A meditação e o futebol andam cada vez mais de mão dada.

Talvez o caso mais conhecido, ou mais próximo, seja o de Rui Patrício. Quem não se lembra do retiro que fez no final da época passada, antes do Mundial da Rússia, na Alemanha?

Antes dele, também Éder tinha feito algo semelhante. O remate à entrada da grande área francesa que culminou com a euforia de toda uma nação, aliás, foi mais do que fruto apenas de todo um trabalho físico: foi fruto de uma preparação mental muito forte com Susana Torres.

Desde então, são cada vez mais os casos de jogadores que recorrem a este tipo de terapia. É o caso, por exemplo, de Bruno Fernandes, Nani ou William Carvalho.

Ora o que o Maisfutebol lhe vai apresentar desta vez é algo diferente: trata-se de um exemplo da prática de meditação coletiva, nos escalões de formação do Leixões.

A ideia partiu do treinador de iniciados da equipa de Matosinhos. De modo a facilitar a respiração dos jovens jogadores, Vítor Barros aliou-se ao «mental coach» Luís Acabado para que o mesmo pudesse implementar alguns exercícios de modo a atingir o objetivo pretendido.

Luís Acabado, refira-se, é formado em artes marciais, yoga e meditação, tendo tratado de colocar os miúdos de 12 anos a meditar antes dos jogos e dos treinos como parte da preparação.

Como dizia Fernando Pessoa, primeiro estranha-se, depois entranha-se. Foi o que aconteceu.

«Nesta altura trabalho com duas equipas, mas comecei com uma em que os miúdos têm 12 ou 13. Eles eram distraídos e no início houve sempre aquela brincadeira de acharem isto estranho, mas depois muitos deles começaram a sentir os efeitos, principalmente na respiração. Estão muito mais calmos e menos ansiosos», começou por dizer Luís Acabado ao Maisfutebol.

A par de alguns exercícios de respiração e de concentração, Luís implementou também práticas de PNL (Programação de Neurolinguística). Não sabe de que se trata? Nós explicamos.

Os exercícios de PNL passam por uma data de tarefas com vista a treinar a mente. Neste caso, os jogadores tratam de escrever objetivos semanais para cada treino e jogo, de modo a que «a mente se concentre na tarefa a realizar no presente, reduzindo, assim, a ansiedade de um futuro incerto».

«Eles têm de escrever objetivos para os treinos semanais. Passa um bocadinho por não deixar o treino ao acaso. De não chegarem ao treino e apenas fazerem aquilo que o treinador manda. Pegar então um bocadinho na responsabilidade deles, para se sentirem responsáveis pelo trabalho que eles próprios desempenham. E depois introduzimos a análise do jogo, que passa muito por reagir de uma maneira diferente ao erro», acrescentou o mental coach.

A análise ao erro também faz parte do PNL e, segundo Luís, consiste em reconhecer os resultados menos bons para tentar aprender com eles, bem como os resultados positivos, escrevendo-os para reforçar emoções como o orgulho, a esperança, a inspiração e a gratidão.

«Hoje em dia eles têm muita pressão para não errar, mesmo na escola, e isso é contraproducente porque para haver evolução tem obrigatoriamente de haver erro. Então a ideia é formar uma reação ao erro diferente: que seja enriquecedora, que eles aprendam com o erro e não se deixem ir abaixo.»

O sucesso destas práticas foi de tal forma evidente que não passou ao lado de uma outra equipa do escalão de formação do clube de Matosinhos. Desta feita, os sub-15 do Leixões.

A atravessar uma primeira fase mais complicada no campeonato, o treinador Vítor Barros sugeriu as práticas já aplicadas nos treinos dos sub-13 ao técnico Alexandra Lapa, responsável por essa tal equipa de sub-15. Apesar de algum ceticismo inicial, o treinador lá concordou e os resultados não deixam lugar para arrependimentos.

«O feedback que eu tenho dos meninos é que eles têm utilizado estes exercícios de respiração até no quotidiano deles. Por exemplo, quando vão ter um exame escolar, para uma melhor concentração, fazem as respirações. Coisa que é extremamente engraçado de ouvir porque eles sentem-se muito focados nesse sentido», disse Alexandre Lapa ao Maisfutebol.

Trata-se, portanto, de um sucesso a nível desportivo que se estendeu ao nível escolar, com a maioria dos jogadores destes escalões a conseguirem notas que variam entre os quatros e os cincos.

«O que é um facto é que trabalhar com um mental coach proporciona aos miúdos uma melhor concentração, melhor postura e isso reflete-se no dia a dia. Inclusivamente nós, enquanto equipa técnica, temos o foco da escola porque é o mais importante e o que é um facto é que todos eles têm grandes notas. A maior parte tem quatros e cincos, o que é muito bom. Tudo também advém dessa concentração, dessa aprendizagem com o mental coach.»

Quem pensa que estas sessões são única e exclusivamente destinadas aos atletas, de resto, está enganado. Também a equipa técnica beneficia da meditação: com resultados cristalinos.

«Nós, enquanto equipa técnica, para além de estarmos a controlar as sessões, também participamos nelas quando é necessário. Quando nos sentimos mais ansiosos ou mais angustiados, essa técnica de respiração ajuda a baixar-nos os níveis», confessou Lapa.

«As pessoas sentem-se céticas em relação a trabalhar com a mente e acham que são capazes de conseguir lidar com tudo, mas a verdade é que precisamos sempre de novos conhecimentos. Enquanto treinador, preciso sempre de novos conhecimentos e sem dúvida que a mente será sempre o maior controlo do bem-estar de qualquer atleta. Tenho reparado nisso até comigo: sinto uma grande tranquilidade ao falar com os miúdos», adicionou o técnico.

Ora desde que iniciaram esta prática, os sub-13 apenas por uma vez conheceram o sabor da derrota na primeira fase do respetivo campeonato, tendo estado 11 meses sem perder. Outro facto a salientar é que, de todas as equipas dos escalões de formação do Leixões, apenas os sub-13 e os sub-15, curiosamente, passaram à fase de apuramento de campeão dos seus campeonatos.

Feitas as contas, portanto, a meditação é uma metodologia inovadora e provavelmente inédita em Portugal, que ainda é muito desconhecida por uns e um pouco estranha para outros: mas pelo menos no Leixões é uma aposta ganha e que certamente servirá de modelo para outras equipas.