A proteção dos jogadores portugueses foi um tema abordado por vários leitores nas perguntas dirigidas ao selecionador nacional. Às ideias lançadas para promover maior utilização de jogadores portugueses, Fernando Santos responde com pistas sobre o trabalho que a Federação está a fazer nesse sentido, admitindo que é uma questão central. Lembra como a experiência do passado fez crescer grandes jogadores como Rui Costa, Fernando Couto ou Jorge Costa e aborda abertamente várias questões ligadas a este tema. Fala da política dos clubes, de empresários e de opções de carreira, dá exemplos como o de Danilo Pereira e desabafa: «Se me perguntam o que acho, por mim deviam ser obrigatórios seis ou sete jogadores portugueses por equipa.»

Perguntas

Admite começar a trabalhar com a Federação no sentido de criar regras que protejam o jogador português, à semelhança do que já fizeram países como Espanha ou Itália?
Vítor Dias, Aveiro


O que acha do facto de muita das vezes os nossos clubes «grandes» jogarem com jogadores estrangeiros e preferirem emprestar o vender jogadores jovens e portugueses, muito das vezes com talento igual o superior (exemplo Bernardo Silva)? Para a nossa seleção não seria melhor impor uma regra com um mínimo de 5 jogadores portugueses por equipa nos jogos de I e II Liga?
Patrick Moreira


Fernando Santos

«Se calhar era melhor impor um mínimo de jogadores portugueses, mas é preciso que se aceite. Legalmente, há um condicionalismo que é a lei Bosman. Toda a gente esquece isto. É preciso perceber que, no futebol, estrangeiros são só aqueles que são fora da União Europeia. Isso é uma confusão. Muitas vezes se diz que há muitos estrangeiros, mas eles para o futebol não são estrangeiros.

(A UEFA contornou a questão através das quotas mínimas)

Em Portugal também existem alguns mínimos. Neste momento na Federação há um grupo de trabalho a trabalhar fortemente empenhado em procurar soluções. Agora, não conheço uma forma de imposição. Para impor é preciso que legalmente isso seja possível. Nós estamos a trabalhar em várias áreas que vão desde a formação a outras logísticas do futebol, mas o que estamos a procurar é criar um documento de consenso que na realidade possa ser aceite. Criarmos uma coisa e dizermos «Vai ser assim», mas depois toda a gente dizer que não, não vai servir para nada. É preciso criar algo de consenso. É um trabalho dirigido claramente à proteção dos jogadores portugueses.

Estamos a criar documentos que depois vão ser debatidos publicamente até pelos clubes, porque é muito importante a participação deles também, de encontrarmos formas até de premiar aqueles em que a utilização de jogadores da sua formação possa ser mais contínua. E muitas vezes não tem que ser nos próprios clubes imediatamente.

Se se lembram, um dos grandes trunfos do futebol português no passado passava muito por aquilo que hoje em dia se vê menos. De alguma forma as equipas B vieram ajudar um bocadinho, não totalmente. No passado era muito comum nas equipas grandes emprestar jogadores a equipas do mesmo escalão, mas mais baixas. Podemos falar se calhar de duas mãos cheias de grandes jogadores, ou mais, de grandíssimos jogadores portugueses a quem aconteceu isso. Desde Rui Costa a Fernando Couto, Jorge Costa, por aí fora. Nessa época era assim que funcionava e isso era muito útil.

Hoje é mais difícil, não sei porquê, perdeu-se um bocadinho essa forma de rodar os jogadores, de haver uma primeira entrada dos jogadores ao nível destas divisões As equipas B ajudaram um pouco, mas a questão central está aí.

Depois há outro factor que nunca podemos controlar, o factor de quem maneja o jogador. Não sou contra os empresários. Não sou, sinceramente, porque têm um papel relevante e importante no futebol. Mas o que é que assistimos hoje? Jogadores que aos 16, 17 anos, se não forem postos a jogar imediatamente…

Dou exemplos que conheço. Não dou exemplos de nomes mas conheço alguns casos de jogadores a quem foi colocada a hipótese de serem emprestados a equipas da I Divisão em Portugal e não foi aceite. Preferiram sair para o estrangeiro. Alguns não jogam.

Há um exemplo muito interessante. É o caso do Danilo, que até é um miúdo com muita qualidade. Sabemos o que aconteceu há 3, 4 anos. Ele saiu do Benfica para Itália. Voltou depois mais tarde a um clube como o Marítimo. Se calhar era mais fácil se tivesse aceite logo ir para o Marítimo. Se calhar agora estava no Benfica.

Isto passa por questões legais e também por os clubes começarem também a pensar melhor esta questão. Agora, a Federação não pode fazer muito em relação a isso. Não pode chegar aos clubes e dizer: «A fórmula tem de ser esta». Isso nós não conseguimos fazer. Gostávamos. Se a pergunta é o que eu próprio acho, eu não tenho dúvidas em responder. Não acho que deviam ser cinco, deviam ser obrigatórios era seis, ou sete.
 
Também é preciso perceber que os clubes são empresas, vivem das suas receitas. Quer se queira quer não, os clubes, principalmente os grandes, precisam das receitas que vão buscar ao exterior, não só nas vendas de jogadores mas também nas receitas que conseguem nas provas estrangeiras. Se não tiverem jogadores para competir essa receita será sempre mais baixa. Também temos de entender aqui um pouco o lado dos clubes.

Agora, acho é que devíamos pensar um bocadinho a nível da II Liga, do CNS, alargar mais este espaço e procurar que esse possa ser um alforge de jogadores».