A exatamente um mês do arranque do Mundial-2014 (será a 12 de junho, no Arena Corinthians, em São Paulo, com um apetitoso Brasil-Croácia), este novo capítulo do «Mundo Brasil» será dedico a Henrique, a maior surpresa das escolhas finais de Luiz Felipe Scolari para a Copa.

Na lista dos 23, alguns nomes fortes ficaram de fora: Kaká, Ronaldinho, Robinho, Lucas Moura ou Lucas Leiva, por exemplo.

A questão do quarto central era uma das que estavam em aberto. Se Thiago Silva e David Luiz são dupla titular indiscutível, e Dante, do Bayern, era aposta quase certa para «terceiro elemento», o quarto central gerava dúvidas: seria Dedé? Miranda? Talvez Marquinhos?

Nada disso: Felipão optou por Henrique, jogador que conhece bem dos tempos do Palmeiras, mas que tinha estado um pouco afastado das convocatórias do escrete.

Surpresa? Em parte, mas não por completo se olharmos para aspetos como o grupo, o espírito coletivo e o conceito de «seleção família», tão caros a Scolari.

Surpresa... ou nem por isso

A jornalista Jessica Corais, especialista em futebol brasileiro, aponta, em análise à Maisfutebol Total: «A chamada de Henrique era uma surpresa até dois dias antes da convocação. Depois, quando o Felipão divulgou que poderia haver uma novidade começou a especular quem seria e o nome do Henrique foi ganhando força.» 
 
E o que terá levado, então, a essa surpresa? «O Felipão é um técnico que preza muito o grupo e sempre gosta de ter os seus jogadores de confiança. O Henrique encaixa-se exatamente nisso. É um jogador que o Felipão adora, pois justamente comandou o Henrique na passagem dele pelo Palmeiras e talvez ganhou ainda mais o técnico com apenas um único gesto. Atuou com febre na final da Copa do Brasil ganha por Felipão no clube, em 2012, e foi um dos melhores em campo naquela ocasião. Talvez este gesto tenha conquistado ainda mais o treinador do Brasil. Ele sabe que Henrique daria tudo que pudesse pela seleção.»

Neste sentido, Jessica Corais considera que Henrique pode «ser um jogador de confiança de Felipão, um jogador muito unido com o seu grupo e que não trará problemas extra campo.»

Scolari não teria outras opções mais cotadas para quarto central, como Dedé, Marquinhos ou Miranda? Jessica Corais observa: «A nível técnico sim, em determinados momentos eles foram melhores que Henrique, mas para o Felipão não basta só nível técnico. Também é preciso ser de sua confiança, ter mostrado serviço enquanto foi convocado pela seleção. Terá sido isso que determinou a escolha».

Trunfo número um: a confiança 

Na mesma linha, Miguel Lourenço Pereira, co-autor do livro «Noites Europeias», comenta à Maisfutebol Total: «Não surpreende. O Brasil tem excelentes centrais mas uma dupla de intocáveis e o perfil do quarto defesa é sempre o de fazer grupo. Henrique é um jogador que Scolari conhece pessoalmente do Palmeiras, sabe avaliar o seu caráter e o que pode trazer ao grupo. É um homem de confiança. Estreou-se pelo Brasil há seis anos e de certa forma teve de cumprir uma «via crucis» para voltar, com um enfrentamento «futebolístico» com Guardiola e um acidente de viação. É um prémio para um futebolista muito criticado, que estará eternamente agradecido a Felipão e isso, para o selecionador brasileiro, conta muito.»

Trunfo número dois: a polivalência

Miguel Lourenço Pereira também concorda com a visão de que haveria, no plano técnico e tático, opções melhores para quarto central: «Pessoalmente acho que há melhores centrais que Henrique. É um jogador que cumpre, taticamente disciplinado e que raramente compromete. Tanto Luisão como Dedé ou Miranda, sobretudo ele, faziam mais sentido se fossemos pensar que Scolari chamaria os melhores. Mas não fez. Scolari acredita num onze forte e em três ou quatro alternativas de bom nível. O resto é família, grupo e não quer ter jogadores a fazer sombra aos seus titulares. Ter um Lucas Moura, um Robinho, um Kaká ou um Ronaldinho era ter um problema diário que gerir. O mesmo acontece na defesa. Com a época de Miranda ou Luisão muitos iriam exigir a sua titularidade. Com Henrique isso não sucede. Vai fazer número, vai ajudar o grupo e é esse o principal objetivo da sua convocatória!»

Mas além do já explicado trunfo da «componente família», há a polivalência. Miguel Lourenço Pereira aponta: «O Henrique pode também ajudar na esquerda». No Nápoles, em poucos meses, já foi central, médio-defensivo e lateral-direito.

Essa multiplicidade de funções é trunfo em escolhas finais para uma lista de 23, embora uma consulta pelas possibilidades deste Brasil para a zona central do meio-campo (Paulinho, Luiz Gustavo, Hernanes, Ramires, Willian) torna difícil sequer imaginar que Henrique venha a ser utilizado a meio-campo na Copa…


VEJA O GOLO «À VAN BASTEN» DE HENRIQUE NO NÁPOLES:



Com 27 anos, Henrique tem percurso sólido, mas também já um pouco acidentado, no futebol brasileiro.
Em junho de 2008, de meio ano em destaque no Palmeiras, o Barcelona adquiriu o seu passe. Mas o central brasileiro nunca teve oportunidade em Camp Nou. Foi cedido ao Bayer Leverkusen, afirmou-se na Bundesliga como um dos melhores centrais, depois experimentou novo empréstimo, no Racing Santander. 

Ainda no âmbito do contrato com o Barça, teve um terceiro empréstimo, mas ao Palmeiras, num regresso ao futebol brasileiro que viria a ter sucesso (ajudou a equipa a subir da Série B para a Série A e a vencer a Copa do Brasil, em 2012).

Essa segunda passagem pelo Verdão terá sido fundamental para a presença de Henrique na Copa-14: Scolari, treinador do clube paulista no triunfo da Taça do Brasil, ficou fã do estilo empenhado e coletivo de Henrique.

Chegou até a falar-se num certo «estilo Guardiola» de Henrique no Palmeiras.

Este vídeo mostra um pouco isso:




Os meses no Nápoles

O bom ano de 2013 de Henrique no Palmeiras permitiu-lhe, recentemente, um regresso pela porta grande ao futebol europeu.

Transferido para o Nápoles, por quatro milhões de euros, na janela de inverno, rapidamente se firmou no conjunto de Benitez.

O golaço «à Van Basten» que acima lhe mostrámos foi numa partida com o Catania, a 26 de março passado, e dá conta de que Henrique é mesmo um central dotado, com características que lhe garantem uma polivalência que é cada vez mais importante no futebol de hoje. 

Pela equipa napolitana, Henrique defrontou, também em março passado, o FC Porto, nos quartos de final da Liga Europa (atuou os 180 minutos da eliminatória e levou amarelo aos 52 do encontro em Itália).

A estreia com Dunga

A curta experiência de Henrique no escrete começou com Dunga, num amigável frente à Suécia, em 2008, em partida que assinalou os 50 anos do primeiro título mundial do escrete. 

Ainda em 2008, atuou na derrota do Brasil frente à Venezuela, por 2-0, em jogo em Boston, EUA, realizado em junho.

A terceira chamada só aconteceria dois anos e um mês depois, já com Mano Menezes, quando Henrique atuava no Santander, em partida com os EUA.

Já de volta ao Palmeiras, Henrique foi convocado frente à Argentina, em setembro de 2011, em jogo no qual Mano só podia chamar atletas que representavam clubes brasileiros.
 
Nova ausência longa do escrete, até que o bom trabalho de Henrique no Verdão viria a ser premiado por Scolari, que o chamou a 16 de abril de 2013, para o jogo com Chile, no Mineirão, realizado a 24 de abril do ano passado (viria a render Dedé ao intervalo, no empate 2-2 do escrete).

Apesar desta chamada em abril do ano passado, causou estranheza a opção de Scolari de colocá-lo no grupo final dos 23 para a Copa como «quarto central».

Mais do que jogar, talvez Scolari esperará ter em Henrique um aliado no balneário. Basta ler o que Felipão respondeu quando, na conferência de divulgação dos convocados, apontou: «O Henrique é um jogador que confio. Gosto do futebol dele.»

B.I.

HENRIQUE
Henrique Adriano Buss
Idade: 27 anos
Data de nascimento: 14 de outubro de 1986

Naturalidade: São Paulo, Brasil
Altura: 1,85 metros
Peso: 75 quilos

PERCURSO 
Posição: Defesa-central
Percurso: Coritiba (2006/2007), Palmeiras (2008), Bayer Leverkusen (2008/09, cedido pelo Barcelona), Racing Santander (2009/11 cedido pelo Barcelona), Palmeiras (2011/13), Nápoles (2014)
Principais títulos: Copa do Brasil (2012), duas Série B do Brasileirão (2007, 2013), um estadual paulista (2008)

«Mundo Brasil» é uma rubrica que conta histórias das experiências de jogadores e treinadores brasileiros que atuam ou já atuaram em campeonatos espalhados pelo globo