O pior Sporting da história - sete pontos em sete jogos, uma vitória, quatro empates e duas derrotas - só encontra paralelo numa outra equipa leonina: há 45 anos, em 1964/65, o então vencedor da Taça da Taças em título tinha por esta altura duas vitórias, dois empates e três derrotas.

À luz dos regulamentos atuais, somava oito pontos ao fim de sete jornadas. Mais um do que este Sporting. Foi uma época para esqucer, portanto, que terminou na pior classificação de sempre: o quinto lugar. Mas foi também uma época isolada e que veio imediatamente antes da curva.

No ano a seguir o Sporting foi campeão e interrompeu a hegemonia do Benfica nos anos sessenta. Carvalho era por essa altura o guarda-redes leonino, Pedro Gomes era titularíssimo na defesa e ambos coincidem num ponto de contato: Vercauteren precisa de ser um psicólogo.

«Fizemos uma época péssima», diz Carvalho. «Vínhamos de uma época desgastante e entrámos numa espiral de turbulência. Tivemos três treinadores, nenhum se afirmou e essa agitação passava para os jogadores. Éramos um grupo com qualidade, mas não o conseguia mostrar nos jogos.»

O Sporting era por essa altura um grupo semelhante ao anterior, ao tal que vencera a Taça das Taças. O treinador Anselmo Fernandez, porém, tinha sido trocado por Jean Luciano, depois voltou o mesmo Anselmo Fernandez, que acabou por ser substituído por Armando Ferreira.

Tudo mudou no ano a seguir quando chegou Otto Glória. «Era um homem respeitado, um treinador credenciado e que sabia falar connosco», conta Carvalho. «Passava-nos tranquilidade. Abraçava-nos e mandava-nos jogar à bola. Começámos a ganhar os jogos e acabámos por ser campeões.»

Ora Carvalho diz que essa época terrível encontra pontos de contato com a atual. «A bola queima nos pés: e olhe que eu sei bem o que isso é. Nesse ano, queria sair a jogar com os defesas e eles tinham medo de receber a bola. Pediam-me para chutar para a frente», conta.

Pedro Gomes e Carvalho são unânimes num ponto, de resto. «Este Sporting tem o melhor grupo de jogadores dos últimos quatro ou cinco anos», diz o primeiro. «O Sporting há muito que não tinha um grupo tão bom», adianta o segundo. «O problema é que não conseguem formar um coletivo.»

Pedro Gomes vai mais longe. «Eu gosto de fazer estatísticas durante os jogos. Sabe qual foi a percentagem de passes certos dos três médios do Sporting no jogo com a Académica? Menos de metade. Os três do meio campo tentaram fazer noventa passes e acertaram quarenta e dois.»

«Há jogos em que há alguma infelicidade, e o Sporting tem tido muita, mas o futebol praticado não tem organização nem planificação. A equipa é constantemente apanhada em contra-pé, dois ou três defesas contra três ou quatro adversários, não há ritmo, não há mudanças de velocidade, enfim.»

Ora por isso, dizem, Vercauteren tem de ser mais do que um treinador. «O próximo treinador tem de ser um bom psicólogo, tem de trabalhar bem mentalmente e tem de ser um líder», diz Pedro Gomes. «O Sporting tem de melhorar mentalmente para poder melhorar fisicamente», adianta Carvalho.

Pedro Gomes lembra de resto que raramente se vê um jogador do Sporting fazer um sprint, e às vezes lesionam-se quando o fazem: por exemplo Arias e Boulahrouz. Carvalho adianta que foi um erro começar a época com Sá Pinto depois da ferida aberta que ficou da final da Taça de Portugal.

O futuro pede tempo, carinho e mão firme: como fez Otto Glória há 45 anos. Franky Vercauteren não tem uma pré-época como teve o brasileiro, as perspetivas são mais pessimistas, mas não deve desviar-se do essencial. «Esta equipa precisa de sentir-se bem a colocar a bola não chão».

Pode o treinador belga ser esse psicólogo? «Eu acredito que sim», garante Carvalho. «Não o conheço, mas pelo que vi de declarações que ele fez, parece-me que percebe de futebol, domina os métodos de treino e reconhece a importância do trabalho psicológico. Estou com algum otimismo.»

Palavra de quem já passou pelo mesmo.