Escolho 10 pontos positivos na Liga que terminou este fim de semana. Um campeonato com figuras maiores, e outras que vale a pena mencionar.
1. Jonas, MVP
34 golos aos 34 anos. O segundo título de melhor marcador seria suficiente para torná-lo figura maior da Liga 2017/18, mas ainda podemos acrescentar-lhe ao registo as seis assistências e todos os pormenores de classe que o tornam um dos melhores futebolistas a passar pelo campeonato português. O Benfica terá pago bem caro a sua ausência, sobretudo no clássico com o FC Porto, mas o goleador brasileiro ainda regressou a tempo de carimbar, de penálti, a qualificação para as eliminatórias da Liga dos Campeões, com muitos milhões à vista, numa eventual fase de grupos. Uma influência que está longe de ter igual por cá.
2. Bruno Fernandes a todo o terreno
Onze golos, quase todos de levantar o estádio, e assistências à beira dos dois dígitos. O médio chegou como internacional sub-21, e termina a época como possível trunfo de Fernando Santos para o Mundial de daqui a pouco mais de um mês. A oito ou a falso dez, assinou exibições de enorme qualidade, chamou para si a atenção dos grandes clubes europeus e carregou o Sporting às costas, com a ajuda a espaços de Gelson Martins e Bas Dost, durante praticamente toda a temporada. Excelente na meia-distância ou a assistir, poucos esperavam um rendimento tão elevado na época de estreia no campeonato. O seu futebol foi de Champions, e foi o resto da equipa que ficou um pouco aquém.
3. Marega no pódio
Depois de Jonas e Bruno Fernandes, Marega. Começou a época como suplente, aproveitou a lesão de Soares e não mais parou. O seu crescimento deve-se muito a Sérgio Conceição, que consciente das suas limitações pediu ao maliano aquilo que ele melhor lhe podia dar. Disponibilidade física, vertigem e uma confiança inabalável, que colheu frutos à frente da baliza, à medida que os encontros se acumulavam. 22 golos, 8 assistências e peça fundamental na engrenagem portista. A velha história do patinho-feio que virou cisne.
4. Rui Patrício
O melhor guarda-redes da Liga 2017/18. Mais exposto que Casillas, que até dividiu a época com José Sá, foi garantia de muitas vitórias do Sporting ao longo da época. Não merecia a infelicidade dos Barreiros nem a ingratidão ou sequer a pressão que lhe colocaram em cima nas últimas semanas.
5. Um furacão chamado Sérgio Conceição
Igual a si próprio. Foi o que mais ouvimos dizer durante a época quando se falou de Sérgio Conceição. E foi igual a si próprio que o treinador entrou na Liga, de peito feito, cheio de moral, disposto a atropelar quem se atravessava à frente. Era preciso coragem, e isso é coisa que não lhe falta. Há muito que o FC Porto assentava em 4x3x3 e numa filosofia de posse. Foi assim com Villas-Boas, Vítor Pereira, Paulo Fonseca, José Peseiro, Julen Lopetegui, Nuno Espírito Santo, se não quisermos ir mais atrás. Conceição trouxe a rotura: o seu FC Porto era agora um rolo-compressor, sempre objetivo e com transições curtas e velozes, feitas depois de uma pressão bem alta e agressiva, e potenciada pelo poder musculado de Aboubakar e Marega. Melhorados os problemas defensivos iniciais, os dragões estavam prontos para aproveitar a menor qualidade das defesas das equipas portuguesas e até chegar aos oitavos da Liga dos Campeões.
Para quem achava que o treinador tinha pavio curto, ou seja explodia com facilidade, Conceição geriu de forma exemplar os casos Aboubakar e Soares, sem deixar que se criassem danos colaterais, embora tenha sido mais difícil explicar a troca de Casillas por José Sá, deixando que transparecesse que podia ser bem mais do que uma decisão meramente técnica.
Soube também adaptar-se às circunstâncias: a entrada de Sérgio Oliveira para jogos mais difíceis e o desvio esporádico de Marega para a direita (Mónaco, e Alvalade, por exemplo), a profundidade de Herrera para exercer pressão na saída do rival (Vila do Conde), a gestão dos laterais à direita entre Ricardo e Maxi Pereira e dos avançados, quando os tinha todos disponíveis, com o acumular do cansaço, e a entrada a tempo inteiro de Sérgio Oliveira com a lesão de Danilo. A isto juntou a capacidade de elevar o rendimento dos jogadores até ao limite (quem mais para exemplificar do que o próprio capitão Herrera, ou mesmo Marega e até Brahimi), garantindo que a equipa reagia quase sempre bem às mudanças.
Depois, foi capaz de evitar espirais negativas. À derrota com o Besiktas, responde com a vitória no Mónaco, à goleada no Dragão frente ao Liverpool reage com nulo em Anfield, e às derrotas em Paços de Ferreira e Restelo, no pior momento da temporada, segue-se o triunfo no jogo do título, na Luz.
Por fim, soube falar aos adeptos, e estes também embalaram com a equipa para a festa.
6. A qualidade do Sp. Braga
O empate na Pedreira com o Boavista e a derrota a acabar em Vila do Conde, que deixaram a equipa a três pontos do pódio, não mancham a campanha do Sporting de Braga de Abel Ferreira. A excelente qualidade de jogo e o plantel muito equilibrado, que pode ainda ganhar mais qualidade no verão com um ou outro reforço cirúrgico, deixam água na boca para a próxima temporada, em que se espera que os minhotos dêem finalmente o salto que os coloque lado a lado com os grandes. Poderá não ser tão linear quanto isso, uma vez que também a estes é esperado o reforço que, em certa medida, faltou este ano, mas a consistência demonstrada na segunda metade da época, a que se junta já um ano e picos de trabalho, poderão ser óptimo ponto de partida para o próximo campeonato.
7. Ideias próprias em Vila do Conde e Chaves, e depois no Restelo
Não acho que haja um sistema melhor do que o outro, nem uma filosofia melhor do que outra. Acredito que devem ser valorizadas tanto equipas de contra-ataque ou de ataque continuado, desde que se adaptem na perfeição aos jogadores e sejam processos de qualidade. Posse só pela posse, ou transições sem nexo valem pouco. Assim, é de elogiar quando equipas que não os grandes assumem filosofias próprias e são bem sucedidas praticando-as. Já não é novidade em Vila do Conde, mas Miguel Cardoso reforçou ainda mais esse futebol associativo dos vilacondenses. O mesmo se passou em Chaves, com Luís Castro a semear, depois da passagem pelo Rio Ave, fundamentos semelhantes. As boas épocas de ambos os emblemas justificam a ideia de que equipa pequena não precisa de pensar pequeno, e ser hiperdefensiva, para ter sucesso e garantir os seus objetivos. O Rio Ave está perto de ir à Liga Europa, o Desp. Chaves ficou próximo. Também o Portimonense, com uma equipa de transições mas sem medo de nenhum adversário, realizou uma época tranquila. Sentiu-se nas três equipas inúmeras vezes o prazer de jogar à bola.
Deixo o Belenenses um pouco à margem. Silas chegou mais tarde e, além de tempo, precisa que a qualidade geral do grupo suba alguns patamares para também ambicionar a outros voos. Os primeiros sinais são positivos sobretudo no Restelo, com um ou outro brilharete, como o empate com o Benfica e a vitória frente ao campeão FC Porto, ou mesmo a réplica na derrota com o Sporting. Além de o próprio clube precisar de estabilidade, devido aos conflitos internos, também fica a ideia de que com mais qualidade o Belenenses conseguiria impor bem mais facilmente a nova ideia.
8. O trabalho de Hércules de José Couceiro
Ano muito complicado, e mais uma vez o homem certo para segurar as pontas. José Couceiro acaba de levar um Vitória de Setúbal em evidentes dificuldades financeiras, com uma equipa muito jovem e já depois de ter perdido o seu melhor jogador, Gonçalo Paciência, a um bom porto: a permanência na Liga. Lembrou que ficou pelos jogadores, e despediu-se. A sua imagem permanece intacta, apesar do evidente desgaste.
Também Pepa, no Tondela, e Jorge Simão, no Boavista, merecem referência melhoria nas prestações em relação a anos anteriores.
9. A genuinidade de Vítor Oliveira e Nuno Manta
Nuno Manta é um caso à parte na Liga, tal a simplicidade e cordialidade. Salvou, por duas vezes consecutivas, o Feirense da descida. É, com todo o mérito, o herói da casa.
Já Vítor Oliveira é um velho lobo. O bom Portimonense que montou, com um futebol descomplexado e de olho no golo, mostram o outro lado do milagreiro das subidas. O futebol português parece finalmente valorizar um dos seus treinadores mais experientes. O seu escalão, acredite ou não, é a Liga.
10. Os bons nomes que ficam (para lá dos grandes)
Nakajima e Fabrício, no Portimonense. João Novais, pela revelação, e Francisco Geraldes, mais consolidado, no Rio Ave. Em Braga, Paulinho, os irmãos Horta e Ricardo Esgaio. Matheus Pereira em Chaves. Joel no Marítimo, mas também Ricardo Valente. Lucas Evangelista à frente de todos, mas também Allano, Eduardo e Ewandro no despromovido Estoril. Hurtado, Raphinha até à lesão e Heldon no V. Guimarães. João Amaral e Edinho, mas também a irreverência de André Pereira, depois da saída de Gonçalo Paciência. Alfa Semedo no Moreirense, que também teve Tozé e Jhonatan. E alguns mais. Nomes que sublinham a qualidade do campeonato.