Mosteiros, uma pequena freguesia do concelho de Arronches com cerca de meio milhar de habitantes, está a viver um momento histórico. A visita do Nacional da Madeira no próximo domingo ao Estádio Municipal Francisco Palmeiro, em Arronches, será o momento mais marcante da curta história de 30 anos do Futebol Clube Mosteirense.

A vida na Distrital, o habitat natural dos alentejanos, vai ser alterada por um jogo que de certeza se irá recordar por muito tempo. A eliminatória da Taça de Portugal frente ao Nacional está a mexer com jogadores, treinadores, dirigentes, roupeiros, massagistas, nada habituados a serem «assaltados» com entrevistas para a comunicação social nacional. Todos se riem com orgulho de verem o nome do clube nos jornais, de se perguntarem se é verdade tudo o que se está a passar.

Um conto de fadas? Nem por isso. Todos prometem «dar tudo» nos 90 minutos de domingo, uma oportunidade única de poderem mostrar o potencial que uma equipa da Distrital pode ter. Tudo farão para que as poucas hipóteses que reconhecem ter lhes permitam fazer uma surpresa. Trata-se da Taça, a competição onde os pequenos por vezes conseguem derrotar os grandes, em que os amadores tentam agigantar-se para vencerem os profissionais. São inúmeros os exemplos ao longo das 75 edições da prova rainha onde se ouviu o nome de «tomba gigantes». O Mosteirense tem essa ambição, a de «haver Taça» no próximo domingo.

Frente ao Nacional serão onze contra onze ficando de lado o facto de os alentejanos terem as suas profissões e que duas vezes por semana se juntam às oito horas da noite para treinarem. Durante 90 minutos, os amadores do Mosteirense serão o mesmo que os madeirenses, futebolistas. No plantel há carteiros, GNR, empregados de balcão, motoristas, vendedores, eletricistas, operários da construção, mediadores de seguros, desempregados. Mas a paixão pelo futebol é tanta que ninguém falta aos treinos no final de um dia de trabalho. Hora e meia a jogar futebol, a melhor forma de descontrair, de se abstraírem. Às dez da noite chegam a casa para jantar e descansar, pois no dia seguinte regressa a rotina.

«Jogadores estão ansiosos para mostrar a qualidade que têm»

Para o treinador, Jorge Moura, de 36 anos e carteiro de profissão, esta eliminatória tem «um sabor especial para a equipa técnica, jogadores, dirigentes, população do concelho e mesmo do distrito de Portalegre». Até à primeira eliminatória, onde foram derrotados pelo 1º de Dezembro, treinavam «três vezes por semana, mas o normal é serem duas sessões». Depois, houve a sorte da repescagem e a viagem aos Açores para defrontar o Sporting Ideal; momento em que «a equipa conseguiu juntar o útil ao agradável para conhecer a Ilha de São Miguel». «No jogo, correu-nos tudo às mil maravilhas, onde mostrámos o nosso valor», explica. Venceram por 2-0 e o sorteio ditou que o Nacional visite o Alentejo.

Para os 90 minutos do próximo domingo «ou mais, nunca se sabe, pois a bola é redonda», Jorge Moura revela a motivação dos seus jogadores. «Estão ansiosos que chegue o jogo para mostrar a qualidade que eles também têm.»

O Mosteirense é «um clube pequenino e da Distrital». «Mas há aqui gente que vai mostrar a sua qualidade». O realismo não sai do discurso do técnico, pois sabem das dificuldades que podem ter ao enfrentar uma equipa como o Nacional, «com jogadores que são profissionais e cujos ordenados de cinco ou seis pagam uma época completa do Mosteirense». «Não podemos errar, pois a qualidade deles pode aproveitar qualquer deslize que cometamos».

«Desfrutar o momento, mostrarmos a qualidade que temos e tentar adiar o mais possível o golo do Nacional», é o objetivo para o jogo: «Temos de ser realistas e sabemos que eles vão criar-nos muitas dificuldades.»

A tática está definida: «Defender muito bem e sairmos rápidos para o contra ataque aproveitando a qualidade dos nossos homens da frente.» «Se isto sair assim, nunca se sabe o que poderá acontecer». Desta vez e porque é a Taça de Portugal, o Mosteirense vai concentrar-se para almoçar. O técnico tem a certeza de que os jogadores «vão querer que passe depressa, mas há que ter calma» porque este é «um jogo diferente». «Temos de ter os pés bem assentes na terra.»

Não podemos pensar que por defrontarmos uma equipa da Liga chegamos aos jogos do Distrital e que o golo aparece mais cedo ou mais tarde». Jorge Moura confia totalmente no seu plantel, pois «são bons jogadores, excelentes pessoas e gente muito humilde».

Rosinha, o capitão de equipa, revelou «uma grande alegria» quando souberam que lhe «tocou o Nacional». «Mas estávamos na expetativa de que fosse um dos três grandes». Defrontar os madeirenses será «diferente, um jogo para desfrutar o momento, pois este vai ser um dos pontos altos da carreira.»

No domingo vão ser onze contra onze1, amadores contra profissionais. Para Rosinha, «os amadores vão encarar o jogo com a ilusão de serem profissionais», vão tentar «ver o jogo nessa condição». «Sabemos que vai ser difícil, mas vamos entrar com o espírito de vencedor, pois na Taça tudo é possível», garante o capitão.

«Temos de ter os pés bem assentes na terra»

Fernando Martins, o jovem presidente do Mosteirense com 31 anos, já está no cargo há sete. No palmarés, conta com duas Supertaças Comendador Rui Nabeiro, conquistadas nas duas últimas épocas, mas considera que «este é o momento mais marcante na história do clube».

O sorteio que ditou a visita do Nacional a Arronches «foi um misto de sensações» para o presidente do clube: «A alegria de defrontar pela primeira vez uma equipa da primeira divisão e a importância que isso tem para o nosso concelho». Mas Fernando Martins não deixa de ter um discurso realista: «Chegámos à 3ª eliminatória, temos de ter os pés bem assentes na terra e saber que as nossas potencialidades não nos permitem chegar muito mais à frente.»

Todos aguardam pacientemente pela hora do jogo. Fernando Martins é natural dos Mosteiros, trabalha em Arronches e ouve «o burburinho nos cafés, na Junta, na Câmara Municipal». «Só se fala do Mosteirense e isso é um orgulho», confessa.

A participação na Taça já rendeu 9 mil euros. Apesar de esperar casa cheia no domingo «os lucros da bilheteira, como são a dividir entre três, serão pequenos». «Os bares vão ser os que maior receita nos darão», diz o presidente contando a agitação dos últimos dias: «Não estou habituado a esta rotina de entrevistas. É a primeira vez, mas gosto e espero repetir.»

As dificuldades económicas de um clube pequeno como o Mosteirense são uma realidade e esta participação na Taça «garante alguma estabilidade», além de que «a tesouraria está salvaguardada com o trabalho que esta direção tem feito».

Em caso de vitória frente ao Nacional, os jogadores serão recompensados: «Vão ter um prémio de acordo com o que nós podemos e com o que sentimos que eles podem merecer, mas não o vou revelar». Os objetivos desta época estão bem traçados e o primeiro «era honrar a camisola na Taça de Portugal». A nível distrital, o presidente do Mosteirense não esconde «o desejo de conquistar a Taça da Associação», já que é um título que há duas épocas lhe «foge». «Em relação ao Campeonato, vou aguardar, pois temos de pensar jogo a jogo.»



O Maisfutebol fez duas perguntas aos entrevistados que deveriam responder com duas palavras. À pergunta do que é esta eliminatória, Jorge Moura respondeu «muito importante». Para o capitão Rosinha é «um sonho» e para Fernando Martins «um sonho histórico». A segunda questão foi o que é o Mosteirense. O técnico considera ser um «clube humilde». Rosinha, com um grande sorriso, disse ser «uma grande equipa». E o presidente Fernando Martins ambiciona «uma equipa na senda das vitórias».

Depois da eliminação na primeira ronda frente ao 1º Dezembro (1-4), quem diria que a repescagem para disputarem a 2ª eliminatória, com vitória por 2-0 sobre o Sporting Ideal, daria a glória de jogarem frente ao Nacional da Madeira? São estas coisas que a Taça proporciona, que uma equipa de um lugar chamado Mosteiros, no interior profundo do Alto Alentejo, seja conhecida por um jogo de futebol. Romantismo? Não. É apenas futebol.