«A culpa é do processo» é uma nova rubrica do Maisfutebol, que analisará taticamente uma equipa em destaque na época em curso. Se tiver alguma sugestão envie para lm.externo@mediacapital.pt
Thomas Tuchel assumiu o Paris Saint-Germain no início da época, numa altura em que só vencer o campeonato francês é demasiado curto para as aspirações dos parisienses.
O sonho é europeu e os nomes de Mbappé, Cavani e Neymar dão força às hipóteses do PSG vencer a Liga dos Campeões.
Embora haja nomes de enorme qualidade, o plantel que Tuchel tem à disposição tem pouca profundidade, sobretudo no meio-campo, e são vários os miúdos que têm tido muitos minutos, sobretudo internamente.
Essa pouca profundidade a meio-campo, aliada à qualidade dos três homens da frente tem levado Tuchel a fazer várias experiências e até outubro experimentou vários sistemas (4-4-2, 4-3-3, 3-5-2 e atualmente ainda vai rodando entre eles).
A principal mudança aconteceu após a derrota, única da época até agora, com o Liverpool, em Anfield. O PSG perdeu por 3-2 com os Reds e Tuchel percebeu que neste tipo de jogos precisava de mais solidez e mais comprometimento defensivo.
Nesse jogo foi evidente que o 4-3-3 (a defender), com Mbappé e Neymar nas alas, deixava a equipa exposta nos flancos e que as compensações que Rabiot e Di Maria faziam aos colegas, desprotegiam a zona central do terreno, onde o Liverpool concentrava imensa qualidade.
Então para essa segunda mão com os Reds, Tuchel ensaiou uma mudança tática e defendeu em 4-4-2, com Mbappé e Cavani a pressionarem logo a saída dos Reds e com uma linha de 4 no meio, com Neymar a subir os níveis de comprometimento defensivo na faixa esquerda. O PSG acabou por vencer por 2-1 e um dos golos nasce mesmo de uma recuperação de bola do brasileiro em zona muito recuada.
Essa mudança no sistema defensivo foi significativa, mas a maior foi a passagem de Neymar para terrenos centrais, assumindo verdadeiramente a camisola 10.
Em posse de bola, o PSG mudou a forma de jogar e esta é a principal marca do alemão até agora.
Marquinhos foi «adaptado» a médio defensivo, até para melhorar a recuperação de bola e a pressão no momento em que o PSG não a tem, mas sobretudo para Tuchel conseguir projetar os dois laterais em simultâneo e ficar com uma defesa a três.
Com a bola, Marquinhos recua e coloca-se no meio dos dois centrais, com Neymar e Di Maria a aproximarem-se no meio de Verratti.
Do meio-campo para a frente há duas variantes de Tuchel. Ou Di Maria se junta a Neymar e Verratti na zona de construção e criação (imagem de cima), com Cavani e Mbappé a ficarem na frente, ou o argentino cai na direita, Mbappé abre na esquerda e o uruguaio fixa-se na frente.
O treinador alemão deu estas variantes criativas ao ataque do PSG, que ilude e desorganiza o adversário, e nota-se agora um PSG muito melhor posicionado para a recuperação rápida após a perda.
O foco deste PSG é Neymar e o brasileiro é o verdadeiro cérebro, quer com a bola a derrubar linhas ou na forma como arrasta adversários para deixar colegas sozinhos.
A estratégia de Tuchel passou por atrair o Liverpool para Neymar e assim Verratti e Di Maria passaram a ser peças muito influentes no ataque do PSG.
Depois houve um «pormaior» fundamental no último terço, na fase de decisão.
Mbappé e Cavani e a lição estudada para afunilar a defesa e afastar os centrais dos Reds um do outro. A primeira lição era a de se posicionarem lado a lado entre o central e o lateral. O que é que isto fez?
Fez com que a linha de quatro defesas do Liverpool estivesse muito próxima e o PSG aproveitou os dois laterais para criar lances de perigo.
Depois, quer Mbappé, quer Cavani tentavam afastar os centrais um do outro, para criar espaço para Neymar ou um colega atacar aquele espaço.
A solução para derrubar a barreira dos Reds esteve aqui, num jogo que era decisivo para o PSG, porque em caso de derrota ficava fora da Liga dos Campeões, num grupo que tem ainda Nápoles e Estrela Vermelha.
Os parisienses tiveram inúmeras oportunidades de golo e o que não é possível mostrar em imagens é a magia de Neymar e a forma como ele foi destruindo Wijnaldum e companhia no meio-campo. Se puderem, revejam o jogo.
Defensivamente, dois pormenores determinantes.
Um deles, o comprometimento maior de Neymar a tapar o lado direito do Liverpool.
O extremo não «ficou a ver» quando o PSG não tinha a bola e isso fez com que os parisienses fossem um bloco muito difícil de ultrapassar. Foram raras as bolas de perigo do Liverpool, que só marcou de grande penalidade.
Outra nuance foi a cobertura de Cavani a Henderson. O pêndulo do Liverpool passou ao lado do jogo porque o uruguaio lhe foi anulando sempre as linhas de passe.
O maior problema que este PSG enfrentou no jogo foi o momento da perda de bola, quando Verratti subia no terreno.
Como Marquinhos estava recuado, na tal linha de três, se o italiano subisse e perdesse a bola na última zona do Liverpool, criava-se um fosso na linha intermédia do PSG.
O facto de ter muita gente em zona ofensiva foi resolvendo alguns problemas porque conseguiam recuperar a bola rapidamente, com uma pressão eficaz. Quando essa pressão não resultava, valeu o enorme jogo de Marquinhos, Thiago Silva e Kimpembe que até em lances de inferioridade numérica conseguiram ser superiores.
O caminho de Tuchel e do PSG para o sucesso na Champions passa por aqui, por um esquema tático que mantenha a equipa equilibrada, e para isso será preciso melhorar o momento de perda sempre que Verratti sobe no terreno, e por ter Neymar numa zona central para participar mais no jogo. E como combina o brasileiro com Mbappé… uma maravilha.
Tuchel está a transformar um génio de linha num jogador central e cerebral, mais pensador e mais decisivo. Neymar tem tudo e por muito que o critiquem por rebolar ou ser espalhafatoso não deixará de ser um craque, basta apenas observar para o que interessa do jogo. E aí sim, o brasileiro vale sempre o bilhete porque nos vai dar futebol espetáculo.
Artigo original: 11/12, 23h50