Já passaram oito anos. Era abril de 2012 e o Sporting preparava-se para defrontar o Athletic Bilbao na Liga Europa. O treinador dos bascos chamava-se Marcelo Bielsa e era, por esses dias, um nome ainda semi-desconhecido para a esmagadora maioria dos portugueses.

Bielsa, El Loco, já tinha 57 anos, mas dava os primeiros passos no futebol do Velho Continente. Para o País Basco levava um currículo rico, com passagens marcantes pelas seleções da Argentina e do Chile, além de um estilo a exalar um perfume de romantismo e genuinidade por todos os poros.

O Maisfutebol apaixonou-se na hora pela personagem. Mais do que pelo treinador. Escrevemos uma reportagem a falar sobre o homem nascido em Rosario no ano de 1955, o homem que crescera «numa daquelas casas onde a porta é aberta por um mordomo», de paredes e maneirismos da alta burguesia.

O avô tinha sido um dos mais famosos advogados argentinos, o pai era também advogado, a mãe tinha sido professora, o irmão passara por um lugar de relevo num governo argentino e a irmã ocupara a posição de vice-governadora de uma província.

Marcelo, porém, era diferente. Sempre tinha sido diferente. A ele não interessavam as festas nas casas da aristocracia, os cargos de evidente poder, o fato e gravata que pintavam o quadro familiar. Marcelo pensava em futebol. Marcelo pensava, aliás, só em futebol.

O nosso jornal escrevia sobre o argentino «insensato e obcecado» pelo detalhe e pelos rituais. Um deles dá título a este artigo: «Treze passos, virar». Porquê? Porque Marcelo, quando ficava nervoso e inquieto, caminhava preocupado numa linha paralela ao banco de suplentes.

Treze passos para a direita e treze passos para a esquerda, com os olhos metidos no chão e as mãos atrás das costas. Recorde AQUI toda a reportagem sobre Marcelo Bielsa.

Passaram-se oito anos, é verdade, mas este é o Bielsa responsável por devolver o Leeds FC à Premier League. 16 anos depois da última presença. O Bielsa inamovível nas convicções, no estudo quase laboratorial do futebol, das relações humanas fortes e inegociáveis.

Imagem do recente Leeds-Derby

Lucas Radebe fala de um «clube do povo e para o povo»

Jack Charlton e Ian Harte, Eric Cantona e Rio Ferdinand, Gary McAllister e Mark Viduka, Nigel Martyn, Tony Yeboah e Lucas Radebe. Robbie Keane, Tomas Brolin e Jimmy Hasselbaink. David O’Leary, Robbie Keane e o saudoso Gary Speed. Um parágrafo só com nomes pesados de homens que vestiram a histórica camisola branca do Leeds United.

Portugueses? Há quatro nos registos. O esquerdino Bruno Ribeiro fez 48 jogos e cinco golos entre 1997 e 1999; o guarda-redes Nuno Santos fez parte do plantel de 1998/99 mas, tapado por Martyn e Paul Robinson, não fez um único jogo; Filipe da Costa chegou em 2007 e ficou meio ano, apenas com quatro aparições como suplente utilizado; Hélder Costa é uma das armas favoritas da boa loucura de Bielsa e na primeira época em Elland Road fez 46 jogos/5 golos.

Poucos se lembrarão, mas antes da queda nos escalões secundários de Inglaterra, O Leeds chegou a estar na meia-final da Liga dos Campeões. Em 2001. Muito antes disso, o povo de Elland Road já festejara três campeonatos ingleses: 1969, 1974 e 1992.

Lucas Radebe – leia a entrevista completa na quinta-feira à noite – fala em exclusivo ao Maisfutebol e recorda um clube «do povo para o povo». «Podia ter jogado noutros clubes maiores, tive dezenas de convites e fui sempre ficando. Porquê? Precisamente por tudo aquilo que encontrei em Leeds, naquele clube e naquele estádio.»

O Leeds desceu da Premier League em 2004, quando já agudizava financeiramente, e em 2007 caiu mesmo no terceiro escalão, a League One. Não é exagerado escrever que o Leeds viveu nas trevas, na escuridão, até 2014, ano em que o italiano Massimo Cellino adquiriu o clube. E das trevas fugiu, só para mergulhar em constantes escândalos financeiros.

Não parecia haver cura nem salvação para um dos emblemas mais queridos de Inglaterra. E pareciam cada vez mais longe e utópicos os dias em que a braçadeira de Lucas Radebe inspirava reverencial respeito nos oponentes.

Em 2017, Cellino vendeu a sua participação no Leeds ao compatriota Andrea Radrizzani. E, aí sim, a instituição – e a sua equipa profissional de futebol – entraram nos eixos. Três anos depois, aí estão eles, orgulhosos como sempre, na Premier League. «Acredito que voltaremos às provas da UEFA num prazo de dois/três anos», vaticina Lucas Radebe, 11 temporadas e mais de 200 jogos pelo Leeds.