A noite de sábado foi especial para José Ramos. Sportinguista de coração, o homem de 51 anos deslocou-se ao Municipal de Braga para ver o «seu» Sporting bater o FC Porto nos penáltis e conquistar a segunda Taça da Liga consecutiva, depois de no ano passado ter vencido o jogo decisivo ante o Vitória de Setúbal.

De repente, e quando a comitiva leonina já tinha erguido orgulhosamente o troféu, o coração de José – como tantas vezes – assustou-se e colocou um travão num dia que até aí tinha sido de festa.

Vice-presidente do núcleo de sportinguistas de Braga, José é portador de um Cardioversor Desfibrilhador Implantável (CDI) há onze anos. Muito resumidamente, e segundo explica ao Maisfutebol, um CDI é um dispositivo igual a um pacemaker que quando nota uma anomalia no coração, dispara um pequeno choque «para estabilizar».

«É só de três volts, mas é um choque dentro de nós que é muito agressivo, uma dor horrível. Depois quando sinto isso, aninho-me por precaução, para em caso de queda, o tombo ser menor», diz.

Ora, não contava José é que o primeiro médico a socorrê-lo, logo ali nas bancadas do recinto bracarense, fosse, nada mais nada menos, do que Frederico Varandas, presidente do Sporting. O dirigente verde e branco dirigia-se para o relvado, quando deu conta que algo não estava certo numa das bancadas perto da tribuna presidencial.

O adepto leonino desfaz-se em elogios ao líder do conjunto de Alvalade, mas antes aponta falhas à logística de evacuação do Estádio que acolheu a final four da Taça da Liga.

Foto: facebook de José Ramos

«Isso é o que eu quero que vocês falem, as condições de evacuação que eu tive foram surreais. O Sporting recebeu a taça por volta das 22h00 [altura em que José se sentiu mal] e eu só cheguei ao hospital perto das 23h30», começa por contar, antes de acrescentar mais pormenores.

«O presidente [Frederico Varandas] viu ali confusão, não sabia que eu era o A, B ou C, e foi ver o que se passava. Depois os médicos da Cruz Vermelha demoraram mais um bocado, mas conseguiram estabilizar-me, sempre com o presidente a acompanhar.»

Mas depois começaram os problemas: «Acho lamentável por exemplo que o presidente tenha tido de saltar uma grade para vir ter comigo. E a minha evacuação devia ter sido pelo relvado, estava lá uma ambulância, mas não, mandaram-me para a tribuna, tive de avançar quase com o meu próprio pé, ajudado pelos médicos.»

«Entretanto chamaram uma maca, mas o que é surreal é que a maca não cabia no elevador, portanto eu não conseguia subir nem descer», aponta.

José esclarece que tiveram de ir buscar uma cadeira de rodas para o transportar, o que «demorou mais uns minutos» e que obrigou ao uso de uma plataforma para fazer subir a cadeira pelas escadas para chegar à ambulância.

«A plataforma estava desligada e coberta por causa do tempo e o segurança [que ia ajudar na logística] nem lá apareceu. Os médicos pegaram em mim pela cadeira e subiram assim as escadas para me meterem na ambulância.»

Apesar de tantos contratempos, José lá conseguiu chegar ao hospital e estabilizar a situação. O susto, esse, não chegou para estragar a noite.

«Foi uma noite especial porque o Sporting ganhou, isso é o mais importante. O barulho sobre este caso, por causa de ter sido o presidente [a prestar auxílio]… a mim não me passa ao lado porque é o meu presidente, tinha estado com ele durante a tarde [no núcleo de sportinguistas de Braga]», revela.

«O presidente é sempre o presidente e estar ligado a ele, ainda por cima por causa de um salvamento, salvo seja, é, apesar de tudo, bom», acrescenta.

Apesar do problema cardíaco, o homem de 51 anos descarta deixar de ver os jogos do clube do coração, apesar de reconhecer que tem de se proteger: «É evidente que tenho de me resguardar, mas não posso [deixar de ver os jogos]. O que eu digo ao meu cardiologista é que isto já me aconteceu a trabalhar, no sofá… pode acontecer-me a qualquer altura, porque pode ser um acumular de stress, de muitas coisas. Mas é evidente que tenho de me resguardar.»

Foto: facebook de José Ramos

«Se o Sporting estiver a jogar e eu não souber o resultado ainda fico pior, fico com uns nervos malucos. Vejo muito mais descansado no estádio do que em casa. Sou um adepto normalíssimo de futebol. O que aconteceu no sábado não foi só por causa do jogo, já assisti a muitos jogos como aquele. Foi um descarregar de emoções, no núcleo também tivemos uma semana agitada», confessa.

Voltando à noite de sábado, José e o filho foram convidados ainda nesse dia para assistir ao dérbi ante o Benfica, no próximo domingo, na tribuna presidencial, e o adepto leonino não se contém nos elogios ao presidente Varandas.

«O Sporting tem um grande presidente, eu já disse isto: se calhar este presidente não merecia andar aqui no futebol porque é um homem com H grande, o Sporting realmente é um clube diferente», defende.

«É uma honra aceitar um convite do meu presidente, de estar na minha tribuna, e embora os motivos não sejam os melhores, é uma honra estar junto do Dr. Frederico Varandas. Ter sido o primeiro a assistir-me foi um grande gesto, isso é de louvar. Foi o seu instinto de médico que o fez saltar a vedação para estar ao pé de mim», atira.

A noite foi de festa, e nem mais um contratempo no coração de José o impediu de adicionar mais um dia na lista de memoráveis de leão ao peito. Próxima paragem é em Alvalade, no dérbi eterno frente ao Benfica, e com lugar privilegiado: a tribuna presidencial.

(Artigo originalmente publicado às 18:28 de 28-01-2019)