Antes do jogo, um muro alemão, que parecia quase intransponível.

Na Europa do futebol, não havia quem apostasse as suas fichas numa vitória dos ilustres desconhecidos portugueses.

Do outro lado estava o colosso de Munique. O Bayern de Brehme e Matthäus, que no Itália’90 levariam a seleção alemã à conquista do título mundial.

Mais experiência em campo e também no banco, onde se sentava o técnico Udo Lattek, que treze anos havia comandado os bávaros até à conquista da primeira Taça dos Campeões Europeus.

O favoritismo não vestia de azul e branco, portanto, e o FC Porto não só estava ciente disso como assumiu essa condição por estratégia do próprio técnico, conforme recorda o capitão João Pinto:

«O Artur Jorge disse-nos para darmos o favoritismo ao Bayern em todas as entrevistas que dessemos antes da final, mas a intenção era ganhar. Não sei se eles pensavam que já estava ganho. Nem sei se era arrogância. Mas o que sentimos é que nos tratavam como inferiores a eles.»

Revista de promoção à final de Viena

Paulo Futre recorda-se bem das noites que antecederam o jogo, pela ansiedade: «Quando estava na cama do hotel, metia-me de barriga para baixo mas o coração batia tanto que tinha de me virar. Estava no quarto com o Frasco, ele já a dormir e eu ali, acordado, mesmo com comprimidos para dormir. Quando finalmente chegou o dia, acordei aos saltos na cama. No percurso do hotel para o Prater nem um mosquito se ouvia. Estávamos todos ali a pensar o mesmo: “É o nosso momento de fazer história”. Sabias que não era um silêncio de estarmos assustados, era um silêncio de responsabilidade, de concentração.»

António Frasco salienta «seria utópico dizer que o Bayern não era o favorito» e recorda também o trajeto entre o hotel em Prater: «Eles já tinham conquistado várias Taças dos Campeões (três consecutivas entre 1973 e 1976) e isso sentia-se. Quando íamos na camioneta para o estádio, os próprios adeptos do Bayern diziam que nos iam dar quatro ou cinco. E nós dizíamos: “sim senhor, no fim veremos”.»

À chegada ao estádio, nova prova do ascendente alemão. «O favoritismo deles estava patente no estádio. Talvez 80 por cento dos adeptos eram alemães. Também foi um grande número de adeptos de Portugal, cerca de 20 mil. Mas a diferença era grande. Houve algum menosprezo em relação a nós da parte dos alemães.», lembra o antigo defesa Eduardo Luís, enquanto o companheiro de meio-campo Jaime Magalhães salienta que já à entrada para o aquecimento os próprios jogadores portistas brincavam com a sua aparente condição de underdogs:

«Logo no princípio, quando estamos formados onze lado a lado para entrar no campo, nós na brincadeira com aqueles «bichos» tão grandes dizíamos: “Acho que 4-0 é um bom resultado para nós.” Mas isso era uma brincadeira, depois lá dentro era diferente.»

Jornal «O Comércio do Porto» do dia da final

E não é que foi mesmo diferente?

«Eles estavam de rastos no final do jogo, não acreditavam que iam perder a final», lembra Eduardo Luís, com João Pinto a acrescentar: «No final? Os alemães deram os parabéns. Se calhar com a cabeça mais para baixo do que o normal. Estavam convencidíssimos que iam ganhar…»

Parecia intransponível, não era? Os muros existem para ser derrubados.