o Benfica vence claramente na Madeira, 2-4, e fica com sete pontos de vantagem, com apenas 21 em aberto.

O presidente do Sporting termina essa conferência (monólogo) com uma referência (pertinente) ao facto de terem estado «dez jogadores da formação no clássico com o FC Porto». Bem visto. 

Uma pena. Mais, uma vez, uma pena, um desperdício: em vez de essa ter sido a ideia forte da intervenção do presidente do Sporting (que tem razões para ter orgulho de ver dez produtos da formação do clube em jogo tão importante), Bruno de Carvalho continua a dominar o seu discurso com uma questão que devia ser lateral ao espetáculo.

Os dez jogadores da formação deviam ter sido o tema da conferência e não uma referência no final de uma intervenção baseada em críticas, queixas e aspetos negativos.

Estaremos condenados a ter um futebol de dirigentes com prioridades erradas?


«Nem de propósito» é uma rubrica de opinião e análise da autoria do jornalista Germano Almeida. Sobre futebol (português e internacional) e às vezes sobre outros temas. Hoje em dia, tudo tem a ver com tudo, não é o que dizem?