Por muito tristes que fiquem os fiéis adeptos do Benfica - mais alguns que agora se tornaram assumidamente inimigos do antigo treinador, sem falar em elementos preponderantes do presente do clube (há muitas e boas exceções, caso evidente do líder) que muito têm feito para manter em lume brando umas vezes, sob altas labaredas outras, a confrontação ideológica e dialética com aquele que conquistou no clube os últimos dez títulos, a insofismável verdade é esta: se se estava à espera do grande teste à classe de Jorge Jesus, o treinador triunfou em toda a linha como somatório da indiscutível vitória sportinguista no mítico recinto encarnado.

O triunfo do Sporting, sem mácula, foi expresso no marcador por números consideráveis e resultado de uma atuação em que a sua capacidade tática, individual e coletiva, foi muitíssimo superior à do antagonista. Não sendo novidade, algo assim tardava há bastante tempo porque o Benfica ao longo da história tem sido melhor. Foi também uma pequena vitória do seu presidente, porque depois de tudo o que se tem passado nos tempos recentes foi ao jogo, deu a cara pelo clube, esteve ao lado da equipa, dividiu com Jorge Jesus apupos e ofensas e no final dos 3-0, com leões a dominarem em terrenos da águia, recebeu os louros da sua liderança. Porém, e Bruno de Carvalho sabe, e sabia-o perfeitamente, o grande vencedor dessa jornada memorável para o Sporting teve um rosto a dominar: Jorge Jesus.

Os benfiquistas reconhecidos, como Jesus muito bem referiu, só podem estar contra o treinador nos minutos em que as águias encontram os leões, como rivais e adversários. Porque, passada essa adrenalina é impossível esquecerem o seu trabalho em seis anos. Sim, podia ter mais uns títulos, mas aquilo que conseguiu foi notável, se levarmos em linha de conta o domínio do FC Porto e nos lembrarmos que nas provas europeias, embora na Champions o balanço seja pequenino, chegar duas vezes à final da Liga Europa não é coisa comum a um País como Portugal.

Nesse sentido, e agora que volta à baila o tema, ficou provado pela segunda vez que na estrutura que o Benfica tanto realça e faz ponto de honra continua a faltar a peça fundamental: Jorge Jesus. Falta ele e os escudeiros que decidiram segui-lo para Alvalade/Alcochete. Quaresma, Raul e Monteiro, vá lá Mota, são o sustentáculo de uma ideia ganhadora titulada pelo líder. Não quero com isto afirmar que quem ficou na Luz/Seixal não tem valor e capacidade, nada disso. Tem-na, mas até prova em contrário falta-lhes quem os guiava, JJ.

Esse é um dos grandes problemas do presente encarnado: não estando causa as capacidades de Rui Vitória, pelos resultados conseguidos, e não apenas frente ao Sporting, o Benfica vai demorar algum tempo, parece-me, a construir uma estrutura ganhadora como a anterior (já que manter a anterior parece-me fora de causa). Se se quiser, como o Benfica pretende passar: a estrutura está lá, mas falta-lhe o fundamental, Jorge Jesus e seus pares.

Junto com a estrutura «made in JJ» segue-se o seu ADN de treinador nas mais variadas vertentes, sobressaindo duas: a marcadamente tática, a sua principal imagem de marca enquanto líder de equipas de futebol; a de profissional de futebol, consciente e agradecido. Sobre a primeira realidade reparos simples: manteve-se fiel à sua ideia dominante, embora tenha feito passar para o exterior, para confundir, que o Sporting poderia só jogar com um avançado. A capacidade de pressão dos jogadores leoninos sobre o adversário portador da bola foi notável durante os 90 minutos. Há hoje jogadores no Sporting capazes de fazer com qualidade máxima várias posições – João Mário é um de muitos exemplos. Mas aquilo que Jorge Jesus faz hoje no Sporting fê-lo durante seis anos no Benfica. E quando se pergunta hoje porque desapareceu Pizzi, a única resposta que encontro é esta: já não tem Jorge Jesus como treinador.

A outra vertente que devo referenciar diz respeito ao modo elevado como o treinador passou por uma sala de imprensa que foi sua e encheu dezenas de vezes. Tirando os remoques a Rui Vitória, mas desta vez quem se pôs a jeito foi o técnico benfiquista, JJ mostrou-se respeitoso e agradecido ao Benfica nas palavras usadas durante os minutos em que foi interpelado. E essa é uma realidade que os benfiquistas não podem esquecer: o treinador jamais esquecerá os anos que passou na Luz e aquilo que o Benfica fez pela sua carreira. Provou-o de forma eloquente. O problema é que depois deste resultado, para o bem e para o mal, mesmo que não queira, a nação rubra vai ter mais dificuldades em esquecer o técnico…

A finalizar, o tão famoso software, um dos motivos que faz parte do processo movido pelo Benfica ao técnico. JJ brincou com isso apontando para a sua cabeça, mas quanto a isso estou convencido que no clube que se seguir ao Sporting fará melhorias nesse componente. Críticas à parte ao modelo rival, que em boa verdade já tem algumas pequenas nuances quando comparado com o passado, o que domina é o cérebro. E no de JJ continua a haver espaço para a inovação. E por muito semelhantes que sejam as situações… cada cabeça, cada sentença. Sem especulações, até porque os resultados nos ajudam a compreender muita coisa: Jorge Jesus provou, mais uma vez, que é o técnico do momento. Por muito que custe a alguns a crueza da opinião. Assim sendo, para que não restem muitas dúvidas, acho que Jorge Jesus vai muito a tempo de registar várias patentes. Eventualmente ganharia muito mais milhões do que aqueles que se garante conseguir em Alvalade.

PS: com a turbulência que se vive em torno da eleição na FIFA espanto-me por não ver Luís Figo na corrida eleitoral, depois de ter andado recentemente a treinar para o cargo. Ou então confirma-se aquilo que ouço dizer há muito: que pode ser o futuro número um na FPF.