A conquista do título mundial de todo o terreno em motos por Paulo Gonçalves, este sábado, dá um foco de luz um pouco mais acentuado para a modalidade numa altura pouco habitual. Costuma ser em janeiro, por ocasião do Dakar, que os pilotos portugueses recebem as atenções generalizadas. Mas Paulo Gonçalves voltou a provar que vale a pena olhar para esta modalidade onde Portugal surge com uma força nunca vista. E nem é de agora.

De facto, o mesmo Paulo Gonçalves, já antes do Dakar 2013, dizia em entrevista ao Autoportal que Portugal era o país com mais candidatos a vencer a prova.

«Portugal tem uma representação de luxo! Não há mais nenhum país com tantos pilotos capazes de discutir um lugar no pódio e até a vitória no Dakar. Temos pilotos muito talentosos. Num país como o nosso, com o que se aposta e, sobretudo, não se aposta neste campo, ter três pilotos com categoria para discutir um pódio na prova principal do todo o terreno é um luxo», afirmava.

O, agora, campeão do mundo falava de si próprio, mas também de Ruben Faria e Hélder Rodrigues. E tanto Gonçalves como Faria apresentam, agora, trunfos bem mais fortes para serem levados em conta na hora de fazer as apostas do que há um ano por esta altura.

A verdade é que esse trio terminou no top-10 do último Dakar. Ruben Faria foi segundo, a melhor classificação de sempre de um português. Hélder Rodrigues acabou em sétimo e Paulo Gonçalves em décimo. Mais nenhum outro país colocou três representantes nos dez primeiros.

É certo que os grandes favoritos continuam a ser o francês Cyril Després e o espanhol Marc Coma. Mas as «segundas linhas» dos dois países estão bem mais abaixo, em termos de resultados, do que as apostas portuguesas.

Há que contar com o espanhol Joan Barreda ou o francês Olivier Pain. Também com o chileno «Chaleco» Lopez. Mas, tudo somado, Portugal, com muito menos pilotos em prova do que Espanha e França, sublinhe-se, mostra talento como nunca numa modalidade ainda pouco explorada por estes lados.

E deixa espaço para o sonho que falta atingir: ganhar a mais dura prova de Todo-o-terreno mundial.

Hélder Rodrigues: o melhor currículo

Atirado para segundo plano pelas conquistas mais recentes de Ruben Faria e Paulo Gonçalves, o lisboeta Hélder Rodrigues ainda é o piloto português com melhor currículo. E, por isso, uma esperança legítima a ter em conta.

Estreou-se no Dakar em 2006 logo com um sexto lugar. Em 2007 passou, pela primeira vez, pela liderança da geral e terminou em quinto. Sempre em ascensão, tornou-se o primeiro português a acabar num pódio do Dakar em 2011, ano em que se sagrou campeão do mundo, repetindo o feito no ano seguinte.

Mudou-se, então, para a Honda, uma estrutura potentíssima, apostada em regressar aos tempos de glória no Dakar. A primeira experiência, este ano, não foi brilhante mas a aposta no português manteve-se. E ele promete retribuir.

Ruben Faria: com liberdade para voar

Antes do Dakar deste ano, Ruben Faria era encarado apenas como o «mochileiro» de Cyril Després, o maior candidato a vencer. É verdade que foi com essa missão que entrou em prova. Estava lá para ajudar o francês a ganhar. Mas acabou por fazer bem mais do que isso.

Chegou a ser líder, fez Portugal sonhar com a vitória e acabou no segundo lugar, precisamente atrás de Després.

Em 2014, já como piloto oficial da KTM, deixa o «fardo» de trabalhar para outros e pode pensar em si. Está a recuperar de uma fratura no pulso, sofrida no Rali dos Sertões, no Brasil, para chegar em boa forma à América do Sul.

Paulo Gonçalves: a nova esperança

O título mundial confirma o amadurecimento do piloto de Esposende, muitas vezes criticado pela irregularidade. É uma nova esperança a ter em conta.

Vai chegar ao Dakar mais confiante que nunca e, mercê da integração na estrutura da Honda, tal como Hélder Rodrigues, também com o maior apoio de sempre.

Como mostrou com a vitória em Marrocos e a conquista do título mundial, ele sabe dar boas respostas.

Há espaço para mais alguém?

Hélder Rodrigues, Ruben Faria e Paulo Gonçalves têm um aspeto em comum muito importante: estão todos integrados em equipas oficiais, estruturas estrangeiras e com larga margem para apostar. Financeiramente, queremos dizer.

Ir para um Dakar numa estrutura privada ou numa equipa de parcos recursos é uma aventura bem maior. Pedro Bianchi Prata, piloto habituado a estas andanças, sabe bem isso. Afinal, ainda no ano passado teve de levar a cabo uma ação de «crowdfunding» para viabilizar a sua participação.

O piloto portuense, recorde-se, era o responsável da equipa Bianchi Prata onde Hélder Rodrigues e Paulo Gonçalves deram os primeiros passos no Dakar.

«Tenho pena de ser uma equipa portuguesa e não ter patrocinadores e meios para poder ter continuado com o Paulo [Gonçalves] como piloto, pois, à semelhança do que se passou com o Hélder [Rodrigues], depois do Dakar 2007, após muito trabalho, veio alguém com mais dinheiro e levou-o», lamentou Bianchi Prata na mensagem de felicitações ao novo campeão do mundo.

A mensagem é, por isso, direta e simples. Mesmo que Portugal não consiga ombrear financeiramente com as estruturas de topo, possui talento capaz de o fazer. Agora é esperar por Janeiro de 2014.

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