O balneário esta em silêncio. No quadro, o seleccionador rabisca três palavras. «Sofrer, lutar, desfrutar». Está dada a táctica para jogar em Wembley. Falta apenas uma lembrança. «Defender com concentração», grita David Rodrigo, seleccionador de Andorra.
A um canto, impressionado com o ambiente contemplado no aquecimento, está um jogador com fortíssima ligação a Portugal. Márcio Vieira, filho de emigrantes portugueses, nasceu no principado mas viveu no nosso país dos 12 aos 19 anos. Agora é internacional por Andorra e apresta-se a pisar uma das relvas mais míticas no mundo do futebol.
Apito inicial. 90 minutos (ou perto disso) a correr atrás da bola. Seis golos na baliza andorrenha. Apito final.

O argumento da partida é desinteressante, como se esperava. Andorra sofreu, lutou e desfrutou. Mas defendeu mal. Ainda na ressaca do mais belo jogo da carreira, Márcio desabafa ao Maisfutebol. Pousada na mão, a camisola trocada com Wayne Rooney.
«Ao intervalo estava chateado comigo. Sabia que podia fazer bem melhor. Na segunda parte joguei com mais confiança, tive a bola no pé e até fiz um remate. A bola saiu com força mas bateu no Lescott.»
«Tenham calma se não a coça ainda é maior»
Esta foi a quarta vez que Márcio defrontou a Inglaterra. Mas a primeira em Wembley. E isso faz toda a diferença. «Tenho jogado em grandes estádios com a camisola de Andorra. Old Trafford, St. Denis... não se comparam a Wembley», diz com um sorriso genuíno.
O médio de ataque parece ainda não ter acordado. Tudo lhe parece um sonho. A realidade, porém, é clara e há imagens televisivas a comprová-la: durante 90 minutos, Márcio pisou o mesmo relvado de alguns dos maiores craques do futebol mundial.
«Durante o jogo tive o privilégio de sentir o que esses craques vivem quase todos os dias. Antes de começar o jogo, no túnel, pedimos-lhes para jogarem com calma, senão a coça ia ser ainda maior. No final falaram connosco, foram ao nosso balneário e perguntaram como é a nossa vida em Andorra. Eles só queriam ganhar e acabar o jogo sem lesões, para aproveitarem bem as férias.»
A marcação cerrada a Rooney
Apesar de ter sido o melhor de Andorra em campo, o melhor movimento de Márcio foi feito sem bola. Ainda na primeira parte, confrontou Rooney e o inglês não escapou. «Garanti logo ali a camisola dele. Tinha pensado pedir ao Beckham, mas o tipo é menos acessível. Mas joga muito, sem dúvida. Na segunda parte também arranjei a do Bridge e dei-a a um colega meu que estava no banco de suplentes.»
Márcio ficou espantado «com os passes longos de Beckham», como reconhece, mas o que mais o marcou foi «a seriedade do Gerrard». «Já tinha acontecido no passado. Para ele tanto faz jogar contra Andorra ou o Brasil, está sempre no limite. Tem tudo de bom: é rápido, é forte, remata bem, nunca está quieto. O Lampard também é bom, mas marquei-o sem grande dificuldade porque é mais posicional.»