Quase 30 anos depois o Clube Desportivo de Alcains volta a escrever o nome no mapa do futebol português. As vicissitudes da Taça de Portugal levam a que a modesta equipa do concelho de Castelo Branco se desloque ao Estádio Municipal de Braga para medir forças com os «Guerreiros do Minho».

Duelo desigual e analogias a histórias com gigantes marcam as análises e as perspetivas deste tipo de encontros. Nada que roube os sonhos aos homens que disputam os campeonatos distritais da AF Castelo Branco.

Pela segunda vez na sua história, o Alcains defronta uma equipa da I Liga. Novamente no Minho, depois de a 6 de janeiro de 1985 ter perdido em Guimarães por duas bolas a zero. Este domingo a história reserva nova página em branco para os albicastrenses que foram fundados em 1977. O desfecho do jogo ditará o tom em que se vai escrever a prosa, mas não há dúvidas que já se está a fazer história.

Para além do V. Guimarães, o Alcains mediu forças com a Académica de Coimbra por duas ocasiões, altura em que os estudantes militavam no segundo escalão do futebol nacional. O último desses jogos disputou-se há 15 anos.

Na ficha de jogo constou o nome de Élio Esteves, antigo jogador e agora presidente do Alcains.


«Este jogo é um prémio»

A MF Total tomou o pulso ao sentimento que se vive em Alcains em vésperas de jogo grande. O presidente Élio Esteves, economista de 42 anos de idade, fala da deslocação a Braga como um «prémio».

«Por estes dias vive-se em Alcains um espírito de satisfação. Passamos duas eliminatórias diante de duas equipas dos distritais e agora jogar com uma equipa de primeira é um prémio para toda a gente. Estamos a desfrutar deste momento com tranquilidade para honrar e dignificar esta camisola», assegura Élio Esteves.

Quem também espera desfrutar deste momento são as gentes de Alcains. Para o cinzento da pedreira irá uma mancha amarela e azul, capaz de se deslocar cerca de 320 km desde o interior até à cidade dos arcebispos.

«Teremos muitas pessoas em Braga. Inicialmente tínhamos previstas duas excursões, uma no próprio dia do jogo e outra no dia anterior, mas só vamos optar pela deslocação do dia do jogo. Estamos quase a encher o segundo autocarro. Várias pessoas vão nos seus carros particulares e pessoas de Alcains que residem em vários pontos do país também estarão. Esperámos mais de centena e meia de adeptos», referiu o líder máximo do clube de Alcains.

«Queremos deixar uma boa imagem, não vamos derrotados»

Totalmente amadores, no plantel do Alcains há jogadores com as mais diversas profissões. Entre estudantes, desempregados e formadores há também quem faça entregas de flores. «Somos amadores, mas com um grande sentido de responsabilidade em representar o clube, até porque temos um historial no futebol distrital», explica Élio Esteves à nossa revista.

Ainda assim, e mesmo mostrando consciência da diferença entre as duas equipas, o presidente acredita que pode haver taça: «O jogo começa com o resultado zero a zero. Temos consciência de que as nossas hipóteses são reduzidas, mas é taça. Pode haver um dia muito mau do Sp. Braga e um dia muito bom do Alcains; se assim for ficamos contentes».


Com treinos em horário pós laboral, o técnico João Paulo Natário orienta os seus pupilos três vezes por semana quando falta um quarto de hora para as oito da noite. A rotina não se alterou e Élio Esteves garante que o grupo de trabalho está concentrado na tarefa que terá pela frente.

«Os jogadores estão concentrados e sabem que é uma oportunidade que muitos se calhar não vão voltar a ter. Os mais novos, quem sabe, ainda poderão até repetir a experiência, mas os mais velhos provavelmente não mais terão uma oportunidade destas. Vão jogar num grande palco e vão dar o máximo, não vamos para lá derrotados e queremos deixar uma boa imagem», atirou o presidente.

Capitão quer «unir a vila em torno do clube»


Miguel Rebelo é o capitão do Alcains. Aos 24 anos, e quando está na quinta época ao serviço do clube, o jogador que tanto pode jogar a extremo como médio ofensivo ainda não se imaginou a entrar num dos maiores palcos do país.

«Não há forma de imaginar uma coisa destas. Só lá estando é que se sente e quando lá estivermos o sentimento vem ao de cima. O que queremos é desfrutar do momento», aludiu o capitão do Alcains.

Licenciado em Desporto e Mestrado em Atividades Físicas, Miguel Rebelo prossegue o seu raciocínio quase que mecanicamente como se estivesse habituado a estas andanças: «Sei que me vai perguntar se esperamos uma surpresa. O que posso dizer é que não vamos lutar para perder, vamos dar o nosso melhor e se não for suficiente para ganhar ficaremos de consciência tranquila e com o sentimento de que dignificamos a camisola».

Palavra de capitão. Miguel Rebelo assume que o seu maior desejo para o jogo de domingo é honrar a vila de Alcains e unir a população em torno do clube: «O nosso grande objetivo seria fazer com que a vila se una em torno do clube e da equipa, como já aconteceu quando o clube andou nos nacionais. Queremos honrar o clube, a vila, o nosso distrito e a nossa associação».

Estão lançados os dados. As emoções ficam guardadas para as 16 horas do próximo domingo no Estádio Municipal de Braga. O presidente Élio Esteves diz que o jogo começa empatado a zero e o capitão Miguel Esteves, com um discurso mais contido, lá foi dizendo que «surpresas acontecem».

A tradicional festa da taça vai por frente a frente homens de Alcains o Sp. Braga de Sérgio Conceição.