*Enviado especial a Turim

Falar do Sevilha é trazer à memória a internacionalização do Benfica: a formação espanhola teve o prazer de apadrinhar a estreia europeia de uma das equipas de maior sucesso no futebol internacional.

E vice-versa: o Benfica também apadrinhou a estreia do Sevilha.

Aconteceu a 19 de setembro de 1957, o Benfica perdeu em Sevilha 3-1 e empatou na Luz 0-0. Sim, é verdade, a estreia não foi feliz. Mas foi apenas o início.

Palmeiro era o capitão, fez o golo encarnado (o primeiro na Europa) e falou ao Maisfutebol sobre tudo isso. Antes de mais, o golo.

«Foi uma jogada que começou na direita, a bola chegou ao centro ao Coluna e ele abriu para mim na esquerda. Driblei o Campanaro e rematei alto para golo», recorda. «É um marco na história do Benfica que tem o meu nome, como tem o meu nome o Estádio da Luz: também fui eu que fiz o primeiro golo na Catedral.»

 

Palmeiro tem hoje 81 anos e guarda uma lucidez invejável.

«Fomos de manhã no autocarro do Benfica, que tinha pertencido aos Parodiantes de Lisboa. Quando entra na Catedral, ainda tem lá a imagem do autocarro». 

Sim, para Palmeiro o Estádio da Luz é sempre tratado por a Catedral.

«Saímos no mesmo dia do jogo de madrugada, foram para aí dez horas de viagem, almoçámos em Sevilha e ao final da tarde fomos jogar. Cansaço? Não, nada disso. Naquele tempo éramos mais fortes. Já estávamos habituados, fazíamos aquilo muitas vezes.»

As piadas de Mão de Pilão e a ignorância benfiquista

A viagem serviu para descontrair. Havia um massagista brasileiro, com alcunha de Mão de Pilão, que contava anedotas. «Além disso o Otto Glória preparava-nos muito bem psicologicamente. Estávamos preparados para tudo.»

Nesta altura é preciso fazer um parágrafo para falar apenas de Otto Glória.

«Só lhe posso dizer uma coisa: ele revolucionou completamente o Benfica, e até o futebol português. Fiz dois anos antes dele e seis depois dele. A partir da chegada dele ao Benfica, o futebol passou a ser diferente: técnica, táctica e mentalmente.»

Nesta altura regressa-se a Sevilha para dizer que, apesar das anedotas de Mão de Pilão e dos discursos motivacionais de Otto Glória, o Benfica não estava preparado para o jogo. Faltava tranquilidade, e sobretudo dimensão mental.

«Desse jogo ficou uma marca histórica para o Benfica, e para nós. Foi uma projeção para as dez finais europeias que se seguiram. Mas na altura não vimos a projeção que iria ter. Para nós era só mais um jogo como outro qualquer.»

Quando Palmeiro pediu ao árbitro para expulsar um jogador do Benfica

O jogo começou com o Benfica a entrar em campo com a bandeira do Sevilha e o Sevilha a entrar com a bandeira do Benfica. «Foi uma troca de galhardetes. Naquela altura havia um grande respeito pelo fair-play.»

Depois disso o Sevilha foi superior. A primeira parte terminou 0-0, no início do segundo tempo Pahuet marcou para o Sevilha, Palmeiro empatou, mas Antoniet e Pepillo deram a vitória ao Sevilha. No final do jogo Otto Glória haveria de dizer que o resultado foi simpático: o adversário teve oportunidades para mais.

«Eles tinham dois jogadores muito fortes. O Campanaro, um defesa que limpava tudo e saía a jogar, e o Pepillo, um avançado muito rápido.»

Ora falar de Campanaro obriga a trazer à baila outra história curiosa.

«No segundo jogo o Otto Glória meteu o Zezinho, que era um médio, como avançado para marcar o Campanaro e não o deixar sair a jogar. Eles pegaram-se e eu ao intervalo fui pedir ao árbitro para expulsar os dois. Era capitão, chamei um diretor para traduzir e disse que os dois tinham de ser expulsos. O Zezinho não nos fazia falta e queríamos o Campanaro na rua.»

Não deu para tanto, o Benfica empatou 0-0 e foi eliminado na estreia na Taça dos Campeões europeus. Desde então nunca mais defrontou o Sevilha em jogos oficiais. As duas equipas voltam a encontrar-se esta quarta-feira e Palmeiro espera que seja diferente: que o Benfica ganhe, claro.

Nas bancadas, a convite do Benfica, vai estar um adepto especial: Palmeiro, um nome incontornável na história europeia do Benfica.

FICHA DE JOGO
Estádio Nervion, em Sevilha
19 de setembro de 1957

Sevilha: Busto; Romero e Campanal; Valero, Herrera e Ramoní; Pepín, Antoniet, Iñigo, Pepillo e Pahuet.

Benfica: José Bastos; Ângelo e Serra; Calado, Cavém e Alfredo Abrantes; Palmeiro, Pegado, José Águais, Coluna e Fernando Caiado.

Golos: Pahuet (46m), Palmeiro (48m), Antoniet (59m) e Pepillo (79m)