«Todos os jogadores sabem a exigência dos nossos adeptos e os adeptos também sabem que há jogadores que são novos no clube, que não sabiam o que era jogar com esta camisola, esta pressão e esta exigência. Quero já elogiar os que chegaram e que se têm tentado integrar, mesmo que não estejamos a ter muito tempo para isso. Isso é um dado que os nossos adeptos têm de perceber. Não para deixarem de ser exigentes, mas para serem tolerantes. É preciso tempo. Quero que eles continuem com a mesma exigência mas peço-lhes que sejam tolerantes com casos, que são muitos, de ainda não identificação com o FC Porto. Não porque não queiram, mas porque não tiveram tempo para tal.»

A pergunta do Maisfutebol incidiu sobre a importância do golo marcado por Marega frente ao Gil Vicente. José Peseiro não limitou a conversa ao internacional maliano mas a reflexão faz sentido.

Vi no Estádio do Dragão dezenas de sorrisos complacentes, quase misericordiosos, e ouvi assobios a cada tomada de decisão do antigo jogador do Marítimo. Marega não acertava uma. Quanto mais duas ou três. No fim do encontro, mais um em que demonstrou carências graves no trato da bola, ouvi até que seria o pior jogador da história do FC Porto.

Em cenários como este o mais fácil é fazer um diagnóstico precoce e atirar o maliano para o balde do lixo. Não serve, venha outro. Aliás, parece nesta altura tão óbvio que todos gritam a uma só voz: eu sempre disse, é um cepo. Assim mesmo, com todas as letras.

Pois bem, vou contra a corrente e confesso: sou apreciador das qualidades de Moussa Marega. Nem faria sentido mudar de opinião em oito jogos com a camisola de um grande, embora seja um risco assumi-lo. Coloco-me a jeito para o olhar desconfiado.

Nada de novo, aliás. Tenho sido alvo, no último mês, de observações jocosas por parte de quem anteviu à partida um cenário a médio prazo: o avançado não fará parte do plantel do FC Porto em 2016/17. É possível, sim. Mas quem tem lugar garantido no próximo esboço dos dragões? Muitos, poucos, nenhum?

Voltando a Marega. Nunca achei que fosse apenas jogador para uma equipa como o Marítimo. Percebia o seu potencial para crescer num grande, fosse no FC Porto, no Sporting ou no Benfica. Continuo a defender essa posição, embora sem a confiança inabalável.

O futebol não se faz apenas de galãs que namoram a bola. Que a tratam como se fosse o bem mais precioso do mundo e não a largam por um minuto. Esses são os adeptos do jogo repleto de curvas. De rotundas até. São os Brahimis e Coronas desta vida.

Por vezes, no entanto, o caminho mais lógico para a baliza contrária é uma linha reta.

Jogadores como Marega não inventam espaços por entre o trânsito como os concorrentes diretos nos flancos portistas. Ignoram por completo o obstáculo e avançam. Chegam primeiro, passam por cima, empurram para um canto. São os pesos-pesados do futebol. Os vilões. Os brutos. Impressionam pela dimensão física. E a bola, contrariada, acaba por lhes obedecer.

Na quarta-feira, vi Moussa Marega falhar dezenas de coisas simples, qual jogador amador, mas não esqueço aquele pique ao minuto 80, desde a linha de meio-campo até à área contrária, como se fosse o primeiro lance do encontro. Sem forçar, mostrando-se preparado para jogar mais duas horas se fosse necessário. É esse o seu potencial.

«Ele pode não ter tido a formação necessária, veio de clubes mais pequenos em França e chegou como um diamante por lapidar. Teve e tem de evoluir em vários capítulos, inclusive a formação humana», avisou Ivo Vieira, seu antigo treinador do Marítimo.

Marega tem 24 anos e ainda pode ser muito útil no FC Porto. Como seria no Sporting ou no Benfica. Duvidava apenas da sua humildade, face a vários episódios no clube insular, mas não da capacidade para se assumir como alternativa ao futebol rendilhado de Brahimi e Jesus Corona, que continua a oscilar. Sem esquecer Varela, naturalmente.

No onze ou a partir do banco, o maliano é garantia de vigor físico e capacidade de explosão. Pode vergar-se ao peso de uma camisola como a do FC Porto, porque nem todos os jogadores se adaptam a um cenário de máxima exigência, mas não creio que fique na história como um dos piores a vestir de azul e branco. O tempo dirá. Por agora, fico ao lado da minoria que augura um futuro a nível alto.

Entre Linhas é um espaço de opinião com origem em declarações de treinadores, jogadores e restantes agentes desportivos. Autoria de Vítor Hugo Alvarenga, jornalista do Maisfutebol (valvarenga@mediacapital.pt)