«Foi um clássico com uma equipa a defender a outra a tentar atacar. Eles achavam que o empate servia e jogaram em função disso. Vamos ver se lhes serve ou não, mas tivemos ocasiões para nos adiantarmos, algumas delas bastante claras.»

Julen Lopetegui analisou o clássico do Estádio da Luz com uma lógica particular, prolongando uma questionável necessidade de corrigir um erro lexical de Jorge Jesus após um nulo que pode ter comprometido definitivamente as aspirações do FC Porto.

Será assim tão importante discutir a postura do adversário? Sobretudo após um jogo em Munique onde Lopetegui adotou uma estratégia similar, acreditando em quatro centrais para conservar a vantagem do Dragão?

Deveremos passar estes dias a analisar a fúria desorientada do treinador espanhol, ou um simbólico abraço de Ricardo Quaresma a Jesus?

Por mais que um nulo seja enfadonho, que surja como o anticlímax de um cartaz a anunciar luta pelo título, é redutor limitar a discussão a flashes e palavras soltas.

Do lado portista, onde agora se espera que Gil Vicente e V. Guimarães façam o que não foi possível fazer na Luz, fica a curiosa memória no minuto 92. Kelvin estava do outro lado do Atlântico a ver os jogadores do FC Porto a trocar a bola no meio-campo defensivo, sem soluções até ao apito final de Jorge Sousa.

Terão os jogadores azuis e brancos assimilado a real condição em que se encontravam? E o seu treinador? O cenário pode mudar, naturalmente, mas está dependente de hipóteses reduzidas nos pés de terceiros.



Clarividência e ambição controlada. Foram estas as chaves de um Benfica que caminha a passos largos, atento a pedras no trajeto, para o bicampeonato.

Mérito tremendo de um Jorge Jesus que evoluiu na conceção de jogo e procurou baixar o ritmo desenfreado, por vezes perigoso, do futebol encarnado. Os números são claros. Este é o melhor registo defensivo dos encarnados sob o comando técnico de Jesus

O que fez a estrutura benfiquista ao longo de janelas de transferências conturbadas, incertas como nunca? Abriu mão de ativos por absoluta necessidade e apoiou-se claramente em jogadores com experiência (Júlio César, Eliseu, Jonas, por exemplo) para não perder maturidade.

Essa aposta vincada no sucesso desportivo a curto prazo traduziu-se num Benfica seguro, capaz de disfarçar as suas limitações em jogos longe do Estádio da Luz. Isso ficou claro nas reviravoltas fora de casa, onde a equipa raramente perdeu a tranquilidade.

Contrastando com um desempenho europeu sofrível, os encarnados raramente falharam na Liga e – prova da evolução de Jorge Jesus – terminarão a época sem derrotas nos clássicos, algo que não acontecia desde 1993/94.



Acredito que tal se deve a uma dose tremenda de experiência acumulada. Em jeito de comparação, fica este número: no clássico, o Benfica apresentou um onze com idade média de 29 anos. A equipa titular do FC Porto, por outro lado, tinha uma média de 25,27.

São praticamente quatro anos a separar Benfica e FC Porto, para além de, dado essencial, os cinco que separam as entradas nos clubes de um treinador – Jorge Jesus na Luz desde 2009 – e de outro – Julen Lopetegui no Dragão desde 2014.

Duas estratégias diferentes para lutar por objetivos similares. Ou será que não?

Para um clube português, continuará a valer mais um campeonato nacional que um apuramento para as fases adiantadas da Liga dos Campeões? O sucesso desportivo a nível interno ou a tendência para valorização de ativos e projeção internacional?

A esse propósito, uma reflexão interessante de Sérgio Pereira, que poderá ter eco em alguns dirigentes dos grandes. Naturalmente, as prioridades deviam ser assumidas em público. Antecipadamente.

As opiniões dividem-se mas a conclusão parece-me lógica: Jorge Jesus tem crédito acumulado para se manter no clube encarnado em condições vantajosas e o FC Porto deverá manter a confiança em Lopetegui para promover a estabilidade no Dragão. No próximo ano, a equipa portista será mais madura. E o seu treinador também.