As memórias de Ricardo e dos apuramentos épicos da seleção nacional em pleno Euro-2004 e no Mundial 2006, diante da Inglaterra podem induzir em erro: a verdade é que os desempates por penáltis são terreno minado para as equipas portuguesas. A final do Benfica, em Turim, foi o dado mais recente a lembrá-lo: as equipas portuguesas de clube estão entre as que têm piores desempenhos nos desempates por grandes penalidades desde que a fórmula foi introduzida nas competições europeias. De 1970 até à atualidade, houve 19 finais ou eliminatórias envolvendo clubes nacionais, com o saldo de sete vitórias e 12 desaires - um rendimento de 36,8% que deixa os portugueses na 16ª posição entre 20 países estudados.

Não contando o caso particular da Turquia, cujas equipas venceram os únicos dois desempates em que participaram – entre eles a final da Taça UEFA de 2000, pelo Galatasaray – a Alemanha é o país com maior eficácia neste tipo de situações: incluindo nestas contas as equipas da antiga RDA, os seus representantes somam 22 triunfos em 30 desempates (eficácia de 73%). Logo a seguir vêm as equipas romenas, com sete vitórias em dez, ou 70%) e as húngaras, com nove em 14 (64%). Na cauda do pelotão vem a Grécia, cujas equipas perderam seis dos seus sete desempates – um número demasiado alto para ser atribuível a simples coincidência.

A Alemanha mantém esse invejável registo de eficácia nas provas de seleções, ao contrário do que acontece, por exemplo, com os ingleses, que têm saldo positivo nas provas da UEFA – aliás, bem melhor do que o dos portugueses – e perdem sistematicamente nas provas de seleções.

Eis os níveis de eficácia nos desempates por penaltis de cada país:
Turquia, 2 vitórias/zero derrotas (100%)
Alemanha*, 22/8 (73%)
Roménia, 7/3 (70%)
Hungria, 9/5 (64%)
Bélgica, 9/6 (60%)
Ucrânia, 3/2 (60%)
Checoslováquia**, 7/5 (58%)
Áustria, 4/3 (57%)
Jugoslávia*** 14/12 (54%)
Inglaterra, 13/11 (54%)
URSS/Rússia, 8/9 (47%)
Espanha, 9/11 (45%)
Itália 15/18 (45%)
França 6/9 (40%)
Suíça 4/6 (40%)
Portugal 7/12 (37%)
Escócia 4/7 (36%)
Holanda 5/9 (36%)
Suécia 3/6 (33%)
Grécia 1/6 (14%)

* Incluindo as equipas da antiga RDA
** Incluindo as equipas da Rep. Checa e da Eslováquia
*** Incluindo as equipas sérvias, macedónias, eslovenas e croatas

Das equipas portuguesas que já foram a desempates por penaltis, o Benfica perdeu três em cinco, enquanto o FC Porto foi batido nas duas únicas decisões deste tipo em que participou nas provas da UEFA (embora tenha ganho uma Taça Intercontinental desta forma, frente ao Once Caldas). Sporting, Marítimo, Belenenses e Salgueiros perderam todos os seus desempates, V. Guimarães tem saldo neutro, e só Boavista, E. Amadora e Sp. Braga – este último com um tal Beto na baliza, diante da Udinese - têm registos totalmente vitoriosos.

Benfica: rematar primeiro é uma vantagem, mas não resultou

A final de Turim, entre Benfica e Sevilha, foi a 17ª decisão de uma prova da UEFA com recurso a esta forma de desempate: dez na Taça/Liga dos Campeões, uma na extinta Taça das Taças e seis na Taça UEFA/Liga Europa. O Benfica juntou-se a Arsenal e Espanhol de Barcelona no grupo das equipas que já perderam duas finais desta forma. O Sevilha, pelo contrário, forma com o Liverpool o duo das equipas que já venceram duas finais por penaltis. Milan, Chelsea, Juventus, Bayern e Valência também já estiveram em duas finais decididas na marca de grande penalidade, ganhando uma e perdendo outra.

A estatística diz que, apesar de ter perdido a decisão, o Benfica estava em posição vantajosa no início do desempate, por ter iniciado a série: um pouco mais de 60 por cento das equipas que rematam primeiro vencem os seus confrontos, contra menos de 40 por cento para as que rematam a seguir ao adversário. Neste caso, a vantagem, teoricamente derivada da pressão extra que é rematar presionado por um golo adversário, não funcionou porque apenas Bacca, no primeiro remate do Sevilha, teve de anular essa desvantagem.

Por outro lado, os jogadores do Sevilha bateram todos os seus penaltis para o chamado lado «natural» (isto é, o lado esquerdo de um avançado que chuta de pé direito, e viceversa), que facilita um remate em potência, face ao movimento cruzado da perna, enquanto por exemplo Cardozo tomou a opção contrária, optando pela colocação, o que em conjunto com o óbvio adiantamento facilitou a defesa de Beto.

Outro dado relevante: o facto de a decisão de Turim ter sido junto da baliza dos adeptos do Sevilha não explica o desfecho negativo, visto que a análise dos desfechos nos desempates por penaltis, mostra que o factor casa é virtualmente irrelevante neste tipo de decisões, com as equipas da visitantes a ganharem quase 50 por cento das vezes.

Em toda a história das provas da UEFA já houve seis decisões a penaltis entre equipas do mesmo país, incluindo duas finais da Liga dos Campeões (Milan-Juventus, em 2003 e Man. United-Chelsea, em 2008) e uma final da Taça UEFA (Sevilha-Espanhol, em 2007). Nesta edição da Liga Europa, os sevilhanos não se limitaram a afastar uma equipa do mesmo país, afastando o Bétis no primeiro desempate por penaltis entre equipas da mesma cidade.

Os primeiros desempates por penaltis nas competições europeias aconteceram a 30 de setembro de 1970 em Budapeste (Honved-Aberdeen, com vitória dos húngaros) e em Marselha (Marselha-Spartak Trnava, com triunfo checo). Na Taça dos Campeões, a fórmula foi aplicada pela primeira vez em novembro, numa eliminatória entre Borussia Moenchengladbach e Everton que sorriu aos ingleses.

O desempate mais longo na história das provas da UEFA aconteceu a 24 de agosto de 2006, numa pré-eliminatória da Liga Europa, entre o Drogheda (Irlanda) e o IK Start (Noruega): exigiu 24 pontapés da marca de grande penalidade, com a vitória a sorrir aos noruegueses, por 11-10. Ainda assim, numa escala global, longe do registo fixado em 20 de novembro de 1988 no torneio de abertura do campeonato argentino: foram precisos 44 remates para desempatar Argentinos Juniors e Racing Avellaneda (19).

Recorde a maior maratona de penaltis nas competições europeias: