Tirar proveito da prata da casa é reduzir a necessidade de ir ao mercado, mas Luís Branco, scout do Sporting, deixa claro que a estratégia leonina passa por aumentar o peso da formação na equipa principal.

«Se o trabalho for muito bem feito na formação, a necessidade de ir ao mercado externo é muito menor. Tivemos onze jogadores da formação na equipa campeã, e na próxima época queremos estar sempre a aumentar esse número. Se formos buscar menos jogadores também o risco de insucesso é menor», explica o responsável leonino, um dos oradores da conferência Global Football Management, realizada no Estádio da Luz.

Mesmo quando há necessidade de contratar, o ideal é que os reforços estejam ainda em início de carreira, para que a relação entre custo e potencial seja rentabilizada.

«Hoje em dia é muito difícil ir buscar jogadores mais tarde, já implica mais custos. Quanto mais cedo, melhor. Desde novo que começa a beber da cultura do Sporting, a ficar mais identificado com o processo. Cria uma identidade Sporting desde muito cedo. A probabilidade de sucesso futuro, na equipa principal, é muito maior se tiver essa fidelização desde jovem», acrescenta Luís Branco.

E qual é a cultura Sporting? «É uma cultura de jogo positivo, de jogador preparado para o alto rendimento, assente em valores pessoais. Temos um lema na Academia que é: «formar homens íntegros na vida e no campo», revela.

Na missão de encontrar talentos que encaixem nas necessidades da equipa, Luís Branco destaca a necessidade de um clube definir a sua geoestratégia, já que não é possível estar em todo o lado, mas realça também a importância de «projetar o jogador no contexto do clube». «Pode ser muito bom, mas não servir para nós», adverte.

Quanto mais consolidada estiver a estratégia do clube, mais fácil será encontrar peças que encaixem no puzzle, mas o scout leonino admite como inevitável que isso esteja sempre algo dependente das ideias do treinador, que a dada altura pode mudar.

«É o risco que se corre no scouting. A tendência, hoje em dia, é existir também um scouting de treinadores, dentro da estratégia do clube. Nós procuramos valorizar jogadores, sobretudo aqueles que foram formados na Academia. Na época passada tínhamos onze, e queremos aumentar esse número. Definimos o modelo centrado no jogador, recentemente premiado pela Associação Europeia de Clubes, e é um projeto assente no desenvolvimento do individual dentro do coletivo. Reúne áreas como técnica, tática, física, científica. Tentamos formar jogadores preparados para a exigência do futebol profissional, e queremos aumentar esse número. Se conseguirmos fazer esse trabalho cada vez mais cedo, o risco de insucesso será menor, pois o atleta já estará identificado com o clube. Isso está relacionado com o olhar de uma forma mais positiva para a formação, que tem a ver com o treinador, mas inerente à estratégia do clube», explica.

De Aurélio Pereira ao reconhecimento dos scouts

Questionado sobre a importância dos números na avaliação de jogadores, Luís Branco diz que tem vindo a ganhar importância, ainda que «alguns clubes sejam céticos». «Não os podemos ignorar, mas não podemos ficar agarrados a isso. Se não tivermos cuidado ao interpretá-los, pode ter o resultado oposto. Sou a favor da sua aplicação, mas é preciso perceber o que dizem os números. É importante como filtro inicial, para categorizar jogadores», defende.

O scout leonino destaca ainda a importância de ver para além do que é feito em campo, e de tentar recolher o máximo de informação possível para traçar o perfil do jogador.

É também por aí que surge o elogio a Aurélio Pereira, pela «capacidade para olhar para a forma de jogar, mas também para a relação humanizada, como se viu quando trouxe o Ronaldo da Madeira, com 12 anos». «É o meu mestre. Aprendo muito com ele, até em conversas de café», refere.

Luís Branco lamenta que o trabalho de scout ainda não seja uma profissão reconhecida, pelo que uma pessoa «pode começar por qualquer lado e conseguir entrar», mesmo que não tenha nada a ver com futebol, mas destaca os passos dados recentemente pela Federação Portuguesa de Futebol.

«Foi lançada agora a primeira edição do curso de scout. Era importante a federação ter essa iniciativa, pois há várias empresas privadas que dão essa formação, e é importante existir essa regulação», refere Luís Branco, que tirou um curso de Gestão Desportiva e que, para dar início à carreira de scout, chegou a trabalhar como freelance.

«O conselho que posso dar a quem quiser tornar-se scout é muito estudo, muito conhecimento do mercado, e ir atrás. É difícil entrar nos clubes, mas costumo dizer que, se alguém que está a começar tiver oportunidade de ir para adjunto de um clube pequeno, que vá. O importante é entrar», afirma.