As meias-finais da Taça da Liga ficaram definidas na noite de sábado em campo, mas continuam na secretaria. Outra vez. Agora está em causa a diferença entre a hora de início do FC Porto-Marítimo e do Penafiel-Sporting. Um caso diferente, mais uma confusão a juntar a várias outras que foram marcando uma competição que vai apenas na sua sétima época mas já deu que falar por muitos anos.

A Taça da Liga nasceu em 2007/08, como uma terceira competição para os clubes profissionais, a juntar à Liga e à Taça de Portugal, por forma a criar um novo espaço competitivo que abrisse oportunidade a mais jogadores e também uma nova via de receitas para os clubes, uma série de pressupostos que recordou agora Pedro Barbosa, no Maisfutebol.

Quanto às receitas, a sua distribuição pelos clubes era uma das principais originalidades da Taça da Liga. A expectativa original apontava para que o clube vencedor pudesse receber até perto de um milhão de euros, sendo a distribuição progressiva ao longo das várias fases. Os pressupostos complicaram-se nos últimos anos. Primeiro no final de 2011, quando a proibição da Bwin em Portugal retirou o patrocínio da empresa de apostas à Liga, agora esta época, quando ficou pelo caminho um acordo da Liga com a Santa Casa para o patrocínio da prova.

Vários clubes têm levantado precisamente a questão dos prémios, no meio de um processo conturbado em relação à liderança da Liga, com um grupo de clubes a querer destituir Mário Figueiredo. O Sp. Braga abordou o assunto recentemente, questionando o valor que recebeu como vencedor da última edição. Mário Figueiredo garantiu no início de julho que tinha cumprido os pagamentos relativos à última edição da prova. Quanto a esta época, o Maisfutebol falou com António Fiúsa, presidente do Gil Vicente, que fez este ponto da situação: «Já recebemos o valor relativo à segunda fase, creio que os outros clubes também, falta esta terceira fase que terminou agora.» Os valores em causa rondarão os 20 mil euros, 30 mil euros para a terceira fase. O Maisfutebol contactou a Liga para obter mais informação sobre este assunto, perceber qual a verba em jogo e como é distribuída, bem como foi a distribuição nas épocas anteriores, mas não obteve resposta em tempo útil.

O futuro da Taça da Liga chegou a ser posto em causa no verão passado pela própria direção da Liga. Mário Figueiredo defendeu a sua extinção, com o argumento de que os clubes da II Liga tinham o calendário muito sobrecarregado, mas esta foi chumbada em Assembleia Geral.

E a Taça da Liga foi-se jogando. Teve até hoje três vencedores diferentes. O V. Setúbal venceu a primeira edição, o Benfica as quatro seguintes e o Sp. Braga a mais recente. Polémicas foram bem mais.

A edição 2008/09 foi uma sucessão de casos. Por causa dos regulamentos, e não seria a última vez.

Goal average, como em inglês?

Naquele tempo a terceira fase da prova tinha três grupos e apurava para as meias-finais o primeiro de cada grupo, mais o melhor segundo. FC Porto, Sporting, Benfica e mais quem? O outro semifinalista sairia do grupo do Benfica, onde V. Guimarães e Belenenses terminaram empatados em pontos. E aqui complicou-se. O regulamento da Taça da Liga falava em «goal average» como primeiro critério de desempate, recorrendo a uma expressão que já tinha caído em desuso. A Liga defendeu que a expressão queria dizer diferença de golos. Por isso, como a diferença entre ambos era igual (3-2 para o Guimarães, 2-1 para o clube do Restelo), aplicou o critério seguinte, maior número de golos marcados. O Belenenses entendia que a expressão devia ser lida de forma literal, média entre golos marcados e sofridos, e apresentou um protesto formal.

E o comboio por arrastamento

Por causa da queixa do Belenenses as meias-finais estiveram suspensas, o que gerou outro caso. O V. Guimarães seria o adversário do Benfica e o FC Porto, que devia jogar a meia-final com o Sporting a meio da semana mas tinha clássico com o Benfica para a Liga no fim de semana, ameaçou não ir ao jogo se o clube da Luz não jogasse na mesma data. Quando o Conselho de Justiça da Federação decidiu não dar razão ao Belenenses, o FC Porto avançou para Alvalade. Mas foi de comboio, no próprio dia do jogo. Lembra-se?

O penálti de Lucílio, a mão de Bento e a medalha de Pedro

Isto foi no início de fevereiro. A final chegou a 21 de março, no Algarve, entre Benfica e Sporting. E acabou em grande confusão. Os leões venciam até aos 75 minutos, quando Lucílio Baptista apitou para grande penalidade, assinalando falta de Pedro Silva sobre Di María. O Benfica empatou, levou o jogo para penáltis e venceu.

Ficou famoso o gesto de Paulo Bento de rotação da mão, que o então treinador do Sporting explicou depois na TVI, assim: «Tinha a ver com os quatro troféus que tínhamos ganho, com o quinto que queríamos ganhar, e com o facto de o campo estar a virar.»

Mas ficaria uma imagem mais forte dessa polémica. Pedro Silva recebeu a medalha das mãos de Pires de Lima, então representante do patrocinador e hoje ministro da Economia, mas em vez de a guardar lançou-a na direção do relvado.



«Que fique o árbitro com ela», disse o brasileiro no final. O árbitro viria a admitir o erro, quanto a Pedro Silva e Paulo Bento seriam suspensos mais tarde, o jogador pelo gesto e o treinador pelo que disse após o jogo.


Questão de idades

O regulamento da Taça da Liga deixou cair a expressão «goal-average», mas não ficou imune a controvérsia. Avancemos para a época seguinte. Novembro de 2009, Portimonense e Académica defrontavam-se na última jornada da segunda fase. O jogo foi interrompido por causa de um apagão e retomado no dia seguinte. Aos 90 minutos, com 0-0 no marcador, Litos fez uma substituição que pretendia valer ouro. Não pelo que tenha feito em campo o jogador que entrou. A troca foi de guarda-redes, saiu o veterano Pedro Silva, de 35 anos, e entrou o adolescente Sapateiro (19 anos).

Com esta mudança, o Portimonense pretendia aproveitar a cláusula do regulamento que determinava a menor média de idades como critério de desempate e levar a melhor sobre os dois rivais do grupo (o terceiro era o Rio Ave e acabaram todos com dois pontos, zero golos marcados e zero sofridos). A Liga deu o Portimonense como apurado.

Mas a Académica, então treinada por André Villas-Boas, protestou. Defendeu o clube de Coimbra que os regulamentos não diziam como devia ser calculada a média de idades, se no conjunto das partidas ou jogo a jogo. A Briosa defendia esta última via e Villas-Boas explicava que até tinha jogado com isso. A Académica acabou por ganhar a batalha e foi reintegrada na prova.

O caso das 72 horas

Se em termos competitivos a prova viveu a partir daí sem sobressaltos de maior, as coisas na secretaria voltaram a agitar-se há um ano. O caso das 72 horas, lembra-se? O V. Setúbal protestou o jogo com o FC Porto por os dragões terem utilizado Fabiano, Abdoulaye e Sebá, três jogadores que tinham representado a equipa B dos dragões menos de 72 horas antes. O Sp. Braga foi penalizado com perda de pontos na equipa B por situação idêntica com Emídio Rafael, mas tratava-se de jogos da I e II Ligas. O FC Porto alegou precisamente que os regulamentos eram omissos sobre a Taça da Liga e a justiça desportiva acabou por dar lhe razão.

Passou um ano. E Janeiro de 2014 volta a conjugar Taça da Liga com protestos e polémica. 

O Benfica-Gil Vicente e o Restelo

Antes do caso do atraso no Dragão, houve ainda outro. O Benfica, que está com problemas no relvado do Estádio da Luz, pediu à Liga para jogar o encontro da terceira e última jornada, onde recebia o Gil Vicente já apurado para a meia-final, no Estádio do Restelo. A Liga acedeu.

Mas o clube de Barcelos leu os regulamentos e considerou que, neste caso, o jogo devia ter passado a ser no seu terreno. Baseia-se o Gil no artigo 9 do regulamento da Taça da Liga, e na alínea que diz isto: «Quando um clube esteja impedido de realizar jogos no seu estádio, devido a aplicação de sanções desportivas ou disciplinares ou por razões de falta de condições do terreno de jogo, será o mesmo realizado no estádio do adversário.»

O Gil ameaçou não ir a jogo, mas depois acedeu a participar, por não querer «beliscar o crédito e a imagem do futebol português». A Liga não tomou posição pública sobre o assunto, tendo apenas uma «fonte» do organismo dito a à Lusa que o objetivo foi «salvaguardar os interesses dos intervenientes». 

2m43s depois, no Dragão

E depois chegou sábado à noite. FC Porto e Sporting, no mesmo grupo, chegavam à última jornada em igualdade pontual. Os dragões jogavam em casa com o Marítimo, os leões visitavam o Penafiel. Ambos os jogos deviam começar à mesma hora, mas quando começou o jogo em Penafiel, no Dragão ainda nada. As imagens mostravam as equipas perfilar e a cumprir os trâmites habituais antes do apito. O outro jogo levava 2m43s quando Manuel Mota apitou para o início do FC Porto-Marítimo. Não houve acerto ao intervalo e o jogo do Sporting chegou ao fim quando ainda se jogava no Dragão. Os leões tinham ganho 3-1, o FC Porto tinha acabado de empatar, 2-2. E já nos descontos ganhou uma grande penalidade que Josué converteu. 3-2 e o FC Porto apurado.

Houve protestos do presidente do Sporting na sala de imprensa e, dois dias depois, um comunicado dos leões a ameaçar «jogar com os juniores e os juvenis» na próxima época, se não fosse atribuída derrota ao FC Porto. Mais um caso na secretaria, para decidir se houve ou não atraso intencional e «doloso» por parte dos dragões.