Paris é uma cidade com mais de dois milhões de habitantes, conhecida como ‘cidade das luzes’ ou do amor. Contudo, neste momento é uma cidade que respira futebol ou não estivesse a três dias de receber o jogo de abertura do Euro2016. Numa realidade paralela, existe uma luz que brilha com as cores de Portugal na cosmopolita capital gaulesa.
Na diversidade de nacionalidades que fazem da cidade gaulesa a sua casa, encontra-se a maior comunidade portuguesa do mundo. Esse facto é explicado pelo regime ditatorial vigente em Portugal e pelo eclodir da Guerra Colonial na década de 60. Como forma de fugir ao regime e à guerra, aliada à ambição de encontrar melhores condições de vida e de trabalho, assistiu-se a um ‘boom’ de emigração em Portugal e o destino daqueles que, saíram, muitas vezes de forma clandestina, foi preferencialmente França.
E é nos subúrbios de Paris, mais precisamente em Saint-Maur de Fossés ao serviço do US Lusitanos, que quase uma dezena de portugueses continuam a elevar o nome de Portugal na antiga Lutécia: Filipe Sarmento, Alexandre de Oliveira, Hugo Silva, Pedro Nova, Rui Ferreira, Diogo Torres são a ‘armada lusa’ que compõe o plantel liderado por Carlos Secretário, que tem como adjunto Richard Branco.
O US Lusitanos celebrou a subida ao quarto escalão do futebol francês, conhecido como CFA. Num campeonato com oito séries, o Lusitanos terminou na segunda posição, atrás da equipa B do Lille, sendo que alcançou a promoção como um dos melhores segundos. A subida foi consumada com uma vitória por claros 5-0 frente ao SC Feignies.
O Maisfutebol esteve à conversa com dois jogadores portugueses que integraram as fileiras do clube mais português de França esta temporada: Pedro Nova e Hugo Silva.
Pedro Nova passou por clubes como Leixões, União Nogueirense, Grijó e Salgueiros 08 antes de ensaiar uma experiência no estrangeiro. O médio, titular em 23 jogos, descreve o sentimento de subir por o clube que é um símbolo da comunidade portuguesa na cidade banha pelo Sena.
«É uma sensação muito boa porque para além de termos subido, fomos sempre muito apoiados pela comunidade portuguesa. Isso sim ajudou-nos bastante no nosso dia-a-dia e no objetivo que tínhamos desde o início. É um orgulho enorme», contou.
Por seu lado, Hugo Silva atuou pelo Cesarense, Sanjoanense, Sporting Clube de Espinho antes de surgir o convite do US Lusitanos. Titular em 25 jogos do campeonato, o defesa foi um dos pilares do conjunto comandado por Carlos Secretário.
«É incrível. Não palavras para descrever. As pessoas estão longe de Portugal e nós demos-lhe uma alegria enorme. Se calhar com isto, atenuamos as saudades que tem», afirmou.
As saudades da Pátria
No US Lusitanos, embora esta época militasse no quinto escalão do futebol francês, os jogadores dedicavam-se exclusivamente à prática da modalidade com vista a atingir o objetivo a que inicialmente se propuseram, tal como explica Pedro Nova.
«Nós não trabalhamos, só jogamos mesmo. Viemos com um objetivo, que era subir de divisão e foi isso que acabou por acontecer. É sempre uma enorme alegria elevarmos bem alto o nome do nosso país», referiu.
Ainda assim, o apoio da comunidade portuguesa em Paris tornou-se decisivo não só dentro das quatro linhas. As saudades da família e dos amigos é, de certa forma, atenuada pela forte presença da população oriunda da antiga Lusitânia.
«Sim, há muito apoio e desde já agradecemos por isso. Foi tudo mais fácil para a nossa adaptação e para o nosso sucesso. A vida fora do nosso país não é nada fácil por estarmos longe de quem mais gostamos…», confessa.
Hugo Silva reconhece que «há muito apoio por parte de todos» mas prefere destacar o facto de viver com os colegas de equipa portugueses, fator que serve de disfarce para as dificuldades sentidas.
«O facto de vivermos todos juntos ajudou a ultrapassar as saudades. Ajudamo-nos muito uns aos outros, sobretudo nos momentos mais difíceis», realçou.
O (re) nascimento do Lusitanos
O US Lusitanos foi fundado em 1966 por iniciativa de José Lebre, um emigrante trabalhador fabril. O objetivo do clube inicialmente denominado Union Sportive des Lusitano, era ser um espaço de convívio entre os colegas de trabalho, amigos e amantes do ‘desporto-rei’ como distração para minimizar as saudades da pátria.
Nos primeiros tempos, o clube tinha apenas essa função. Anos mais tarde, a direção da equipa parisiense apercebeu-se das dificuldades em manter nas suas fileiras apenas jogadores portugueses. Tendo em conta que o Salazarismo e a era de Marcello Caetano já tinha terminado e se assistia ao regresso de portugueses espalhados pelo mundo, abriu, assim, portas à integração de outras nacionalidades no plantel.
Curiosamente foi neste período, na viragem do século, que o clube viveu os seus anos mais áureos. Sob a presidência de Armand Lopes, um empreiteiro luso-português, o clube consegue quatro presenças na National, terceira divisão francesa e uma caminhada inédita até aos oitavos de final da Taça de França na época 2001-2002 que terminou frente ao RC Strasbourg.
Contudo, o clube sofreu um duro revés, aquando da decisão do presidente Armand Lopes em fundir o clube com o vizinho US Créteil que se revelou falhada por falta de entendimento entre ambas as partes.
Com a saída do empreiteiro, o clube entrou em crise e caiu para a última divisão, sendo obrigado a recomeçar da estaca zero. Sob o nome de US Lusitanos, a equipa reergueu-se e subiu quatro vezes em dez anos.
O ‘National’, onde está o ‘eterno rival’, Créteil, está cada vez mais perto.