Ninguém fez melhor que a Roma no arranque de uma temporada na Serie A e só a Juventus fez o mesmo, uma vez. Nove vitórias em nove jogos. Esta quinta-feira os «giallorossi» podem chegar às 10 vitórias e entrar de vez para a história do calcio. O ambiente em Roma é de euforia. E, lá no meio, o treinador Rudi Garcia, o grande rosto deste sucesso, procura manter os pés no chão. «Todos, mesmo em Trigoria, acham que o jogo com o Chievo já está ganho, mas acho que será o jogo mais difícil desde o início da época», foi repetindo o técnico francês.

Não é dizer pouco, uma vez que nestas nove jornadas a Roma já venceu a Lazio, eterno rival, já ganhou ao Inter em San Siro e já deixou pelo caminho o Nápoles. Por muito que Garcia procure arrefecer o entusiasmo, os números são impressionantes. Nestes nove jogos a Roma marcou 23 golos e sofreu um. 

O jogo do fim de semana passado em casa da Udinese é exemplar do momento que vive a Roma, um daqueles que podem fazer a diferença no fim das contas. Em Udine a Roma não tinha Francesco Totti, nem Gervinho. E jogou meia hora em inferioridade numérica, porque Maicon foi expulso. Rudi Garcia fez entrar o norte-americano Michael Bradley e quatro minutos depois ele fez o golo da vitória. É uma equipa em estado de graça a que igualou o melhor arranque de sempre da história da Serie A.

Isto não era nada óbvio no início da época. A Roma terminou a época passada em sexto lugar na Serie A, fora da Europa. Dois anos depois de ter sido comprado por um grupo de investidores norte-americanos, o clube não parecia estar a crescer. 

Mas as coisas mudaram. E começaram a mudar pela escolha do treinador. Depois das apostas falhadas em Luis Enrique ou no veterano Zdenek Zeman, a opção para esta época foi em cheio. Ainda que muita gente em Itália tenha torcido o nariz. O francês Rudi Garcia não era um nome sonante. 
A Roma até viu sair algumas das suas referências: Lamela para o Tottenham, Marquinhos para o PSG, Osvaldo para o Southampton, Stekelenburg para o Fulham. Mas reforçou-se, no deve e haver entre entradas e saídas até ganhou dinheiro, e as apostas de Rudi Garcia estão a revelar-se na mouche. Foi buscar o guarda-redes De Sanctis ao Nápoles, os defesas Maicon ao Manchester City e Benatia à Udinese, o médio Kevin Strootman ao PSV. E ainda a promessa sérvia Adem Ljajic à Fiorentina, mais Gervinho, ao Arsenal. 
Mesmo que em Itália não tenha sido muito valorizado ao início, Rudi Garcia já merecia crédito pelo que tinha feito com o Lille, que levou ao título francês em 2011. Filho de um antigo jogador espanhol que foi para França, jogar no Sedan, viveu futebol desde miúdo, ao lado do pai. Foi jogador, um médio ofensivo que começou no Lille, passou ainda pelo Caen e pelo Martigues, antes de acabar a carreira aos 28 anos, depois de várias lesões. 

Dedicou-se à carreira de treinador, que sempre lhe esteve no sangue. A imprensa francesa primeiro e agora a italiana recordam a história que conta a sua irmã, Sandrine, como aos 10 anos Rudi passava horas a organizar as suas equipas no Subbuteo, a experimentar diferentes tácticas. 

Na Roma, Rudi Garcia não só conseguiu encaixar as novas apostas como valorizou quem lá tinha. Antes de todos Francesco Totti, o eterno capitão, que renovou contrato, aos 37 anos, já no decorrer desta época. 

O francês mostrou cedo como sabe gerir sensibilidades. «Alguns jogadores precisavam de ser tranquilizados em relação à minha legitimidade. Acho que Totti não me conhecia. Mas os maiores às vezes são os mais simples. Foi com certeza o primeiro jogador com quem eu falei», contou Garcia ao «Le Monde». 

Garcia também soube valorizar Daniele de Rossi, que reencontrou a estabilidade e a regularidade que lhe faltavam no clube, ou ainda o jovem Florenzi, que é por esta altura o melhor marcador da equipa, com quatro golos.

Com uma defesa muito mais forte que a da época passada, que sofreu 56 golos na Serie A, um meio-campo liderado por Strootman, que estava na mira de outros grandes de Itália e está a superar todas as expectativas em Roma, ele que já estava na mira de outros grandes de Itália, e um ataque versátil, Rudi fez da Roma uma equipa sólida, solidária e que, sobre tudo isso, respira auto-confiança. «A força da minha equipa é o facto de acreditar em si mesma», diz. 

E vai gerindo o plantel, com um discurso motivador mesmo para quem não joga. «Os jogadores que estiveram no banco hoje sabem que podem ser titulares amanhã, é por isso que os meus jogadores estão sempre prontos», disse no final do jogo com a Udinese. 

De caminho, conquistou Itália. Desde logo porque chegou a falar italiano. Mas também quis que os jogadores estrangeiros o fizessem. «Sei de onde venho. A integração é importante. Falar a língua é um sinal de respeito pelo país que nos acolhe», diz o homem que foi filho de emigrante em França. 

Hoje, Garcia é uma unanimidade em Itália. É o homem de quem se fala, e que já colocam ao nível do treinador estrangeiro que fez a diferença no calcio nos últimos anos. José Mourinho, pois claro, que em 2010 levou o Inter a ganhar a Liga dos Campeões.

Antes do jogo com a Udinese a «Gazzetta dello Sport» entrevistou Benatia e perguntou-lhe se se podia comparar Garcia a Mourinho. «A comparação é válida», respondeu o marroquino: «Ambos são bem parecidos, jovens, gerem bem as conferências de imprensa e são próximos dos jogadores. Sabíamos que amava o futebol e percebemo-lo logo na pré-época. Em vez de corrermos como loucos, como acontece com frequência em Itália, trabalhámos muito com bola. E hoje temos a equipa que gere melhor a bola.»