Não há equipa igual. Caso arrebatador e único. Projeto revolucionário e patenteado pela Universidade Nova SBE. Pela primeira vez – dizem os livros – uma equipa ligada a um estabelecimento de ensino superior lisboeta saltou das ligas universitárias para os campeonatos oficiais.

A Nova estreou-se em 19/20 na III Divisão da AF Lisboa, ficou a um pequeno passo da subida de divisão e mantém-se esta época fiel às ideias dos seus mentores. Bernardo Paixão da Costa, um Team Manager que é muito mais do que isso, ou não fosse este projeto uma lição de determinação e camaradagem, conta ao Maisfutebol a origem da ideia e os passos dados até esta afirmação regional.

Bernardo é filho do conceituado realizador Jorge Paixão da Costa e um apaixonado por Desporto e Marketing. Tirou Ciências da Comunicação na Nova (claro!), fez um Mestrado em Gestão do Desporto em Coventry (Inglaterra) e a tese final no marketing do Benfica. O passo seguinte chegou em jeito de convite: «E se inscrevêssemos a nossa equipa da Nova nos campeonatos distritais?»

«Tivemos bons resultados nos campeonatos universitários. Chegámos ao Nacional e só perdemos nos quartos-de-final contra o ISCTE, por penáltis. No final dessa competição, o treinador [Pedro D’Oliveira] e o presidente da Associação de Estudantes na altura [Manuel Felgueiras] achavam que estava na altura de subir um patamar. O compromisso do grupo era gigante, havia muita qualidade e eles sentiram que estavam a desperdiçar tudo isso numa prova que só durava alguns meses. No final da época, em junho de 2019, fui convidado pelo Pedro para entrar no projeto», esclarece Bernardo.

Mentes dinâmicas, inquietas, guiadas por um código de honra apertado e uma certeza atada num nó de convicções. Jogar na AF Lisboa e manter uma promessa: só alunos e ex-alunos da Nova têm lugar no plantel.

«É essa a condição em que acreditamos e é aquilo que nos faz sentir diferentes. Tivemos uma exceção no ano passado, com o nosso guarda-redes suplente, porque efetivamente não tínhamos nenhuma alternativa. Este ano já tivemos outras opções para a baliza e esse guarda-redes deixou de integrar o nosso projeto.»

Os homens sonham, a obra nasce. Mas inscrever e gerir uma equipa de futebol numa liga distrital não é tarefa. Há uma logística pesada (campos para treinar, equipamentos…) e exigências financeiras incompatíveis com o mais puro e genuíno dos amadorismos.

O plantel da história temporada de 2019/20

«Eu, o Manuel Felgueiras (anterior presidente da Associação de Estudantes) e o treinador Pedro D’Oliveira começámos a ter reuniões. Pedimos à AF Lisboa informações sobre os critérios de admissão aos campeonatos distritais e avançámos. O projeto está mais ligado à Associação de Estudantes do que à Nova. Nós nunca tivemos nada garantido. ‘Ah, queremos isto e a Nova dá’. Nunca pensámos dessa forma», detalha Bernardo Paixão da Costa.

Para que a ambição fosse moldada e tornada real, o núcleo duro da equipa da Nova teve de socorrer-se de apoios. Eles foram surgindo com alguma naturalidade.

«O novo presidente da Associação de Estudantes comprometeu-se a dar-nos uma verba, mas disse-nos que teríamos de arranjar o resto. Felizmente atraímos a disponibilidade da Delta Cafés, que é até hoje o nosso parceiro principal. Na primeira época tivemos ainda uma marca de roupa jovem como patrocinador, agora temos uma empresa de suplementos desportivos. A direção da Nova SBE também se prontificou a ajudar-nos com alguma coisa.»

«Os jogos da liga universitária são as nossas competições europeias»

Um dos aspetos mais extraordinários deste projeto, além do estatuto absolutamente singular, prende-se com a fidelidade às raízes. Tanto na escolha de atletas (uma espécie de Ath. Bilbao no respeito pelo escudo identitário), como na preservação de hábitos passados. A Nova SBE inscreveu-se na AF Lisboa, sim, mas não abandonou o campeonato universitário.

«Isso funciona quase como as nossas competições europeias (risos), porque os jogos são a meio da semana. Ao fim-de-semana jogámos na III Divisão da AF Lisboa. Treinámos duas ou três vezes por semana, dependendo se temos um ou dois jogos», explica Bernardo. «Treinámos nos campos do Estádio Universitário e fazemos os jogos em casa no campo do Tires.»

A primeira temporada teve bons resultados e uma estreia emocionante com direito a entrada num palco marcante do futebol português. «Jogámos contra o Juventude Castanheira, na Taça da AF Lisboa. Ganhámos no prolongamento. Depois, no campeonato, o nosso primeiro jogo foi no mítico José Gomes e contra o Estrela da Amadora. Até me arrepio ao falar disto. Ganhámos 2-0 num estádio com bancada muito bem composta. Talvez com mil pessoas.»

A histórica estreia na AF Lisboa teve lugar na Reboleira

O projeto está sólido, mas o que sai do corpo dos responsáveis? Afinal, a Nova SBE não tem carrinha, não tem campo próprio e não tem sócio fidelizados por uma quotização.

«É verdade. O treinador leva as bolas, eu levo os equipamentos, os carros até cheiram mal. Temos uma parceria com uma lavandaria, enfim, temos as lutas normais de um clube distrital. Há quem ache que temos as coisas de mão beijada por sermos da Nova, mas é mentira.»

As despesas, insiste, são brutais. «Temos de pagar cerca de 350 euros para a organização de um jogo na nossa casa. Medindo as nossas necessidades, pedimos a cada um dos atletas 40 euros pela época. Mas dissemos logo isto, também: ‘quem não puder pagar, não vai deixar de jogar na Nova por causa disso’.»

«Queremos um congresso anual sobre futebol na Nova»

O que pretende a Nova SBE para o futuro? «Queremos ser bem sucedidos no distrital e podemos perfeitamente subir à II Divisão. Mas também queremos apostar na liga universitária e ser campeões nacionais. Além disso, temo o objetivo de oferecer bolsas de estudo. Não queremos privar ninguém de jogar nesta equipa só por não ter condições financeiras para isso», explica Bernardo Paixão da Costa.

O nome da universidade anda pelos campos da AF Lisboa e o dirigente acredita que a ligação pode crescer ainda mais. Mesmo na organização e divulgação de eventos e parcerias.

 

A festa no balneário do velhinho José Gomes

«Fomos à final da Taça de Cascais. É uma prova de pré-época e a final foi jogada no Campo António Coimbra da Mota, no Estoril. Fomos à final contra o Tires e perdemos 3-1. Enquanto projeto foi muito relevante jogar este torneio. Convidámos um professor e o diretor da Nova, quase para legitimar aos olhos deles o nosso clube. Estamos a representar a universidade, é justo que tenhamos melhores condições para a representar bem.»

Entusiasmado, e visivelmente conquistado pelo projeto, Bernardo acredita que os laços do futebol podem acometer outras consequências. «Queremos trazer para Cascais o Nacional Universitário e para a Nova um congresso anual sobre futebol.»

Para já, a Nova SBE prepara-se para mais uma época na III Distrital da AF Lisboa. O primeiro jogo é no início de outubro, contra o Operário. Estes meninos sabem bem o que querem.