Rafael Nadal já tinha voltado, mas engrandeceu uma lenda que nasceu em junho, como ele próprio, neste domingo.

O espanhol foi a perfeição na terra batida de Roland Garros e foi recompensado com uma réplica exata da Taça dos Mosqueteiros.

São dez troféus do Grand Slam francês, algo que ninguém tinha conseguido. Fosse em Paris, Wimbledon, NY ou Melbourne, as localidades que acolhem os outros grandes torneios de ténis.

No Phillipe Chatrier, neste domingo, Rafa Nadal tornou-se num homem único e num tenista…perfeito quando o jogo é no pó de tijolo.

Atrás dele só se via poeira

Na sexta-feira, 2 de junho, Rafael Nadal foi até ao escritório. Picou o ponto (Nikolov Basilashvili, 6-0, 6-1, 6-0), deixou o estádio Philippe Chatrier e foi descansar. O dia seguinte era gigantesco.

A meio de mais um Roland Garros, Rafael Nadal celebrou o 31º aniversário, a 3 de junho. O mesmo dia em que juntou os mais próximos para ver a final da Liga dos Campeões.

O Real Madrid que sempre apoiou, ainda que o tio tenha sido central do Barcelona, venceu a Juventus e levantou o 12º troféu de campeão europeu. Rafa soprou as velas pelo aniversário e fechou o punho pelo Real Madrid. Um sábado em cheio, de festa.

No dia seguinte, pegou na raquete, e foi cumprir expediente outra vez: Roberto Bautista Agut, 6-1, 6-2 e 6-2.

Nadal chegava aos quartos de final de Roland Garros e atrás dele só se via a poeira que deixou após abalroar todos os adversários em três sets (para além dos já citados, Robin Haase e Benoit Paire).

Na entrada para os últimos dias, a pergunta com que se iniciou esta edição do torneio ganhava mais força. Conseguiria o espanhol fazer o que nenhum homem tinha feito até então?

Sim, conseguiria. E de modo espantoso.

Federer, nem valia a pena ir

O regresso do melhor Rafael Nadal não aconteceu agora. O espanhol voltou ao topo do seu jogo desde o início do ano. O problema é que Roger Federer também.

Em Melbourne, em janeiro, os dois disputaram a final do Open da Austrália. Venceu o suíço.

Em abril, em Miami, Nadal e Federer voltaram a encontrar-se. Venceu o suíço.

Pelo meio, o espanhol tinha perdido no México para Sam Querrey. Três finais em hard court, três derrotas.

Na terra batida, a história é sempre diferente. E Roger Federer anunciou que não ia. Porque sabia que não valia a pena ir.

Ali, quem manda é Nadal.

Pablo Carreño Busta, Dominic Thiem e Stan Wawrinka foram arrasados nos quartos, meias e final, como tinham sido os outros que encararam o espanhol no torneio francês de 2017.

Os 79 triunfos em 81 encontros em Roland Garros (!) não deixam dúvidas. É o maior tenista da história no pó de tijolo. 

Os números, de lenda

Após as três derrotas nas finais do Australian Open, México e Miami, o espanhol pisou a terra que tanto ama.

Nunca tinha havido um homem a vencer dez vezes o mesmo torneio. Grand Slam ou não. Mas também nunca tinha havido um tenista tão dominador num piso como Rafa Nadal.

Neste domingo, venceu a décima Taça dos Mosqueteiros, o troféu de Roland Garros, como em abril já tinha ganhado o 10º de Monte Carlo e Barcelona.

Da inexistência de um homem com 10 títulos de um mesmo torneio, o ténis passou a ter um indivíduo que o fez em três deles!

Apenas a australiana Margaret Court conseguiu vencer o mesmo Grand Slam mais vezes do que Nadal: 11, na Austrália, entre 1960 e 1973.

A superioridade de Nadal é tanta na terra batida que na final deste domingo até o adversário o aplaudiu. A meio do segundo set, havia 4-1 em jogos para o espanhol. O serviço era de Stan Wawrinka, que depois de várias trocas de bolas, aplicou aquela esquerda fortíssima, cruzada e bem puxada. Nadal respondeu com um tiro impossível.

As palmas do suíço foram o reconhecimento não só do ponto que o maiorquino acabara de fazer, mas do reconhecimento da grandeza de Rafa.

Os restantes números espelham-na: em 2017, Nadal fez sete vitórias em Roland Garros, venceu 19 sets e não perdeu nenhum, ganhou 116 jogos e perdeu 35, ganhou 569 pontos e perdeu 347. Jogou 12 horas e quatro minutos.

Quer isto dizer, portanto, que Rafael Nadal foi perfeito de novo e conseguiu vencer o torneio francês sem perder um único set... pela terceira vez na carreira. Quem mais tem três Grand Slams ganhos sem perder qualquer set? O histórico Bjorn Borg: dois em Roland Garros, um em Wimbledon.

«Não tenho nada a dizer, Rafa. Foste demasiado bom»

Novak Djokovic construía a própria lenda enquanto Rafael Nadal e Roger Federer envelheciam. O domínio do sérvio e a emergência de Andy Murray, atual número um do mundo, e do próprio Wawrinka, afastaram espanhol e suíço dos troféus.

O Open da Austrália tratou do comeback de Federer e Nadal e a sua salutar rivalidade. Na Rod Laver Arena, o suíço venceu o 18º Grand Slam da carreira e é o maior de todos os tenistas nesse aspeto.

No Philippe Chatrier, Nadal venceu o 15º. Passou Pete Sampras e está apenas a três de Roger Federer.

Deixemos as palavras do tenista de Maiorca ficar longe. E atentemos nas dos outros.

«Rafa, não tenho nada a dizer acerca de hoje. Foste demasiado bom. És um grande exemplo e sempre foi uma honra jogar contra ti. Parabéns pela tua carreira», destacou Wawrinka, o último adversário caído.

Já o australiano Pat Cash, antigo tenista, resumiu o que é Rafael Nadal na terra batida, na BBC Radio5.

«Não gosto de usar o termo melhor de todos os tempos, mas é difícil não o fazer com ele. É absolutamente fenomenal. O estilo de jogo de Rafa é tão eficaz na terra batida, é rápido e implacável. Tem uma força incrível. Tem todos os atributos que são necessários para continuar e continuar. Ele está na mente dos adversários. Até os maiores caem aos seus pés nesta superfície. Nem conseguem competir com ele. As únicas duas vezes que perdeu aqui estava lesionado. É intocável neste piso. Foi uma performance incrível.»

Como foram muitas outras quando é junho, mês em que é coroado o rei da terra.