«Na verdade, parece-me estranho.» À reação de Lionel Messi a mais um caso que mexe com o Barcelona por estes dias podia-se acrescentar um emoji com um boneco intrigado se o assunto fosse divertido, mas não é. A estrela dos catalães deixou claro que não encara de ânimo leve a hipótese de o Barcelona ter patrocinado contas nas redes sociais que difundiram insinuações e críticas sobre jogadores, treinadores e dirigentes. O caso rebentou no início da semana e já obrigou o presidente a explicar-se aos jogadores e a desdobrar-se em desmentidos, enquanto anunciava a rescisão do contrato com a empresa que, na versão do clube, tinha sido contratada para «monitorizar» as redes sociais.

«O presidente disse-nos o mesmo que disse em público. Explicou-nos qual era a situação o que se tinha passado», disse Messi nesta quinta-feira em entrevista ao «El Mundo Deportivo», sobre a reunião de Josep Maria Bartomeu com os capitães: «A verdade é que acho estranho que aconteça uma coisa destas. Também diziam que havia provas. Não podemos dizer muito mais, mas vamos esperar para ver o que se passa com tudo isto.»

A situação não é propriamente clara, porque o que está em causa é mesmo a nebulosidade das ligações e da origem de muito do que aparece nas redes sociais. É uma questão transversal e profunda nos tempos que correm. E se também não será novidade o facto de muitas organizações, também no futebol, usarem estratégias de manipulação de informação, o caso levanta muitas outras questões, que vão das suspeitas de financiamento com verbas do clube de um esquema de desinformação contra elementos da sua própria estrutura ao controlo, ou falta dele, sobre esse terreno movediço. 

O caso foi desencadeado pela Cadena Ser, com a informação de que o clube pagou cerca de um milhão de euros a uma empresa de consultoria de redes sociais e marketing digital, a I3Ventures, para «criar estados de opinião» nas redes sociais, o que era feito através de várias contas não oficiais. Essas contas amplificaram por exemplo insinuações sobre Messi e o atraso na renovação do contrato, ou fizeram comentários jocosos sobre a família do argentino e também sobre Piqué. Também Xavi ou Guardiola foram visados, bem como Victor Font, candidato anunciado à presidência do clube.

O Barcelona apressou-se a desmentir a associação a essas contas, admitindo apenas que tinha contratado no final de 2017 «serviços de monitorização» das redes sociais, «com o objetivo de ter conhecimento tanto das mensagens positivas como negativas» envolvendo o clube.

Mas a Ser divulgou também dados de um relatório de outra empresa, associada à I3Ventures, entregue ao Barcelona, a fazer o balanço do impacto das tais contas nas redes sociais, o que seria um dado mais a reforçar o envolvimento do clube. Veio a confirmar-se que uma dessas contas no Facebook, Respeto e Deporte, é mesmo propriedade da I3Venture, o que levou o Barcelona a anunciar entretanto a rescisão do contrato com a empresa. Esta defende-se com o argumento de que a gestão da conta em questão não era da sua responsabilidade. «Estamos a ser usados como munição para atacar a direção do Barça», diz Carlos Ibañez, o dono da empresa.

As repercussões podem não ficar por aqui. Nesta quinta-feira Bartomeu disse que o clube continua a fazer uma «análise interna» da situação e para sexta-feira está prevista uma reunião da Junta Diretiva do Barcelona onde o presidente deverá dar mais explicações.

É um escândalo que ameaça abalar ainda mais a estrutura dirigente do clube, já fragilizada nos últimos tempos pela forma como geriu a saída de Ernesto Valverde, pela crítica pública de Messi a Eric Abidal quando o diretor justificou o despedimento do treinador com o argumento de que havia jogadores que não trabalham muito, ou com a gestão desportiva que conduziu, face à lesão prolongada de Dembelé, ao aproveitamento de uma singular prerrogativa para, com o mercado fechado, acionar unilateralmente junto do Leganén a cláusula de rescisão de Martin Braithwaite e gastar 18 milhões de euros na contratação do avançado dinamarquês.