Dois pontapés na memória e uma vitória da nostalgia. Triunfo para tirar pó às Taças, recuperar as cadernetas de cromos, voltar a ligar o VHS. Ganhou o Famalicão em Paços de Ferreira. Um Famalicão perdido nos escalões secundários do futebol português mas com a alma que já o fez trilhar percursos nobres no futebol luso. Houve Taça na Mata Real e com mais estrondo do que seria possível adivinhar.
 
Impulsionado por uma enorme falange de apoio (foi quase como jogar em casa), o Famalicão agigantou-se e afastou o segundo rival de escalão superior nesta caminhada na Taça de Portugal. Já tinha vencido em Viseu, na segunda eliminatória, agora o nível de exigência era superior e a resposta foi à altura.

FICHA DE JOGO
 
Este Famalicão não tem o poderio da equipa que andou pela primeira Liga nos anos 90, claro está, mas os nostálgicos poderão tomar notas: está a ser feito algo de positivo num coletivo que até já penou nos Distritais.
 
A vitória em Paços de Ferreira premeia a alma e a vontade de um grupo dois escalões abaixo do pacense. É verdade que a equipa de Paulo Fonseca dominou todo o jogo, criou muitas mais ocasiões para marcar e ficou a dever a si própria outro resultado.
 
Mas ninguém esperaria que fosse diferente. O Famalicão jogou com as armas que tem, aproveitando a vantagem que caiu do céu logo aos dois minutos, num autogolo de Ricardo, depois de António Filipe, esta noite o guardião pacense, ter evitado que o remate de Éder Diego entrasse, segundos antes.
 
Os adeptos famalicenses, que, de tanta festa, até atrasaram o início do desafio pelos fumos que lançaram, tinham ainda mais motivo para celebrar. Galvanizaram a equipa e os jogadores perceberam bem a mensagem: era para dar tudo.
 
Mais Paços, claro: mas não era para ser assim?
 
Com os papéis bem definidos, aguardou-se a reação pacense. Os castores caíram, de facto, em cima do rival que praticamente não voltou a construir um ataque em toda a primeira parte, mas o critério a definir os lances andou longe do que seria de esperar. Mais: do que se pede a uma equipa que ocupa o sexto lugar da Liga.
 
Apenas as arrancadas de Edson Farías iam atormentando a defesa do Famalicão. Para o resto chegava Luiz Alberto, central batido e que se colocou quase sempre no sítio certo. Se falhasse, Murta tornava-se a última barreira.

Era evidente a melhor qualidade técnica dos pacenses, mas quando era preciso levantar-se do chão para tentar um corte falhado à primeira, ninguém superava os visitantes.
 
Paulo Fonseca arrasa jogadores
Famalicão já vê as meias

O Famalicão aguentou a vantagem até ao intervalo e fez o escândalo na segunda parte. Se tivera alguma sorte na forma como surgiu o primeiro golo, há todo o mérito (e alguma passividade pacense) no segundo, com Diogo Torres a finalizar bem após passe de Erik Diego. Estávamos no minuto 51 e o Famalicão ficava em posição invejável.
 
O resto do jogo não foi muito diferente do que tinha sido a primeira parte. Mais Paços, Famalicão a defender e a tentar a sorte num contra-ataque ou numa bola parada.

Esteve mesmo perto do terceiro, por duas vezes, com António Filipe a evitar o golo de Vítor Lima, na conversão de um livre, e João Pedro, no que seria um golaço, em chapéu, logo no minuto seguinte.
 
O Paços conseguiu marcar, num pénalti indiscutível, reduzindo por Urreta, mas não mudou o rumo traçado. Nem o cabeceamento de Seri, no último fôlego, que ficou a centímetros. Não era o dia do Paços. Era, isso sim, dia de matar saudades. Dia de futebol na rádio, cheiro a castanhas. Dia de ir ao cobrador enquanto se come uma bifana. Dia de bancadas de cimento. Dia de lembrar o futebol de outros tempos.
 
O Famalicão está nos quartos de final da Taça e, pelo menos por uns tempos, voltará a ser falado a nível nacional. Não foi melhor no jogo, dificilmente o seria. Mas merece. Pela alma, pela gente e pela fé.