«Essa não é uma pergunta nova para mim. Já fiz a mim próprio. Se podia meter o Bruno Alves a ponta de lança em caso de necessidade, ou algo assim. Eu tenho de definir o que preciso do avançado. Se levo um jogador que pode ser importante em alguns momentos, como no jogo com a Bulgária, em que preciso de colocar alguém na área, ou se não vale a pena levar um jogador deste tipo. Tenho feito esta pergunta a mim próprio várias vezes e até maio vou decidir como resolver esta questão.»

Levei as mãos à cabeça quando ouvi Fernando Santos a falar em Bruno Alves como ponta de lança. Fez-me recuar vinte anos, até 1995/16, quando João Manuel Pinto era a solução desesperada do FC Porto para chegar ao golo em contrarrelógio.

Garantem-me que o Selecionador Nacional carregou a expressão com alguma ironia. Fica o benefício da dúvida. A questão de fundo é mais vasta e não se esgota na existência ou não de um homem fixo na área contrária.

Já que o exercício me levou a recuar vinte anos, fiquemos por lá e pelo Campeonato da Europa de 1996.

Se Fernando Santos esboça um ataque com dois avançados móveis – Cristiano Ronaldo e Nani – António Oliveira entrou na prova com fórmula idêntica. João Vieira Pinto e Sá Pinto eram as principais referências ofensivas.

Até aqui nada de novo ou de especialmente preocupante. A estratégia, aliás, pode fazer todo o sentido perante a falta de soluções testadas com resultados animadores para o setor atacante.

A grande diferença reside na escassez de alternativas para chegar à baliza contrária. Em 1996, Portugal tinha Luís Figo e Rui Costa no relvado, a par dos Pintos. No banco estavam os dois maiores goleadores lusos do campeonato nacional, Domingos Paciência e Jorge Cadete, para além de Pedro Barbosa, Vítor Paneira, Folha ou o jovem Porfírio.

A Seleção que caiu aos pés de Karel Poborsky nos quartos de final do torneio realizado em Inglaterra tinha soluções mais entusiasmantes para uma zona crónica para o futebolista português: a grande área adversária.

O cenário atual é de uma escassez preocupante.

Por um lado, Fernando Santos conta com um incomparável Cristiano Ronaldo e pondera colocá-lo a dividir o setor com Nani, outro jogador com números interessantes na Seleção Nacional.

E o resto?

Eis o grande problema. E nem é Éder que me vem imediatamente à cabeça, embora o avançado do Lille esteja num quadro de falta de confiança na equipa das Quinas que dificilmente será revertido em pleno Campeonato da Europa.

A conversa podia levar-nos a Bruno Moreira (Paços de Ferreira) ou Hugo Vieira (Estrela Vermelha), os melhores marcadores portugueses para lá de Cristiano Ronaldo, mas nesta fase acabou-se o espaço para surpresas e faria pouco sentido discutir o que já não está em discussão. Infelizmente.

Cristiano Ronaldo e Nani, então. Acredito que Éder – ou no limite Hugo Almeida ou Hélder Postiga - também estará em França, pois seria particularmente grave avançar para um Europeu sem ponta de lança.

Depois, a escolha final não andará longe do grupo chamado para os particulares para Bulgária (0-1) e Bélgica (2-1): Danny, Ricardo Quaresma, Rafa ou Bernardo Silva.

Se a dupla Ronaldo-Nani falhar, por lesão ou circunstância de jogo, o que podemos esperar com este lote de opções ofensivas?

Os avançados de Real Madrid e Fenerbahçe marcaram perto de 90 por cento dos golos (89,2%) do setor. Desde que sejam eles a tratar daquele ligeiro pormenor – colocar a bola na baliza – a Seleção Nacional pode acreditar.

Quando Fernando Santos for obrigado a mexer, seja qual for a solução encontrada, o caminho para o golo será dramaticamente encurtado.

Eis os números que podemos consultar no site oficial da Federação Portuguesa de Futebol.

  • Ricardo Quaresma: 47 jogos, 4 golos
  • Danny: 38 jogos, 4 golos
  • Éder: 23 jogos, 1 golo
  • Rafa: 6 jogos, 0 golos
  • Bernardo Silva: 6 jogos, 0 golos

É curioso que Fernando Santos se tenha lembrado de Bruno Alves. De facto, o defesa-central do Fenerbahçe tem o maior número de golos depois de Cristiano Ronaldo e Nani: 10, essencialmente em lances de bola parada. Os centrais têm dado o seu contributo, assim como alternativas que vão de Fábio Coentrão a João Moutinho ou ao menos presente Raul Meireles. Mas não há muito mais para além disso.

Ricardo Quaresma marcou 1 golo nos últimos 8 anos e 25 jogos pela Seleção Nacional. Danny, para mim o caso inquietante, não marca por Portugal desde setembro de 2011. 15 jogos em branco.

Quando um jogador como Danny, de qualidade reconhecida na Rússia e um rótulo de 30 milhões de euros, demonstra crónicas dificuldades para fazer na Seleção o que faz no clube, há motivos para preocupação e remete-nos para outras questões: por um lado, se o valor de mercado é sinónimo de rendimento. Por outro, se faz sentido continuar a insistir em nomes que não são problema nem têm sido realmente solução.

Entre Linhas é um espaço de opinião com origem em declarações de treinadores, jogadores e restantes agentes desportivos. Autoria de Vítor Hugo Alvarenga, jornalista do Maisfutebol (valvarenga@mediacapital.pt)