Seja na defesa ou no ataque, todos procuram o homem livre, mas não pelas mesmas razões. Guardiola quer encontrar soluções para que os seus jogadores cheguem ao golo. Outros querem encontrar maneiras de evitar que o adversário chegue ao golo. Simeone faz isso bem, por exemplo”, Xavi Hernández em entrevista à revista francesa SoFoot.
As palavras são de um dos principais rostos da história do Barcelona e que muitas batalhas travou frente ao Atlético de Madrid de Simeone.
De Simeone, sim. Porque há um antes e um depois da chegada do argentino aos colchoneros como treinador, um estilo próprio de estar e lutar e uma forma de atuar que levou o clube de Madrid a ombrear com Real e Barça, internamente e até mesmo na Europa.
Com El Cholo, a nível europeu, o Atlético de Madrid venceu uma Liga Europa, esteve em duas finais da Liga dos Campeões (ambas perdidas para o rival Real) e conquistou uma Supertaça Europeia. É, neste momento, um colosso europeu, que teve um percalço na fase de grupos da Champions.
A missão do Sporting antevê-se muito difícil e para isso basta olhar para a história de Simeone com o Atlético de Madrid nas competições europeias em jogos a eliminar: só duas equipas conseguiram eliminar o “seus” colchoneros e só uma equipa venceu a jogar no Vicente Calderón/Wanda Metropolitano em fases finais.
O Real Madrid eliminou-os por duas vezes, mas sem vencer na condição de visitante, e o Rubin Kazan eliminou-os por uma vez (Liga Europa em 2012/2013), tendo sido a única equipa a vencer na capital espanhola em todo este período de Simeone ao leme.
Os números falam por si e baseiam-se num xadrez que foi mudando de peças, mas manteve sempre os mesmos princípios: extrema organização defensiva, pressão intensa sobre adversário e exímia exploração da profundidade e do espaço vazio.
Para os que seguem o Atlético apenas em jogos com Real Madrid e Barcelona ou com colossos como o Bayern de Munique, o Cholismo pode apenas aparentar ser defender, faltas, defender, faltas… mas é muito mais do que isso.
Nesses jogos é verdade que a equipa de Simeone passa pouco tempo com a bola, mas não exaspera com isso. Aliás, sente-se confortável assim, sempre com o objetivo de manter a organização defensiva e explorar o ataque em poucos toques.
Para quem acompanha mais do que esses jogos terá a noção que a equipa de Simeone tem mais posse de bola que quase todos os rivais, sobretudo em casa, sabe o que pretende com ela, chega a asfixiar com a pressão que faz e concede muito poucas oportunidades, fruto de uma organização defensiva quase irrepreensível.
Esta época o "tendão de aquiles" até tem estado em algo que se diz ser um dos fortes da equipa: as bolas paradas defensivas.
Comecemos a análise pela base do processo…essa organização defensiva.
A organização defensiva e a importância de ... Griezmann
Griezmann é o jogador mais deste Atlético de Madrid, mas não é parte nula no trabalho tático e defensivo de Simeone. Aliás, na última pausa internacional, o francês referiu mesmo que “adora defender” porque El Cholo o ensinou.
Na saída de bola do adversário, Griezmann define a forma de pressionar, consoante o local da bola. Se a bola estiver no guarda-redes, o francês junta-se ao avançado (Diego Costa) e ambos marcam os centrais contrários.
Um dos médios (se Gabi jogar será ele) sobe no terreno, mesmo que signifique ir até à meia-lua contrária, e impede a saída pelo médio mais defensivo. O objetivo é que a bola seja batida longa e, por isso, os dois médios que ocupam as alas fecham dentro, ficando Saúl como pivot defensivo.
Se a bola for batida longa, Gabi recua e junta-se a Saúl, com Griezmann a ocupar o terreno do médio defensivo contrário. A equipa organiza-se num 4-4-1-1, com Diego Costa perto de um dos centrais.
A equipa fica assim organizada, com linhas bem juntas, e sem problemas em ir recuando até bem perto da sua área. Se o tal passe para trás surgir, Griezmann pressiona e Gabi sobe na pressão ao médio defensivo, com os restantes a reorganizarem-se perante esta pressão.
Há uma nuance fundamental no sistema defensivo de Simeone: o médio-ala do lado oposto à bola que ocupa posições centrais de equilíbrio.
Voltemos à saída de bola do adversário. Se esta for feita por um central, a equipa do Atlético vai tentar “obrigá-lo” a sair pelas alas, onde faz uma pressão com muitos homens, retirando as linhas de passe. A preocupação é sempre com cortar as linhas de passe, mesmo que isso signifique alguma liberdade ao homem da bola, que será cada vez mais pressionado para executar.
Se o adversário sair desta teia sem qualquer problema, a equipa de Madrid estabelece-se no 4-4-1-1, recuando a morder os calcanhares aos adversários, e sem problema de recorrer à falta.
O Sporting terá de jogar de forma rápida, tentar variar a bola para o flanco oposto, onde haverá espaço para carregar e ganhar metros. Só que…terá de ter atenção para não errar, já que um erro costuma ser letal. O Atlético tem muitos homens na pressão, juntos, e em caso de recuperação terá muitos a atacar a baliza e várias linhas de passe.
Há um problema que algumas vezes se nota no Atlético: nesta pressão constante pelo adversário direto, o lateral, sobretudo o direito, segue a pressão ao marcador direto até terrenos que não são seus e a desocupação dessa zona pode ser explorada. Correa e Vitolo não são tão fortes nessa leitura à direita, como Koke é à esquerda e o Sporting pode aproveitar.
Outra situação que o Sporting pode explorar é o momento em que consegue passar a primeira linha de pressão do Atlético, que é feita com muitos homens. Se os ultrapassar e jogar rápido, por exemplo com arrancadas de Gelson, poderá fazer mossa, ainda que os homens de Simeone recuperem rápido o esquema.
Na área, Bas Dost terá uma luta duríssima com Godín e Giménez (se recuperar) e uma barreira chamada Oblak para bater. A fragilidade que os leões podem encontrar, a nível de jogo ofensivo na área do Atleti, é a zona entre Godín e Lucas e as costas do recente internacional francês. O lateral, que substitui o lesionado Filipe Luis, é pouco agressivo e muito hesitante a resolver e atacar cruzamentos que vêm do lado direito da sua defesa.
Agora, Le Diable Griezmann ao ataque com o fiel escudeiro Diego Costa
Nem só de movimentos defensivos vive o Atlético de Madrid. O momento atacante começa logo no posicionamento defensivo e no conhecimento que os jogadores têm uns dos outros.
A equipa pode estar sem bola, em 4-4-1-1, mas sabe que mal a recupere Diego Costa estará a fazer movimentos em busca da profundidade. E que tanto resultado dão!
Muitas vezes caminha em busca do golo, numa correria sozinho com os rivais atrás, mas outras tantas os seus movimentos são suficientes para arrastar adversários e dar espaço a Griezmann ou a outros.
Em posse, o Atlético ocupa a região central do terreno com muita gente, com os médios-ala a jogarem por dentro e muitas vezes a pisarem o mesmo local, provocando superioridade numérica e confundindo marcações ao adversário.
O duplo-pivot, que deverá ser Gabi-Saúl, "pega" na bola de trás para depois a fazer circular, com Koke e o outro médio-ala/extremo (Correa ou Vitolo), a pedirem por dentro. Diego Costa fixa-se bem na frente, sempre disponível para movimentos de rotura, e Griezmann é um “vagabundo”.
Consoante o local para onde o Atlético leva a bola, os médios movimentam-se para lá, deixando todo o flanco contrário liberto para o lateral.
Dificilmente, em posse de bola, um jogador do Atlético de Madrid estará sem apoio de um colega e em lances de linha de fundo, normalmente estarão três para a construção da jogada: algo que facilita para decidir o desenrolar da jogada e para a tal pressão, já mencionada, em caso de perda de bola.
Algo típico do Atlético de Madrid é uma jogada em que aproveita as costas do central que joga pelo lado esquerdo. O responsável é Griezmann.
Para além do trabalho defensivo, invisível para muitos, Griezmann é um criador, mesmo sem bolas. Com ela, costuma desequilibrar, sem ela cria espaços para os colegas. Normalmente prefere cair para o lado direito, permitindo ao extremo jogar em terrenos centrais (quando é Correa, este junta-se muitas vezes a Diego Costa), e usando melhor o pé esquerdo.
Neste lance-padrão, Griezmann desposiciona o central e coloca a bola nas suas costas para as entradas do extremo-esquerdo (ou do direito) naquele espaço. Quando não coloca lá diretamente, Griezmann dá num médio que em posição frontal coloca lá a bola.
O Sporting terá ainda de ter cuidado com as subidas com bola em posse do Atlético, que quase sempre são feitas com muitos homens. Os laterais sobem quase sempre ao mesmo tempo, os médios-ala aparecem na área, assim como pelo menos um dos médios do duplo-pivot.
Na hora de cruzar há sempre várias opções.
Bolas paradas, um tendão de aquiles surpreendente
Esta temporada, o Atlético de Madrid marcou 81 golos, 16 deles de bola parada (19,75%). O registo não é assim tão famoso como muitos podiam prever. Mas há movimentos típicos e que já resultaram esta época.
Griezmann, quando não é ele a bater os cantos, posiciona-se várias vezes ao segundo poste…mas só após a cobrança. Ou seja, ou se junta ao guarda-redes e movimenta-se para o segundo poste para aproveitar segundas bolas ou “disfarça-se” na área para depois fazer o mesmo movimento.
Muita atenção ainda à agressividade de Godín e Giménez ao segundo poste (ora um ora outro).
Defensivamente, esta é a grande pecha dos colchoneros. Em 46 jogos, o Atlético sofreu um total de 26 golos, 14 (53,85%) destes de bola parada ou na sequência da mesma. E se pensarmos que dos 12 sofridos de bola corrida, 6 foram apontados pelo Sevilha…sobram poucos conjuntos que se possam gabar do feito.
E há dois problemas nestes esquemas.
O primeiro está relacionado com a cobertura do 1.º poste em pontapés de canto.
O segundo está na resposta dada após um corte inicial a uma bola parada (cantos, livres laterais ou mesmo livres diretos).
A equipa tenta subir de imediato, em bloco, só que por diversas vezes surge confusão nas marcações. Uns continuam marcações individuais e outros passam para a sua zona habitual no esquema defensivo de bola corrida, o que leva ao surgimento de jogadores soltos após nova colocação da bola na área. Aconteceu isto na última deslocação ao Villarreal.
A FIGURA: Antoine Griezmann
23 golos, 11 assistências: 41,97% dos golos da equipa têm a sua assinatura direta, mas há muitos outros em que lhe deviam ser dados louros. Mesmo com alguns arrufos com os adeptos, Griezmann, O Pequeno Diabo, segue comprometido com o Atlético e a prová-lo em campo. Francês é um "vagabundo" e Simeone dá-lhe essa liberdade ofensiva. Todos os cuidados serão poucos e basta o mínimo espaço para o camisola 7 desmontar uma defesa.