O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, salientou esta sexta-feira a «aposta» feita no projeto da seleção feminina, que se qualificou de forma inédita para um Mundial de futebol, tecendo palavras de elogio ao «papel da mulher na sociedade portuguesa» e àquilo que, olhando para o passado, quanto ao futebol no feminino, seria falar em «ficção».

«Este dia é um dia de luto e de pena por causa da guerra, que continua e queremos que seja ultrapassada, mas ao mesmo tempo temos alegrias, uma grande alegria que foi o vosso passo prestigiantíssimo para Portugal. Queria dar um abraço ao presidente da Federação, que fez uma aposta, à equipa que fez uma aposta, à equipa técnica que fez uma aposta, mas muito em especial a todas vós, à capitã, àquelas duas que marcaram os golos que nos deram uma felicidade enorme, a todas que marcaram golos, às antecessoras, foi uma equipa que funcionou muitíssimo bem», começou por dizer, no Palácio de Belém, ao início desta tarde.

«É uma honra para Portugal, um passo inédito, histórico, enorme, não apenas no futebol feminino, é no papel da mulher na sociedade portuguesa. Eu sou do tempo em que a mulher não podia ser diplomata, polícia, militar, juiz, em que a discriminação não era só como ainda hoje existe, no salário, nas condições de vida: é que não podia, nas coisas básicas, ter a atividade que tinham os homens e, falar em futebol feminino naquela altura, era falar em ficção. Nem o masculino conseguia ter aquele percurso que tem tido. O feminino não existia e hoje existe devido a muitas como vos, que fizeram um caminho difícil. É excecional. A sociedade portuguesa mudou e está a mudar e um dos aspetos fundamentais é mudar através do papel da mulher. Não mudou tudo, não. Se tivesse mudado tudo, quem estava a falar aqui, agora, era uma mulher e havemos de chegar lá, ter uma Presidente da República mulher. Mas o vosso passo é fundamental, mas como disse o presidente da Federação, isto foi ontem. Agora, interessa o amanhã», referiu, antes de apontar aos objetivos da seleção no Mundial… e até mesmo à «final».

«Já estive a ver o calendário e a preparar-me psicologicamente para o que vai ser o trabalho de milhões de portugueses, a começar logo com a Holanda, temos de ganhar à Holanda. Depois o Vietname, que deve ser mais fácil, mas nunca se sabe. Depois os Estados Unidos, nunca se sabe, eles têm evoluído e em termos de futebol feminino são inesperados. E depois continuamos, não paramos. Começa em julho, mas continua. Obriga a reprogramar a vida de milhões de portugueses, que vão ter de passar as noites a ver futebol, em vez de durante o dia, ver durante a noite, é um bom exercício. E lá estaremos no primeiro jogo contra a Holanda e depois vão avançando, dá para ter vários compromissos pelo meio e culminar já em agosto no momento fundamental da final. A ambição tem de ser essa, foi assim que lá chegaram, sonharam que era possível e chegaram, agora tem de ser possível sonhar com o mais longe e o mais longe é a final, é isso que têm de sonhar, é isso que os portugueses vão sonhar, que as portuguesas vão sonhar. É uma grande vitória dos portugueses, mas sobretudo das portuguesas», disse, ainda, terminando com uma palavra para o selecionador Francisco Neto, que se ligou à cerimónia à distância, a partir da Nova Zelândia.

«Muito obrigado por esta alegria, muito obrigado àquele jovem que era difícil de encontrar, liguei-lhe não sei quantas vezes e não o encontrava [Francisco Neto]. No vosso caso, não é um grande abraço, é milhares de beijos que vou concretizar. Não milhares, porque não posso dar os beijos que os dez milhões de portugueses dariam. Neste dia, que é um dia triste por outras razões, houve um raio de sol que entrou na nossa vida e esse raio foi o vosso passo, a vossa vitória, a vitória de Portugal», concluiu.

Fernando Gomes lembra «dificuldades» que as atletas tiveram no passado

Antes de Marcelo Rebelo de Sousa, o presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Fernando Gomes, discursou e lembrou as dificuldades que as jogadoras tiveram, não só nos 13 jogos da caminhada até ao Mundial, como também a nível estrutural ao longo dos anos, nomeadamente nas condições de treino, que foram evoluindo.

«Foi um percurso difícil e têm mais do que razões para celebrar. As dificuldades não foram só 13 jogos que tiveram de disputar, com dez vitórias, que obviamente, desportivamente, foram muito difíceis, mas acima de tudo aquelas dificuldades que, como mulheres, tiveram de ultrapassar para se dedicarem à modalidade que tanto gostam. Os tempos em que começaram e que o futebol não era para meninas, em que as dificuldades para treinar eram imensas, as dificuldades que tiveram de passar para abraçarem a carreira que tomaram a decisão. Hoje, passado esse tempo e essas memórias, aqui estamos para celebrar de forma condigna o que concretizaram na Nova Zelândia. Um feito espetacular», salientou.