Tirambaço: substantivo masculino; Chute violento em direção ao gol. 

Todos o dizem. O Atlético é um clube especial. Mas todos os clubes o são aos olhos dos próprios adeptos. Por isso, especiais são os clubes que tocam os adeptos dos outros.

O Borussia Dortmund poderá ser o melhor exemplo de todos. O Westfallenstadion foi uma experiência vivida por portistas, sportinguistas e benfiquistas nos últimos anos. E com todos aqueles que falei destas três cores que lá foram, ninguém hesitou por um momento em falar da diferença que existe ali para outras bancadas da Europa.

O Atlético, dizia, é um clube especial. Desde logo porque fica em Madrid. Não podia ter escolhido pior sítio para ser.

Há um colosso que habita a cidade. É mais rico, mais famoso, mais mediático, mais vencedor. Melhor dizendo, é o mais rico, o mais famoso, o mais mediático, o mais vencedor dos clubes do mundo.

Azar dos azares, é com esta condição que tem de viver o Atlético: ser vizinho do Real Madrid. Coisa que nenhum outro clube que luta na Europa tem de ser.

O que é que isso quer dizer? Quer dizer muito. Basta pensar numa lógica de mercado local para se chegar a essa conclusão.

Por isso, o Atlético para ser grande como é teve de ser diferente. Se o Madrid era uma epopeia, o Atleti tinha de ser lírico. Se um é Champions, o outro é Liga Europa. Se um dizia señorio, o outro afirmava paixão.

E enquanto no Bernabéu o público observa e julga, no Calderón ele rende-se aos jogadores. Depois, chora ou ri com eles no fim.

Simeone resumiu a coisa.

«As outras equipas podem ter mais dinheiro. Podem ter mais algumas taças do que nós. Mas nunca hão de ter o sentimento que vocês têm por este clube!»

O Vicente Calderón vem abaixo. Desta vez, literalmente.

E esse sentimento arrebatador de ser Atleti vai mudar de sítio. Na ribeira de Manzanares ficarão a ecoar para a eternidade os últimos golos de rojo y blanco do português Mendonça, os gritos de motivação de Luis Aragonés ou as lágrimas de despedida de Tiago.

E depois, ficará por lá Futre.

«El Português» foi um dos maiores exemplos do que é o At. Madrid. Tudo em Futre é Atlético. Mesmo aquela jogada em Viena, pelo FC Porto, já era Atlético. Apaixonar a bola num lance e depois traí-la com um remate ao lado.

Futre adorou jogar no Vicente Caldéron e D. Vicente, como lhe chamou a belíssima campanha do Líbero, adorou Futre.

Mesmo quando El Português, atleticano traído pelo futebol com uma lesão enorme em Itália, já só podia jogar pela emoção de vestir-se colchonero.

Sei que Cristiano Ronaldo merecerá mais do que ninguém ter Chamartín inteiro a gritar-lhe o nome. O que já não sei é se o Bernabéu consegue devolver em sentimento, o que Ronaldo lhes deu em golos.

Já D. Vicente nunca se esqueceu de todas as vezes que agarrou as mãos às cadeiras para ver Paulo Futre. Mesmo quando ele voltou em pré-reforma e falhou nas raras ocasiões em que vestiu a camisola em 1997/98, o Calderón nunca o assobiou.

Porque o Calderón, como o Atlético, era uma coisa diferente de todas as outras. Em Madrid, em Espanha, na Europa até. Vai abaixo, mas por lá fica para sempre o eco de «Paulo, Paulo Futre!». Um tipo especial e diferente de todos os outros que havia na altura.

O Tirambaço é um espaço de opinião do jornalista Luís Pedro Ferreira. Pode segui-lo no Twitter.