«Entre Braga e Nova Iorque», dizia António Variações quando lhe pediam para definir o seu trabalho, que na década de 1980 revolucionaria a música portuguesa.

A carreira de Nuno Sousa no futebol tem o mesmo destino, mas nasce no concelho vizinho de Barcelos. Para ser mais preciso: o caminho do jovem treinador português faz-se entre a pequena freguesia minhota de Galegos (Santa Maria), onde tem as suas raízes, e o Brooklyn, borough nova-iorquino onde agora vive.

Em agosto do ano passado, Nuno chegou à Big Apple de mochila às costas. Veio sozinho, não conhecia ninguém, nem tinha ideia de voltar ao futebol tão cedo. Era mais um emigrante entre os milhões que fazem e fizeram a história de Nova Iorque.

«Estava desiludido com os últimos dois projetos em Portugal (Freamunde e Santa Maria). Sentia-me vazio de toda aquela energia que tinha quando quis ser treinador de futebol e decidi mudar de rumo e começar outra carreira noutro país», lembra ao Maisfutebol.

Quando chegou, Nuno Sousa começou a trabalhar num restaurante, dando azo a outra das suas paixões: a cozinha – em Portugal tinha um estabelecimento onde servia petiscos.

Seis meses passaram e o treinador de 35 anos não só regressou ao futebol como está a viver o seu sonho americano. É diretor-geral da academia de futebol em Nova Jérsia, onde tem duzentos jovens jogadores e dez técnicos a seu cargo, e treinador principal do United FC, clube semi-profissional da Cosmopolitan Soccer League, principal liga do estado de Nova Iorque – um escalão secundário nos Estados Unidos, abaixo da MLS e da NASL.

Chegou ao novo clube em novembro e já criou uma equipa de sub-19 para juntar à principal e de reservas: «Aqui há um grande hiato em termos de formação entre as equipas de sub-15 e os seniores. Tirando o desporto universitário, faltam equipas nos escalões intercalares.»

Como é possível passar em tão pouco tempo de empregado de um restaurante à direção dois projetos aliciantes no futebol norte-americano?

Nuno explica que foi precisamente essa possibilidade que a terra das oportunidades reserva a muitos que a escolhem como destino que o fez optar pelos Estados Unidos.

«Logo nas primeiras semanas aqui, vi um anúncio num site e enviei o meu curriculum. Uns dias depois fui lá para uma entrevista e um fazer um teste a treinar os miúdos e fiquei logo a trabalhar na academia Future Stars, em Brooklyn, onde vivo. Apercebi-me rapidamente que o nível de conhecimentos como treinador com curso da UEFA permite-me fazer o que falta por aqui. Eles reconhecem que boa parte dos treinadores europeus têm um profundo conhecimento sobre o jogo, sobretudo na organização tática. Ao contrário dos norte-americanos, que dão sobretudo um treino mais físico. Passado algumas semanas estava já a dar formação a outros treinadores… E depois houve gente noutras equipas e academias que começou a ouvir falar de mim e a requerer os meus serviços», lembra Nuno Sousa, evidenciando o que mais o impressiona do lado de lá do Atlântico: «Existe uma grande vontade de absorver conhecimento por parte dos jogadores. Uma paixão pela pureza do jogo de futebol. Além disso, não faltam oportunidades e os projetos têm solidez financeira. Se mostrares que tens boas ideias para um projeto, querem-te do lado deles.»

Foto Michala Rusanukova

De sensação na Taça aos distritais

Tudo bastante diferente da realidade que deixou para trás em Portugal. Tanto que nesta época até já recusou dois convites, um para regressar a um clube do Campeonato de Portugal e outro para rumar à China.

Não correu bem a única prova como técnico principal na II Liga, no comando técnico do Freamunde, em 2012/13. «Foi uma experiência traumatizante no futebol. Tive de voltar atrás para perceber que o futebol não era aquilo», recorda, para esclarecer que «aquilo» eram «jogadores há alguns anos no plantel, que queriam controlar o clube».

«Voltar atrás» era regressar aos barcelenses do Santa Maria. No clube da terra, onde se formaram promessas como Nelson Oliveira ou Hugo Vieira, Nuno Sousa já tinha treinado em todos os escalões foi para coordenador da formação, antes de assumir o comando técnico da equipa principal.

A época passada, porém, foi atípica. Começou por levar a equipa aos oitavos-de-final na Taça de Portugal, onde foi eliminada pelo Nacional da Madeira, mas tudo acabou com a descida aos campeonatos distritais, na sequência de dificuldades financeiras.

Foi esse o clique que o fez parar e rumar à América prometida sem nada garantido e uma mochila como bagagem.

«Não penso em chegar à MLS. Quero voltar à II Liga para mostrar que tenho valor para treinar lá», confessa o técnico português, acrescentando que para já quer ficar um bom par de anos a viver nos Estados Unidos e a desfrutar de todas as oportunidades que o futebol lhe tem reservado.

«Desde que cheguei cá, tenho uma regra: aceito qualquer convite que surja para inaugurações de restaurantes, exposições, o que seja. Se me convidarem, eu vou lá estar. Estou aberto para falar com qualquer pessoa, no metro ou num café. Quero conhecer pessoas e aceitar desafios. Todos os dias vejo uma série ou um filme para melhorar o meu inglês. Deixei crescer a barba, para mudar o look. Esta experiência mudou-me muito», conta Nuno Sousa, para explicar a foto que ilustra o artigo. É trabalho de uma amiga da República Checa e sintetiza todas estas mudanças e a sua nova imagem de marca.

No Brooklyn, a dois passos de casa, encostado a uma «banheira» americana de quatro rodas, Nuno olha desafiante para o futuro…