José Lopes, 92 anos. 22 Jogos Olímpicos desde que nasceu até então. Uns sem memória, outros com várias recordações e só estes últimos vividos intensamente. Não foi por isso, de todo, uma missão aquém. Desde 1924, Portugal já conquistou 24 medalhas olímpicas, mas nenhuma teve o impacto do bronze de Telma Monteiro para ele.

«Na altura nem ligava muito. Mas desta vez, porque falava tudo em português, liguei mais. Vibrei. E agora a televisão também já mostra tudo e em tempo real», disse ao Maisfutebol o portador da única bandeira portuguesa presente na manhã desta quarta-feira no Aeroporto de Lisboa.

Pouco passava das 7h e já José Lopes guardava o lugar na primeira fila da zona das chegadas do aeroporto. Esperava pela comitiva portuguesa, que esteve no Rio 2016, e sobretudo por Telma Monteiro. A única medalhada portuguesa. A atleta que mais o fez vibrar até hoje.

De boné com as cores de Portugal e o nome do país escrito a letras garrafais, não largou a bandeira - de dimensões consideráveis - e ainda que falasse com muitos jornalistas, também não arredou pé do local até à chegada da comitiva. Afinal, o lugar era privilegiado para ser o primeiro a ver os atletas portugueses.

«Vim aqui numa missão muito especial. Vim ver a Telma Monteiro, porque gosto muito dela, mas no fundo vim para ver todos os atletas e agradecer-lhes. Só ela é que conseguiu uma medalha, mas acho que todos se esforçaram muito.»

Telma chegou. José Lopes 'pôs-lhe' os olhos em cima e caminhou, de bandeira em punho, até ao final da pequena rampa que a judoca desceu, debaixo de palmas, e onde falou com cerca de 20 jornalistas que a esperavam. [Pode ver o momento no vídeo]

Paciente. Também José Lopes esperou. Passavam atrás de Telma Monteiro e de várias objetivas e microfones, Marta Onofre, Marta Pen, Jorge Lima e vários outros atletas. Uns mais conhecidos do que outros, mas a todos que passavam José Lopes falava, até chegar à judoca.

«É atleta? Os meus parabéns»; «É atleta? Ah, foi só lá ver? Então os meus parabéns por isso».

Um, dois, três, quatro… até Telma Monteiro. «Vim aqui para lhe dar os parabéns e um abraço», atirou logo. A judoca, sempre simpática, disposta a falar, a tirar fotografias e a dar autógrafos, também não negou o abraço e agradeceu.

Conseguiu a medalha de bronze nos seus quartos JO e depois de um ano em que esteve lesionada e viveu mais sacrifícios do que o habitual. «Prevaleceu a coragem», disse Telma Monteiro, sublinhando ainda que «não há limites».

O mesmo diz José Lopes. Ao fim de tantos anos e tantos JO, viveu os do Rio de Janeiro de forma diferente e espera agora aguentar-se mais quatro anos para assistir aos de Tóquio. «Nunca pensei chegar aos 92 anos e ver Portugal ganhar uma medalha, por isso é que vibrei tanto. Agora espero chegar aos dos japoneses. Aquela gente vai fazer do melhor que já se viu», atirou.

Tristezas para trás, o foco já está no futuro e em Tóquio mas também ainda é incerto

Satisfeito e agradecido com o alcançado no Rio de Janeiro, José Lopes espera 'chegar' a Tóquio 2020 e Jorge Lima da vela também. O velejador ficou em 15.º lugar, ao lado de José Costa, na classe 49er no Rio 2016, mas o futuro é incerto. Na chegada a Lisboa, admitiu que agora é hora de pensar noutras coisas e descansar, mas leva a incerteza no pensamento.

«O futuro é muito incerto, por que, apesar de tudo que já conseguimos, não temos apoio, não estamos no projeto olímpico, não temos bolsa, nem salário. O nosso projeto acaba aqui, se não apostarem em nós, se não nos derem apoio», disse, sublinhando que apesar de nos últimos anos ter estado no lote dos «melhores» e competido contra os melhores, o facto de «uma semana não ter corrido bem» faz com que «tudo seja incerto».

Como ele estão muitos outros atletas portugueses. Mas isso, infelizmente, é assunto que se fala a cada quatro anos. Falta de apoios, falta de cultura desportiva. Ainda assim, pede-se o máximo. «E nós damos. Somos dos melhores a nível Europeu e Mundial, competimos ao lado de grandes nomes», disse ainda o velejador ao Maisfutebol.

Quanto ao povo português, também acredita que há quem siga o seu percurso e de outros atletas: «As pessoas gostam e vibram connosco, mas no entanto, no geral, há uma cultura futebolística e não desportiva. É a realidade que temos. Mas sentimos algum apoio. Gostávamos de ter dado mais alegrias, mas não conseguimos. Houve atletas que estiveram perto. A alta competição é assim. Lutamos diariamente, desta vez correu melhor a outros.»

Marta Onofre pensa da mesma maneira, pedindo, contudo, que tentem perceber melhor os atletas nacionais e que os valorizem. «Entristece chegar e não ter cá ninguém, depois de há um mês ter havido uma enchente quando chegámos com a Sara e a Dulce campeãs. Agora não correu tão bem, mas é uma amargura. De tudo fizemos. Devíamos estar agradecidos e orgulhosos, levámos uma comitiva de 92 atletas. Se lá fomos é porque já somos os melhores.»

Ainda assim, críticas para trás. Agora, a atleta do salta com vara, dia que é tempo de «descansar, renovar as energias e repousar um bocadinho» para em breve voltar a representar o país ao mais alto nível e «sempre com o mesmo orgulho». «O foco já está no que aí vem e isso tem de funcionar como uma lufada de ar fresco», disse Marta Onofre.

Com mais ou menos apoios financeiros, debaixo de muitos ou poucos aplausos, haverá sempre quem se orgulhe dos atletas portugueses. Para a mãe de Telma Monteiro, a filha «não é de bronze, é de ouro» e todos os atletas presentes nos JO são «de medalha». Valorização de quem sabe os sacrifícios, como também é o caso de Joana Pratas, velejadora presente em Atlanta 96, Sidney 200 e Atenas 2004.

«Esta comitiva merece todo o nosso apoio. Estiveram muitíssimo bem. Estive lá três vezes e agora fui ao Rio de Janeiro no navio escola Sagres. Sei o que custa estar nos JO. Irei estar sempre a apoiar, porque sei o esforço que todos eles fazem para honrar o nome de Portugal. Todos nós gostaríamos de ter conseguido mais medalhas, mas todos dignificaram muito bem o nosso país.»

É cientes disso que os atletas vão continuar a trabalhar e os 'outros' «a dar força, quando as esperanças forem menores», para que se leve o nome de Portugal mais além e, quem sabe, fazer com que mais portugueses 'acordem' e elevem a bandeira portuguesa com orgulho. Nunca é tarde e nunca haverá limites. José Lopes e Telma Monteiro que o digam.