Uma reportagem de investigação, emitida na quarta-feira à noite no programa «Cash Investigation», do canal «France2», está a incendiar o mundo do futebol em França.

O programa, com duração de hora e meia, exibe casos relacionados com transferências e vendas de parcelas de passes de jogadores, bem como a influência dos empresários junto dos jovens em formação.

O sindicato francês dos agentes desportivos já veio exigir a demissão do presidente da Federação Francesa de Futebol, Noel Le Graet, considerando que o responsável máximo do futebol gaulês se referiu com «incrível ligeireza» à aplicação dos regulamentos existentes.

Entre os casos referidos na longa reportagem, com o título «Foot business: enquête sur une omerta» («Os negócios do futebol: uma investigação sobre a lei do silêncio»), um dos mais focados é o do central portista Eliaquim Mangala.

É apontado na investigação que um terço do passe do internacional francês pertence a um fundo do Doyen Group, ligado à extração de urânio. A mesma investigação refere ainda que a Robi Plus, empresa a quem a SAD do F.C. Porto concedeu 10 por cento da receita líquida de uma eventual transferência de Mangala, tem como administrador Maurizio Delmenico, relacionado com Luciano D'Onofrio. Figura conhecida no futebol europeu, D¿Onofrio era dirigente do Standard de Liege quando o F.C. Porto adquiriu os direitos de Mangala e Defour ao clube belga. Delmenico responde a um telefonema do repórter e confirma que tem negócios com D'Onofrio.

Um repórter do programa visitou um treino do F.C. Porto no Olival e, apesar das resistências do clube portista, conseguiu uma entrevista com Mangala, surpreendendo o jogador com uma fotografia sua em tamanho real. O jogador foi confirmando as indicações sobre as parcelas do seu passe, mas referiu nada saber sobre quem comprou parte do seu passe.«Fiquei a saber pelos jornais», confessa. Um dos momentos caricatos da reportagem é a fuga de Luciano D'Onofrio, em plena rua, ao repórter do programa, que o tentava questionar sobre estes temas, acompanhado por uma imagem de Mangala em cartão. Mais tarde conversam brevemente por telefone. Dias depois, o advogado de Luciano liga ao jornalista e diz-lhe que a pessoa que perseguiu era um sósia, não D¿Onofrio.

Michel Platini, presidente da UEFA, é questionado na reportagem, em plena conferência de Imprensa sobre o Euro 2020. O líder da UEFA, que na mesma manhã tinha-se recusado a participar no programa, estranhou quando viu que um repórter da «France2» iria fazer uma pergunta e depois respondeu assim à questão sobre o passe de Mangala: «Já disse o que achava sobre os fundos de investimento no futebol, mas parece que ninguém me ouve. Sabemos o que se passa em relação a empréstimos que se fazem, vendas de parcelas, autênticos leasings sobre os direitos dos jogadores. Há que mudar os regulamentos».

São também referidas as transferências de Thiago Motta, do Inter para o PSG, e apontadas eventuais ilegalidades fiscais, fiscais, como o caso da transferência do colombiano Carlos Sanchez, do Valenciennes para os chilenos do Rangers de Talca

Outro ponto forte da grande reportagem é a denúncia de tráfico de menores no futebol, referindo-se a um caso de talento francês de 11 anos, Madin, cujos pais o levam a treinar no Barcelona.

A reportagem mostra desde essa idade se pode fazer um contrato comercial entre um agente desportivo e um menor. E acusa o Barcelona de ter um esquema que lhe permite, com jovens talentos como Madin, ganhar cerca de 90.000 euros por cada ano de formação. Na parte final da reportagem, Jérôme Valcke, número 2 de Blatter na FIFA, admite preocupação em relação aos fundos, mas defende-se na legalidade dos regulamentos em vigor. A reportagem prolongou-se por meses e levou a equipa de jornalistas a diversas cidades europeias.